Silent Circle, empresa provedora de serviços de e-mail encriptados seguiu o movimento de sua concorrente Lavabit que, na 5ª-feira anunciou que decidia deixar de operar, depois de receber ordens do governo dos EUA para entregar dados privados e mensagens de e-mails de seus clientes – um dos quais se acredita que seja Edward Snowden.
Apoiadores da liberdade para a Internet e que lutam por proteger a privacidade dos usuários estão chocados, mas já manifestaram seu agradecimento pela ação que veem como uma empresa provedora de serviços seguros que opta por defender os direitos de seus clientes, mesmo que ao preço de ter de fechar a empresa, acossada pela violência, que consideram inconstitucional, do governo dos EUA.
A Agência Reuters noticiou:
[O fundador do provedor Lavabit disse que] decidiu “suspender as operações”, mas que está proibido de discutir os eventos das seis últimas semanas que levaram àquela decisão.
O período corresponde ao da divulgação de informações secretas, por Edward Snowden, consideradas fontes de matérias jornalísticas que explicam em detalhes as operações de espionagem eletrônica, pela Agência de Segurança Nacional dos EUA.
Dada a força impressionante que o governo está mobilizando para obter e-mails e registros dos provedores de serviços, força que se aplica por meios legais e ilegais, é estimulante constatar que empresas provedoras optam por agir na direção de conter a capacidade de o governo invadir a privacidade dos usuários – disse num postado Kurt Opsahl, da Electronic Frontier Foundation.
Na 5ª-feira à tarde, Lavar Levinson, fundador do provedor Lavabit, distribuiu declaração em que explica por que o servidor será fechado:
Companheiros usuários,
Fui forçado a tomar uma difícil decisão: tornar-me cúmplice de crimes contra o povo dos EUA, ou encerrar quase dez anos de trabalho duro e fechar minha empresa Lavabit. Depois de muito pensar, atenta e profundamente, decidi suspender as operações. Gostaria de poder partilhar com vocês todos os eventos que me levaram a ter de decidir como decidi. Não posso. Entendo que vocês merecem saber o que está acontecendo – a Primeira Emenda deveria garantir-me o direito e a liberdade de falar sobre situações como a que estou vivendo. Infelizmente, o Congresso já aprovou leis que decidem de outro modo.
Na situação em que estão as coisas hoje, não posso partilhar as experiências pelas quais passei durante as últimas seis semanas, embora já por duas vezes tenha pedido autorização para fazê-lo, como ordena a lei.
O que acontecerá agora? Já começamos a preparar a papelada necessária para continuar a lutar a favor da Constituição dos EUA, numa Corte de Apelação. Decisão favorável dessa Corte de Justiça pode permitir-nos ressuscitar Lavabit como empresa norte-americana.
Essa experiência ensinou-me lição muito importante: se o Congresso não agir, ou se não se criar logo um forte precedente jurídico, recomendo MUITO SERIAMENTE que ninguém confie seus dados privados a nenhuma empresa que tenha qualquer tipo de laços com os EUA.
Atenciosamente,
Ladar Levison
Proprietário e Operador, Lavabit LLC
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É raro ver um provedor de serviços de e-mail optar por fechar sua empresa e sair dos negócios, para não ceder no campo dos próprios valores – disse Opsahl. – Deve ter sido decisão duríssima para Ladar Levison, mas ele se manteve fiel ao próprio negócio, que oferecia sobretudo privacidade, acima até dos lucros. E também é decisão que afeta terrivelmente os usuários, alguns dos quais perderam um tipo de acesso a e-mail que já não encontrarão em lugar algum.
Como escreveu Spencer Ackerman, do The Guardian,
[Edward] Snowden seria usuário do provedor Lavabit. Uma mensagem de e-mail distribuída por esse provedor e que se acredita que tenha sido enviada por Snowden convidava vários jornalistas para uma conferência de imprensa, em meados de julho, no aeroporto Sheremetyevo em Moscou.
E Glenn Greenwald, também do The Guardian, escreveu:
O mais assustador, sobre o fechamento do provedor Lavabit que os proprietários acabam de anunciar é que a empresa está proibida por ordem judicial, até de discutir as ordens judiciais que recebeu, o processo judicial que está construindo para defender-se e os procedimentos judiciais a que foi submetida. Em outras palavras, o proprietário da empresa, cidadão norte-americano, entende que seus direitos constitucionais e os direitos constitucionais de seus clientes estão sendo violados pelo governo dos EUA, mas foi proibido de falar sobre isso.
