Por Raul Fitipaldi, para Desacato.info
Farabute é uma gíria do Rio da Prata. Se apelida de “farabute” a uma pessoa fanfarrona, pícara, malandra, de má conduta. A origem da palavra é a italiana farabutti. Os italianos usam essa palavra para indicar que alguém é vaidoso, ostentoso, mas não vale grande coisa. Também deriva do castelhano faraute, algo assim como recadeiro e, no melhor dos casos, intérprete. Em germânico equivale a adulador, capacho e por aí vão os cortejos dirigidos ao farabute. Mas, vamos ao assunto.
Dias antes de que o Brasil chegasse às 300 mil vítimas fatais da Covid, um colega argentino, portenho até a medula, me ligou para que o ajudasse a perfilar o comportamento do presidente Bolsonaro à frente da pandemia. Me disse o óbvio, que os números de infectados e mortos ultrapassavam as piores apostas que já fizera sobre a situação em nosso país.
Repassei-lhe, de forma mais ou menos sucinta, alguns fatos e declarações do inquilino do multiplex da Alvorada. O colega, com voz rampante de tenor, a cada detalhe irrompia em risos. Aos poucos foi mudando e o riso foi suplantado por palavrões e gírias tipicamente portenhas que nem é bom traduzir. Como vocês sabem, o portenho em clímax sobe o volume, a intensidade e a qualidade do insulto (e eu gosto muito disso). Isso fazia o radialista quando eu, com natural cumplicidade, tentava acrescentar algum dado que servisse para uma entrevista que teríamos na manhã seguinte.
Enquanto pedia um balanço do mandato de Rodrigo Maia no Congresso, e brincava que esse era um índio importado, aludindo ao sobrenome Maia, tomava nota das dezenas de pedidos de impeachment sobre os que o deputado se sentou. Mais tarde brincou com o sobrenome do novo presidente da Câmara, Arthur Lira: “O que faltava para esse Nero que incendiou o Brasil era uma lira”, em referência ao instrumento musical que, supostamente, tocava o imperador Nero ao tempo que queimava Roma.
Na mesma toada seguiu com o general Pazuello e com quem ainda era candidato a ocupar seu lugar, o agora ministro de saúde, Marcelo Queiroga. Por que não se chama Quiroga como todo mundo? Tá louco, esses caras são um bando de pirados! E ficava mais furioso, mais irônico e mais ácido. E levantava mais e mais a voz.
Em determinado momento, já no apogeu da incredulidade e do volume, que parecia querer destruir meu fone de ouvido, me diz, poxa Fitipaldi, me deu um branco. Que foi? Esqueci o nome do cara, do farabute esse aí. O nome do cara, do presidente… Ah, Bolsonaro, Jair Bolsonaro.
Irritado com ele mesmo por ter esquecido o nome do presidente do Brasil me agradeceu os apontamentos para sua pauta. Usaria isso no programa da noite e no dia seguinte na conversa ao vivo que teríamos apenas passado o amanhecer. Na entrevista foi tudo muito sério e sóbrio. Durante quase 20 minutos fiz esforços inenarráveis para não rir quando se falava das ações e omissões do “farabute”.
Raul … sempre elegante… outros colegas se perderiam em palavrões por falta de uma cultura verdadeiramente latino-americana…
Grande abraço, Sérgio.