Saudações. Meu nome é Cristina – o pessoal lá de casa me chama de Tina, os colegas do trabalho me conhecem como Cris e tu podes me chamar do que quiseres. Bom, eu estou escrevendo esta carta porque, puta que o pariu, cansei de te esperar.
Olha que eu te procurei, procurei mesmo, não tenho vergonha de falar. Experimentei de tudo e não me arrependo de quase nada, exceto do caso com o chinês e com o capixaba, todo o resto valeu.
Não nasci pra freira, nem pra santa, nem pra puta – tudo tem limite, afinal. O fato é que te procuro desde a minha primeira infância, quando ouvi a história da princesa linda e solitária, prisioneira e jurada de amor, que é resgatada pelo príncipe e blá blá blá. Faz décadas.
Só uma idiota para acreditar nessa bobajada de amor romântico, de amor perfeito, de príncipe herói. Eu sou uma idiota completa, como podes ver. Por onde diabos tu andas? Para te achar, eu rezei, fiz mandinga, simpatia, fingi indiferença, fiz promessa, fiz de tudo, só não espetei agulha em boneco, que não me serviria de nada. Tudo em vão.
Querida alma gêmea, amor da minha vida, tu és gay? Estás casada com a pessoa errada? Morreste há muitos anos e não cumpriste o destino? Eu sou aquela que sobrou? Eu preciso de uma resposta para pensar em outra coisa, seguir viagem, mudar de estação. Ainda há muitas estações para conhecer.
Não ter te encontrado é muito ruim, dói fundo porque a esperança às vezes se esvai e fica só esse vazio e esse silêncio. Tua ausência, como um vento frio, sopra na cama vazia, na mesa não compartilhada, na música não dançada, no diálogo inexistente. Essa ausência vai pelo tempo, no tempo não vivido.
Eu sou um pouco louca, sabe? Várias vezes eu tive a certeza de ter te encontrado. No começo, todos os homens meio que se parecem contigo. São atenciosos, interessados, educados. Todos têm um brilho nos olhos, uma ternura, uma carinha que dá aquela alegria no coração.
No começo, há a curiosidade recíproca, o alimento do mistério. E o mistério, tu sabes, é a essência do amor. Depois, porém, a ternura gratuita e a necessidade de se estar junto tornam-se desejos incômodos, até se transformarem em irritação e rancor. No final das contas, bem no final, sobram apenas a monotonia e a indiferença
Só quem ama de verdade é capaz de perdoar as mágoas cotidianas e os castigos que o tempo impõe ao outro.
Eu queria um amor na intensidade daquele entre Janey Byrne, uma inglesa de 43 anos, e Meeka, uma porca de três. A história foi publicada no The Sun na quarta-feira passada. Janey comprou uma mini-porquinha, a quem deu o nome de Meeka, e confiou na promessa do vendedor de que o bicho permaneceria pequeno para sempre, como um cachorro maltês. Até o fim de sua suínica vida, garantiu o homem, Meeka seria um porquinho-anão, um bonsai-porquinho.
Hoje, três anos depois, criada desde então dentro de casa, a mini-porquinha transformou-se numa porca de 107 quilos, com 76 centímetros de altura e 1,5m de comprimento. Questionada sobre o assunto, Janey disse: “No início, fiquei decepcionada por ela não ser micro, mas agora não mudaria nada nela. Eu a amo assim, com suas qualidades, defeitos e imprevisibilidades”.
Eu queria um amor deste tipo e só posso vivê-lo ao teu lado. Embora frustrante e doída, essa minha procura permite a perfeição, a eternidade, permite qualquer coisa, menos, lógico, viver um grande amor. Mas viver um grande amor, tu deves saber, é muito arriscado, perigoso mesmo. Por isso, eu sigo te procurando.
Onde tu estás?
*Autor: Fernando Evangelista, jornalista, diretor da Doc Dois Filmes e colaborador do Portal Desacato. Mantém a coluna Revoltas Cotidianas, publicada todas as terças-feiras.