Escassez de mão-de-obra em Chapecó: Desafios, contradições e caminhos para a valorização do trabalho

Por Emi Pandolfo, para Desacato.info.

A cidade de Chapecó enfrenta um dilema que impacta setores estratégicos, como a agroindústria, a tecnologia da informação e a construção civil. A dificuldade em contratar mão de obra levou a Associação Comercial e Industrial de Chapecó (ACIC) a buscar soluções junto ao poder público. Uma das propostas em discussão é a qualificação de beneficiários do Bolsa Família para poderem ingressar no mercado de trabalho formal.

No entanto, essa proposta esbarra em uma realidade dura: o descompasso entre renda e custo de vida em Chapecó. O valor mínimo do Bolsa Família gira em torno de R$ 600 por família, enquanto o salário mínimo nacional é de R$ 1.518. Nas indústrias locais, onde a escassez de profissionais é mais acentuada, os salários dificilmente ultrapassam R$ 2.000,00. Com aluguéis de kitnetes na cidade chegando a R$ 1.200,00 e reajustes recentes nas tarifas do transporte público, muitos trabalhadores enfrentam um cenário de desequilíbrio entre remuneração e custo de vida.

A escassez de mão de obra não resulta simplesmente da falta de profissionais, mas de um sistema que desvaloriza o trabalhador. Esse tema, no entanto, não é debatido de forma transparente pelas empresas e entidades, ou, quando é, não chega ao conhecimento público. O que se vê, em vez disso, é uma narrativa distorcida que culpa o trabalhador, como no caso lamentável do prefeito João Rodrigues, que chamou os professores municipais de “vadios” ou se vangloriou por reduzir de 7 mil para 5 mil o número de famílias beneficiárias do Bolsa Família.

Chapecó costuma se orgulhar da quantidade de “oportunidades” de trabalho que oferece, mas é preciso questionar a qualidade dessas oportunidades. Não falo apenas da qualidade do trabalho em si, mas da qualidade de vida que ele proporciona. Muitas pessoas migram para a região atraídas pela promessa de uma vida melhor, mas, ao chegarem, deparam-se com um custo de vida elevado e “oportunidades” de trabalho exaustivas e exploratórias.

Quantas vezes você já pegou um carro de aplicativo e descobriu que o/a motorista era de outra região ou até mesmo de outro país? Em uma dessas ocasiões, conversei com um motorista haitiano que falava português fluentemente. Ele me contou que, ao chegar ao Brasil, aceitou a única oportunidade que encontrou: trabalhar no abate de aves em um frigorífico. Descreveu aqueles anos como “terríveis”, que trabalhou naquelas condições até aprender o idioma e organizar seus documentos. Conseguiu financiar um carro e hoje trabalha como autônomo. Apesar de ainda trabalhar muito, ele afirmou que tem mais tempo para descansar e que sua vida está “muito menos pior” do que antes. Assim fica fácil compreender o motivo de tantos trabalhadores irem para a informalidade. 

A redução da escala de trabalho 6×1 foi amplamente debatida no ano passado e precisa voltar à pauta. No entanto, quando se fala em qualidade de vida para a classe trabalhadora em Chapecó, a resposta dos que detêm o poder de mudar essa realidade muitas vezes se resume a ataques com termos chulos, como “vadios” ou “vagabundos”.

Emi Pandolfo é comunicadora social e apresentadora no Portal Desacato.


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1 COMENTÁRIO

  1. Esse o padrão em Santa Catarina. Os salários não alcançam nem para pagar o aluguel, o transporte público é caro e ruim e apenas existe para ir a trabalhar, pois a ideia é que você seja uma escrava. Transporte barato e fins de semana para sair com a família, não, isso é para vagabunda/os ou vadios, “sua missão é ser nossa a escrava/o”. Viver, não, não isso só para as e os patrizinhos, os verdadeiros inúteis.

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