Espionagem ilegal na Argentina: “É um resquício do terrorismo de Estado”

Novos casos de espionagem contra organizações sociais e políticas argentinas, desta vez na província de Jujuy, norte do país, foram divulgados na última semana. Segundo a advogada Elizabeth Gómez Alcorta, há neste plano atual uma continuidade do terrorismo de Estado; além de responsabilidade política do Ministério de Segurança da Nação Argentina. Gómez Alcorta atua no caso da militante da Organização Tupac Amaru, Milagro Sala, presa desde fevereiro.

A informação da nova espionagem, que tem um impacto menor do que outros casos de inteligência sobre líderes políticos e sociais, foi enviada anonimamente ao jornalista Mauro Federico. Ele recebeu dados detalhados das ações feitas pelas organizações de Jujuy, entre agosto e setembro deste ano, obtidos ilegalmente.

“Claramente o que encontramos é um informe de inteligência vinculado às organizações sociais e políticas da província de Jujuy, ligadas às ações de sindicatos, organizações de usuários e consumidores, multissetoriais, da organização Tupac Amaru e do FIT nos meses de agosto e setembro, verificado dia a dia”, explicou, numa entrevista à Radionauta, a advogada Elizabeth Gómez Alcorta, que também é presidenta do Movimento de Profissionais para os Povos (MPP).

Gómez Alcorta disse que o nível de detalhamento presente nos documentos – pelo menos nas seis folhas as quais ela teve acesso das 14 totais – mostra “infiltração e trabalho de inteligência”, uma vez que não é uma mera compilação de dados públicos.

A advogada, que trabalha em julgamentos sobre delitos de lesa humanidade, afirmou que os informes são comparáveis aos que elaborava a Direção de Inteligência da Província de Buenos Aires (DIPBA).

“O que está acontecendo agora tem um alto nível de gravidade. Chama a atenção a pouca repercussão que também teve [o caso]”, disse ela.

No prazo de 24 horas após o recebimento dos documentos, a advogada, junto às organizações populares, apresentou uma denúncia contra a ministra de Segurança Nacional, Patricia Bullrich, “porque [ela] é a cabeça política de uma pasta [dentro do governo] que reúne todas as forças de segurança”.

Embora ainda não se possa provar – e, portanto, solicita-se a investigação –, Alcorta afirma que é “muito possível” deduzir a vinculação com Guarda Nacional. “Não podemos deixar de ter em mente o Projeto X [medida da polícia federal e do Exército argentinos para espionagem de movimentos populares]”, disse. Sobre a denúncia da última semana, foi sorteado o juiz Claudio Bonadío [conhecido por levar adiante as causas contra o kirchnerismo]. “Obviamente avaliamos negativamente essa escolha, nem acreditamos que se vá fazer uma investigação séria”, comentou Gómez Alcorta.

“É uma trama de espionagem ilegal que não tem a ver exclusivamente com a conjuntura”, acrescentou a integrante do MPP.

“A lei de inteligência nacional, além de proibir que serviços de inteligência sejam feitos sem uma ordem judicial fundamentada, proíbe terminantemente serviços de inteligência vinculados às opiniões políticas, sindicais ou sociais. Isso é um resquício do terrorismo de Estado”, disse a advogada. E agregou: “Com 33 anos de democracia, isso não pode seguir acontecendo. Não podemos seguir sendo investigados pelas agências estatais por conta de nossas opiniões políticas ou militância”.

Fonte: Brasil de Fato

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