A decisão que Levison tomou em relação à própria empresa foi imediatamente tomada também por outra empresa provedora de serviços protegidos, sua concorrente, Silent Circle, a qual, ontem, 6ª-feira, divulgou a seguinte nota a seus usuários:
Desenhamos nossos serviços de telefonia, vídeo e texto (Silent Phone e Silent Text) para que fossem completamente protegidos de ponta a ponta, com total criptografia para os clientes, de modo a que a exposição dos dados a nós confiados fosse nenhuma. A razão é óbvia – nada arquivamos, porque, quanto menos informação arquivarmos, melhor para vocês e para nós.
Silent Mail, por isso, foi uma espécie de guardião para nós todos. E-mails que usem os protocolos padrão de internet de modo algum oferecem as mesmas garantias de seguranças que as comunicações em tempo real. Há muitos pontos de vazamento de informação e de metadados intrínsecos nos próprios protocolos de e-mail. Mensagens de e-mails, como as conhecemos, com SMTP, POP3 e IMAP não são nem podem ser seguras.
Por isso, sempre tivemos muitos clientes interessados e usuários. Silent Mail oferece garantias semelhantes de segurança também oferecidas por outros sistemas de e-mail, e sempre entendemos que seria serviço útil e valioso.
Mas nos vemos obrigados a reconsiderar essa posição. Já pensávamos há algum tempo sobre isso, se seria boa ideia. Hoje, outro provedor de serviços seguros de e-mail, Lavabit, anunciou que está deixando de operar, “para não ser cúmplice de crimes contra o povo norte-americano.”
Entendemos a mensagem e decidimos que o melhor para nós e fechar também nossa empresa Silent Mail, agora. Não fomos intimados, não recebemos mandados judiciais, mensagens ‘da segurança dos EUA’ nem nada semelhante, de nenhum governo. Por isso decidimos agir agora.
Já há semanas estávamos discutindo esse assunto, e as mudanças planejadas começarão na próxima 2ª-feira. Consideramos desligar o serviço, mantê-lo só para os atuais clientes e inúmeras outras possibilidades, até hoje. Melhor prevenir que remediar, e decidimos que, em matéria da segurança da empresa, a pior solução seria nada fazer.
Silent Phone e Silent Text, com a prima Silent Eyes são empresas que oferecem serviços seguros de ponta-a-ponta. Não temos dados encriptados e não arquivamos metadados das conversações dos clientes. Essas empresas continuarão como até agora. Ainda trabalhamos para encontrar vias inovadoras para efetivamente proteger as comunicações.
Pedimos desculpas por qualquer transtorno ou inconveniência que venhamos a provocar, e esperamos que todos entendam que, se insistíssemos, as inconveniências poderiam vir a ser ainda mais inconvenientes.
David Meyer, blogueiro tech e especialista em alta tecnologia e negócios, manifestou afinal publicamente, o pensamento que está em todas as conversas, ante o que os jornais continuam a publicar: sugeriu que o programa de vigilância total do governo dos EUA terá impacto terrível sobre toda a economia digital nos EUA, com clientes preocupados com a própria privacidade, os quais afinal começam a ver que não há como resistir contra a ação das agências de espionagem dos EUA.
O fechamento de várias empresas sugere que serviços de provedores de e-mails seguros absolutamente não podem ser mantidos em território dos EUA, sem serem ameaçados de terem de trair a confiança dos clientes, em qualquer caso que lhes seja ordenado pela autoridades norte-americanas – escreveu Meyer em Gigaom.
O movimento agitou os críticos que estão, cada vez mais, se fazendo ouvir sobre como os esforços de vigilância do governo dos EUA põem sob risco todos os negócios norte-americanos de alta tecnologia. As empresas já temem o movimento de fuga de clientes internacionais que tratarão de levar seus negócios para outros países, no esforço para escapar da vigilância da Agência de Segurança Nacional. Jennifer Granick, diretora de Liberdades Civis do Centro Stanford Center para Internet e Sociedade, escreveu que “o governo dos EUA, em seu frenesi de espionar tudo e todos, pode acabar por matar nossa indústria mais produtiva. Lavabit talvez seja só o canário, na mina de carvão”.
O que agora se vê é que o impacto negativo da ação de espionagem da Agência de Segurança Nacional, contra cidadãos e empresas norte-americanas, não se manifestará apenas na perda de clientes ou em empresas que fecharão suas operações, antes de serem intimadas a entregar dados que receberam em confiança, como parte do próprio negócio.
A destruição já começa a alcançar todo um vasto setor da economia dos EUA. Hoje, a última esperança que resta, para que os EUA reformem suas práticas de espionagem interna, é que o país se dê conta de que a espionagem ilimitada fere já, gravemente, a própria economia dos EUA.
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[*] Jon Queally é editor senior do sítio Common Dreams desde 2007. Cobre vários assuntos como Política interna e externa dos EUA, Direitos Humanos e dos Animais, Mudança Climática, e outros. É também editor de opinião e trabalha diariamente na criação, seleção e gerenciamento de novos conteúdos.
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Fonte: Rede Castor Photo