A candidata à Câmara de Madrid pela lista “Ahora Madrid”, Manuela Carmena é uma ex-juíza de 71 anos. O seu plano de governo inclui cinco medidas urgentes para os primeiros 100 dias: paralisar os despejos e a privatização de serviços públicos, garantir água e luz a todas as pessoas, garantir os serviços de saúde e desenvolver um plano urgente de emprego.
Por Andrés Gil.*
O programa estabelece quatro prioridades para a legislatura: economia sustentável e emprego de qualidade; Governo democrático, transparente e eficaz; direitos sociais e inclusão social; e cidade próxima, coesa e habitável.
“Ganhou uma maioria social para a mudança. E essa maioria não é de ‘Ahora Madri’, ganhou toda a cidadania”, afirmou Carmena depois dos resultados de 24M.
O longo escrutínio chegava ao fim e esboçava outro governo para a câmara de Madrid: PP, 21 vereadores; Ahora Madrid, 20; PSOE, 9; e Ciudadanos, 7.
Manuela Carmena, ex-juíza de 71 anos, resistiu a ser a candidata de ‘Ahora Madrid’. Fundadora do escritório de advogados de Atocha em que teve lugar a matança de 19771, ex-vogal do Conselho Geral do Poder Judicial, relatora da ONU, até há uns meses via a política à distância e dedicava-se em Malasaña à sua loja de roupa de bebé confecionada por pessoas presas.
Mas há um ano publicou Por que as coisas podem ser diferentes: reflexões de uma juíza (Clave Intelectual), que se converteu num texto que foi circulando de mão em mão e tornou-se uma luz para quem procurava uma pessoa para encabeçar a candidatura cidadã de confluência para a Câmara de Madrid.
“No início de dezembro amigos muito ligados à minha história pessoal estavam a insistir, eu fui dizendo a todos que não, que não, que não… Passei todo este tempo a dizer que não. Não tinha nenhuma vontade. Parecia-me que tinha que ser alguém jovem, pensava eu, como continuo a pensar, que esta mudança tem de ser feita pelos jovens e nessa linha me fui defendendo. O que acontece é que ao dizer tanto que fossem os jovens que tomassem a iniciativa, claro, ficava um pouco contraditório se os jovens tomavam a iniciativa e me pediam que os secundasse… Então, é como se me tivessem apanhado”, explicava Carmena numa entrevista em eldiario.es.
E, quando já se aproximavam os prazos para as primárias deAhora Madrid, Carmena acede: “Começas a ver que podes ser necessária. Sei que isto sei fazer. Eu sei que canto mal, que danço muito mal… Mas isto eu sei fazer. Sei que gosto da gestão pública e parece-me que a sei fazer bem. Estava consciente de que tinha o perfil que muitas pessoas estavam à procura. Quero ser a ponte entre uma democracia velha e os que querem que mude o modelo democrático”.
A 10 de março. Disse sim. E dois meses e meio depois, está à beira de afastar o PP após 24 anos à frente da Câmara de Madrid. Para fazer… o quê? “Que mude o modelo democrático”.
Que significa isso? O que é “Ahora Madrid”?
Ahora Madrid é um partido instrumental que nasceu da união de Ganemos Madrid e Podemos. Em Ganemos entraram Equo e também a Izquierda Unida (IU). Mas as pessoas da IU que estão em Ahora Madrid já saíram ou foram afastadas
Ahora Madrid é um partido instrumental que nasceu da união de Ganemos Madrid e Podemos –como Rita Maestre, chefe de campanha de Carmena com Íñigo Errejón e número 5 da lista.
Ganemos Madri assenta as suas raízes emMunicipalia, nos movimentos sociais – como Nacho Murgui, número 2, autónomos, ativistas – Pablo Soto, número 8, participantes em coletivos urbanos como o Patio Maravillas – Guillermo Zapata, número 12, por exemplo, ou Pablo Carmona, número 6… Em Ganemos entraram Equo – como Inés Sabanés, número 3, o Partido por un Mundo Más Justo, e também Izquierda Unida (IU).
Mas as pessoas da IU que estão em Ahora Madrid – exceto Lara Hernández, responsável por Convergencia da IU federal e membro da Coordenadora de Ahora Madrid – já não são da IU: como os que saíram com Tania Sánchez para formar a Convocatoria por Madrid – Jorge García Castaño, por exemplo, número 10 da lista, ou Esther Gómez, número 19 – e os que tiveram que sair quando a IUCM2 decidiu apresentar uma lista própria não avalizada pela direção federal – militantes do PCE afastados da IUCM, como Mauricio Valente, vencedor das primárias da IU para a câmara de Madrid, número 4 da lista de Carmena.
Medidas urgentes
O processo de primárias de Ahora Madrid determinou quais seriam as cinco medidas urgentes para os primeiros 100 dias de governo:
1. Mobilizar todos os meios e recursos municipais para paralisação dos despejos e desalojamentos da primeira habitação e para garantir uma alternativa habitacional aos seus habitantes.
2. Parar a privatização dos serviços públicos, a externalização de serviços municipais para grandes empresas e a venda de património público.
3. Garantir os água e luz a todos os lares que não possam pagar.
4. Garantir o acesso aos serviços de saúde municipais e às ações municipais de prevenção e promoção da saúde a todas as pessoas independentemente da sua situação administrativa.
