Por Jaine Fidler Rodrigues, para Desacato.info.
Ouviram-se vozes. Elas indicavam a movimentação de pensamentos e sentimentos em torno da realidade vivenciada diariamente. Este movimento, criou um espaço de partilha e união, de estudantes e professores em escolas públicas de Chapecó e todo Brasil. Mesmo com algumas divergências – naturais – o motivo deste reencontro foi o modelo de ensino implantado chamado de “Novo Ensino Médio”. Observa-se que ele foi imposto às escolas via uma bolha de ilusão de que às escolas existentes são de qualidade. A questão é, representantes governamentais criam discursos ilusórios de uma educação de alta qualidade e caem em suas próprias mentiras. Sim, existe a boa intenção de trazer melhorias, isto é ótimo. Mas, quando vão parar para considerar às condições de estudantes, professores, questões estruturais e organizacionais, de nossas escolas públicas?
Isto tudo simplesmente reflete o tamanho da distância entre estes representantes, órgãos responsáveis e a sociedade. O resultado visualizado: desequilíbrio, insatisfação e revolta. Mas, que bom que espaços de manifestações públicas são criados. Para entender melhor às percepções e sentimentos destes seres, conversamos com estudantes, professor e mãe. Segue o fio.
As estudantes do 2º do Ensino Médio na EEB Druziana Sartori, também, presidenta e vice-presidenta do Grêmio Estudantil ‘Lutando pelo Futuro’, Ana Clara do Nascimento e Isadora sadora Balsani Dalvesco, contam que às mudanças do Novo Ensino Médio não condizem com a realidade da sua escola. “Nós não temos salas suficientes, as salas cheias tem cerca de 30 a 40 alunos. Não temos sala para ser uma cada matéria”, afirma Ana. Além disto, o governo ainda não cumpriu com promessas de envio de equipamentos como, projetores.
A escola tem seis turmas de Ensino Médio do Novo Ensino Médio que estão sem computadores, netbooks, projetores que disseram que iam proporcionar. “A sala maker que era para a gente ter acesso desde o ano passado, agora que estão começando a enviar, laboratório a gente não tem, porque falta a sala, não tem equipamento. Então está uma desorganização tanto na estrutura, quanto no ensino. Porque os professores eles tiveram que reduzir muito os conteúdos porque atualmente a gente tem uma aula só em disciplinas como história, geografia, biologia, etc. E essas trilhas, foi bem desorganizado, porque pela falta de sala a gente está fazendo trilhas que a gente não escolheu, então a gente não está se aprofundando em nenhuma área que a gente quer. A gente é obrigado a estar nessa trilha, então ao invés desse novo ensino médio agregar coisas boas, ele, na verdade, só está atrapalhando a educação”, explica Isadora.
A vice-presidenta, Ana Clara destaca que neste cenário, por exemplo, aulas de empreendedorismo, de educação tecnológica seriam interessantes, “se as escolas tivessem recursos suficientes, só que também complicado”. Considerando que na escola há estudantes de todos os níveis escolares, fundamental e médio, Isadora também compreende que deveria ter sido analisado melhor a organização das salas.
“Eu sinto um pouco de revolta e decepção porque eu escuto colegas e pessoas conhecidas falando ano que vem já querem abandonar a escola e aí, eu penso no meu caso, porque obviamente eu não vou abandonar a educação, eu preciso disto, mas, revolta sabe? Parece que o governo não está pensando nos estudantes e nem professores” desabafa, Ana.
Outro fator destacado por Isadora se refere a falta de preocupação com as opiniões da comunidade escolar. “O governo quando fez essa lei nem pediu a opinião de pais e professores para colocar isto. O governo simplesmente decidiu colocar esse novo ensino médio sem ter uma estrutura, sem se organizar, e sem ver, na verdade, a realidade do povo brasileiro”, salienta.
A Carolina Alves de Oliveira, estudante do EEB Bom Pastor, também nos sensibiliza sobre um aspecto fundamental de análise neste contexto: a saúde psicológica e emocional de estudantes. Carolina acredita defende que a escola deve prestar atenção à questões psicológicas, se questionar como que está o emocional dos alunos.
“Porque o aluno que não tem o bom emocional, um aluno que não está bem com si mesmo, ele não consegue estudar”, destaca.
As vivências individuais pessoais de cada um, somada a experiência escolar atual, podem resultar em maiores agravos. Isto porque “na fase da adolescência, há o desenvolvimento de personalidade, os problemas, seja a ansiedade, depressão, TDAH, afetam. E, acredito que a escola não esteja dando palco a isto. Alunos com ansiedade, passam 7 horas em uma escola, dentro de sala, fobia social e derivados problemas. Eles estão sendo afetados. Eu vi alunos que não estavam conseguindo estudar, por conta da pressão psicológica das escolas, a quantidade de matérias, a quantidade de aulas, além do trabalho. Porque muitos de nós, além de estar no novo ensino médio, estamos trabalhando. Ou seja, não temos tempo de sentar e estudar“, conta.
Segundo o professor Cleber Ceccon, um dos aspectos negativos para os professores é a falta de tempo para planejar aulas. No ensino médio, implantado em 2017, havia 10h de planejamento, em 2019 diminuiu para 5h e agora não há mais nenhuma aula. “Nós não estamos tendo tempo para planejar as trilhas, as eletivas, o projeto de vida. Nós queremos que o governo olhe para essa realidade que coloca o aluno numa carga estendida, sem ter o investimento necessário, para que eles consigam sair qualificados“, salienta.
Para Cleber, esta sendo gerado um Apartheid da Educação de dentro da escola. “Onde a rede privada fez uma roupagem nova, mantendo um núcleo das disciplinas, e colocando algumas eletivas formando eles aí a partir do capital, da forma que eles entendem empresariado. Nós, o que estamos acompanhando é que nós na escola pública vamos sair apenas como trabalhadores braçais, e isso é triste, enquanto professor ver isto”.
Além de estudantes e professores impactados pela mudança, as mães e pais, responsáveis pelos seus filhos, também tem o dever de observar a realidade vivenciada. A mãe e presidenta da UBM-Chapecó, Jaqueline Schneider, analisa, por exemplo, o quanto o seu filho estudante do 1º ano do Ensino Médio se sente frustrado pela falta de salas e equipamentos na escola, ou cansado pela carga horária.
“Está havendo muita bagunça, quando eu questiono: e aí, como foi a escola? Ele sempre traz alguma informação do tipo, ‘mãe a gente nem foi para o laboratório ainda’, ‘mãe, cada aluno pode escolher qual é a matéria que quer fazer mas, não tem sala para colocar uma parte dos alunos que escolheram tais matérias e colocar a outra parte dos alunos que escolheram outras matérias, em outra sala”
Quando se observa a realidade das escolas em situações de maior precariedade, Jaqueline questiona: “para quem está sendo bom este novo ensino médio?” E, complementa: “Às vezes meu filho fala, às vezes é produtivo, às vezes nem sei o que a gente aprendeu”
Em suma, quando há estes movimentos que unem vozes e diferentes consciências, é natural encontrarmos divergências de pensamento. De acordo com seu direito de manifestação pública, uma estudante que preferiu não se identificar da EEB Bom Pastor, salientou:
“Estamos aqui, sim, pela revogação do novo ensino médio, mas isto, não se trata de política”
Atos nacionais
É válido destacar que às manifestações ocorreram em todo país. Os reflexos? Iremos perceber ao decorrer dos dias. Há incertezas quanto à possibilidade de revogação ou não. Enquanto isto, à luta em defesa dos interesses populares, são válidos.