Em Washington e em várias capitais europeias já se esfregam as mãos, pois as amplas zonas do Iraque e da Síria controladas pelo extremista Estado Islâmico (EI) abre as portas ao Ocidente para uma intervenção a grande escala no Oriente Médio.
A ofensiva do EI permite, também, cumprir um velho sonho: a balcanização da região, que possui as principais jazidas de hidrocarbonetos do mundo.
Com dezenas de milhares de homens, armamento sofisticado e abundante financiamento, o Daesh (acrônimo em árabe desse grupo) passou de uma minúscula formação para representar uma verdadeira ameaça para o Iraque e a Síria.
Decapitações, crucificações, violações sexuais, assassinatos em massa e outros crimes nas zonas que controla, fazem desse grupo sinônimo de terror.
O Estado Islâmico e a Frente al Nusra, braço da al-Qaeda na Síria, foram capazes de crescer graças às doações dos aliados da Casa Branca no Golfo Pérsico, disse Andrew Tabler, analista do Washington Institute for Near East Policy.
Durante os últimos três anos, Damasco denunciou o apoio vindo do exterior aos grupos armados e advertiu sobre o perigo que representavam para a região e o mundo, mas suas palavras foram ignoradas.
Com o argumento de combater o terrorismo, agora a Casa Branca iniciou bombardeios no Iraque, país que invadiu em 2003, e ameaça com ampliá-los ao país vizinho, na mira há vários anos.
No entanto, muitos poucos falam do jogo de xadrez que Washington e outros atores internacionais e regionais impulsionam como parte do grande jogo geopolítico.
As atuais fronteiras da região (com uma ou outra variação) datam do fim da I Guerra Mundial (1914-1918), quando a Grã-Bretanha e a França aplicaram o acordo secreto de Sykes-Picot para dividir a zona.
Precisamente essas demarcações impostas por potências estrangeiras foram sempre um elemento perturbador e de atritos entre os países árabes durante décadas, incitados convenientemente pelo Ocidente.
A utilização de diferenças políticas, religiosas, fronteiriças e até econômicas propiciaram os planos para balcanizar o Levante.
O objetivo é o que muitos cientistas políticos conhecem como “a teoria do caos construtivo”, que permitiria às antigas metrópoles e aos Estados Unidos remodelar e desenhar novas fronteiras e instaurar governos afins na região.
A Casa Branca desenvolveu nos anos 90 uma nova estratégia chamada Redireção, na qual os takfiries (extremistas sunitas) jogam um papel importante para transformar a região em um barril de pólvora, apontou Mahdi Darius Nazemroaya, sociólogo e pesquisador do Centre for Research on Globalization e a Strategic Culture Foundation, de Moscou.
Gostaria de ver a Síria como um país desintegrado e balcanizado com “mais ou menos regiões autônomas”, afirmou recentemente Henry Kissinger, ex-secretário do Estado norte-americano, durante uma intervenção na Escola Gerald R. Ford de Política Pública da Universidade de Michigan.
Pese às afirmações de Washington, a ofensiva do EI sobre amplos territórios no Iraque, não surpreendeu o governo de Obama, que conta com tecnologia de ponta e o mais alto orçamento do mundo para trabalhos de espionagem.
Tivemos essa informação desde o começo do ano, e a passamos para Washington, assegurou ao jornal britânico The Telegraph, Rooz Bahjat, que trabalha para Lahur Talabani, chefe da inteligência do Curdistão iraquiano.
Em um discurso ao Congresso em fevereiro passado, o tenente-general Michael Flynn, então chefe da Agência de Inteligência de Defesa, advertiu que o EI lançaria um ataque em massa em 2014 em ambos os lados da fronteira.
Segundo o Centre for Research on Globalization, membros chave dessa organização terrorista receberam treinamento da Agência Central de Inteligência norte-americana (CIA) em um acampamento secreto nas redondezas da cidade jordaniana de Safawi, em 2012.
“Os campos de treinamento secretos estadunidenses na Jordânia e em outros países treinaram vários milhares de combatentes muçulmanos nas técnicas de guerra irregular, sabotagem e no terror geral”, revelou o ideólogo militar.
Também há numerosas denúncias sobre instalações similares na Turquia e na Líbia, que depois da agressão ocidental se converteu em um viveiro de jihadistas.
O Daesh não tinha o poder para conquistar e ocupar Mosul (a segunda cidado iraquiana) por si só. O que tem ocorrido é o resultado da colaboração com a inteligência de alguns países da região com grupos extremistas dentro do governo iraquiano, disse o jornalista iraniano Sabah Zanganeh.
Uma reportagem do jornal The Wall Street Journal destacou que um comandante militar do EI, o georgiano de origem chechena Tarkhan Batirashvili, fez das guerras no Iraque e na Síria uma luta “geopolítica entre os Estados Unidos e a Rússia”.
Batrashvili é um produto de um programa conjunto dos Estados Unidos e da Georgia, assegurou Jeffrey Silverman, correspondente nesse último país do jornal eletrônico norte-americano Veterans Today.
A Síria e o Iraque sofrem hoje com as políticas das potências ocidentais que durante anos fecharam os olhos e financiaram as organizações radicais com um objetivo claro: justificar a intervenção com o argumento do combate ao terrorismo.
* Correspondente da Prensa Latina na Síria.
Fonte: Prensa Latina