5. Desenvolver um plano urgente para a inserção laboral de jovens e desempregados de longa duração.
Quatro prioridades para a legislatura
E, que mais? O programa, de 71 páginas, articula-se em quatro grandes áreas: economia sustentável e emprego de qualidade; Governo democrático, transparente e eficaz; direitos sociais e inclusão social; e cidade próxima, coesa e habitável.
1. Economia sustentável e emprego de qualidade:
Gerar emprego estável, digno e equitativo.
Apoiar a economia social, o trabalho por conta própria e as pequenas empresas
Fomentar os setores orientados para o desenvolvimento económico sustentável: reorientação do setor da construção para a reabilitação e a eficiência energética; medidas de apoio ao pequeno comércio; fomento da atividade económica nos espaços residenciais; desenvolver linhas estratégicas para a mudança de modelo económico.
2. Governo democrático, transparente e eficaz:
Auditar a gestão económica, os processos de privatização e a dívida municipal.
Alcançar a autonomia económica e desenhar uma gestão financeira sustentável e equitativa: inclusão de critérios sociais na gestão económica municipal; travão à venda de património público e reordenação do uso de edifícios e equipamentos públicos.
Reformar a administração local para uma gestão racional, justa e transparente: profissionalização e melhoria da estrutura da Câmara; instauração de princípios de transparência e acessibilidade da informação pública; implementação de medidas contra a corrupção, a arbitrariedade e a discriminação em função do género; elaboração de um roteiro para a remunicipalização dos serviços públicos; fomento da especialização, formação e transparência da polícia municipal.
Incluir a participação cidadã como forma de gestão: desenvolvimento de orçamentos e processos participativos; fomento das ferramentas digitais de participação; fomento da gestão coletiva de recursos comuns.
Política de proximidade e equilíbrio territorial: redistribuição de competências e democratização da gestão municipal; criação de estruturas de empoderamento cidadão à escala local e metropolitana.
3. Direitos sociais e inclusão:
Garantir o acesso a uma habitação digna: priorização de atuações municipais que permitam soluções habitacionais para toda a cidadania; recuperação da EMVS [empresa municipal de la vivienda e suelo] como garante da função social da habitação e travar a venda de habitação da EMVS; priorização do aluguer estável e de qualidade nas políticas de habitação.
Garantir a equidade social através do acesso universal aos serviços públicos: acesso universal aos serviços públicos; fortalecimento dos serviços educativos municipais públicos; melhoria da saúde e promoção da saúde no âmbito municipal; potenciação dos Serviços Sociais e luta contra a pobreza e a exclusão social; garantia de acesso à alimentação para a infância e para o conjunto da população madrilena.
Manter e potenciar a vida nos bairros: potenciação da vida nos bairros; fomento da atividade comunitária dos bairros; melhoria da convivência nos bairros mediante a prevenção e resolução comunitária dos conflitos.
Melhorar a qualidade de vida, reconhecendo a diversidade da população de Madrid: reivindicação do valor da diversidade humana e defesa dos direitos das pessoas com diversidade funcional; democratização da cultura; desenvolvimento de políticas específicas integrais para pessoas idosas, infância, adolescência e juventude; incorporação da perspetiva de género e da perspetiva dos direitos humanos em todas as políticas municipais; dotação de recursos reais e específicos em matéria de violência de género e violências sexuais.
4. Cidade próxima, coesa e habitável:
Assegurar um planeamento baseado no interesse geral: revisão integral do planeamento urbanístico; impulsionar planos de desenvolvimento local e reequilíbrio territorial; estabelecimento de mecanismos que garantam o controle, a transparência e a participação na gestão urbanística; coordenação das políticas de desenvolvimento urbano à escala municipal e autonómica.
Regenerar e recuperar o espaço urbano e o património: aplicação de políticas orientadas para a melhoria da qualidade do espaço urbano; potenciação e melhoria no uso dos espaços verdes; articulação da conetividade para melhorar a coesão territorial; priorização do interesse geral no uso do espaço público; reordenação de edifícios e equipamentos públicos municipais; implementação de planos integrais em zonas deterioradas.
Estabelecer políticas de ecologia urbana que melhorem a qualidade de vida; estabelecimento de um plano para reduzir a contaminação atmosférica; pôr em marcha políticas para a eficiência e a poupança energéticas; articulação de medidas que garantam a sustentabilidade no direito ao acesso à água; desenhar e pôr em marcha um plano de gestão de resíduos integral e eficiente.
Desenvolver uma política de mobilidade eficiente e sustentável: elaboração de um Plano de Mobilidade racional, sustentável e participado; potenciação de políticas de proximidade e acessibilidade; recuperação e melhoria do serviço público de transportes; racionalização do uso do veículo privado motorizado para proteger a saúde e melhorar a qualidade de vida; fomento da mobilidade pedonal e ciclista; coordenação das políticas de mobilidade à escala municipal e autonómica.
Promover a coesão territorial: impulsionar planos locais baseados numa análise participada da situação e necessidades da cada bairro; aplicação de políticas urbanísticas que promovam a solidariedade e a cooperação.
*Publicado em eldiario.es.
Tradução: Carlos Santos para esquerda.net
Fotos: Myriam Navas/flickr
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Fonte: esquerda.net