Por Caroline Oliveira.
A primeira parcela do auxílio emergencial de R$ 600 do governo federal não chegou para 26 milhões de brasileiros que tiveram o pedido do benefício negado porque, de acordo com a Caixa Econômica Federal (CEF), não se encaixam nos requisitos solicitados. Alguns, no entanto, possuem informações incorretas nos bancos de dados do governo, e, ainda que precisem do dinheiro, não conseguem acessá-lo.
Além desses, 12,4 milhões também não receberam o dinheiro, porque as informações enviadas ao governo federal são “inconclusivas”. Outras seis milhões de pessoas aguardam o pedido que está em análise pela Dataprev. Até o momento, aproximadamente 50,52 milhões de pessoas receberam a primeira parcela do auxílio.
Assistência e centralização
Adriana Marcolino, diretora técnica do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), afirma que tem observado problemas em todas as fases do processo. Segundo ela, falta assistência para quem não tem acesso aos meios eletrônicos, não tem pacote de dados suficiente para baixar o aplicativo, para quem tem dificuldade em preencher o cadastro ou precisa de quaisquer outras informações.
A centralização de todo o processo no âmbito do governo federal, por si só, já é vista como algo problemático. Marcolino argumenta, por exemplo, que as unidades do Centro de Referência de Assistência Social (CRAS), que pertencem à esfera municipal, poderiam ser utilizados para solucionar dúvidas e problemas cadastrais da população.
Outro problema que, segundo Marcolino, poderia ser resolvido, é a sobrecarga para a Caixa Econômica Federal em relação ao pagamento. Ela acredita que a rede bancária poderia ter sido utilizada para além da Caixa, evitando, por exemplo, as filas quilométricas que estampam os noticiários atualmente.
O trabalhador do banco e ex-presidente da Federação Nacional dos Funcionários da Caixa (Fenae) Pedro Eugênio Beneduzzi explica que os bancários estão trabalhando até 12 horas por dia para dar conta da demanda. Ainda assim, o volume de pagamentos a serem realizados se sobrepõe.
Beneduzzi afirma que houve propostas para descentralização do processo, ou seja, que o pagamento fosse feito por outras instituições bancárias públicas, como o Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES) e Banco do Brasil. “Se continuar centralizado, as filas vão continuar”, alerta Beneduzzi.
Erro de cálculo
Para ele, houve um “erro de avaliação enorme” ao contabilizarem que apenas 25 milhões de pessoas entrariam com a solicitação do benefício, que já foi feita, na realidade, por 96 milhões de brasileiros.
“É evidente: não existe nenhum banco ou estrutura no país que estivesse preparada para atender 50 milhões de pessoas num prazo curto de tempo. E tem de ser num prazo curto de tempo, porque as pessoas precisam desse valor.”
Mesmo assim, o bancário ressalta que os trabalhadores da Caixa realizaram um trabalho “extraordinário”, foram “trocando a roda com o carro andando”, e que o pagamento para a segunda parcela deve ser “mais tranquilo”.
Pedro Guimarães, presidente da Caixa Econômica Federal, afirmou em coletiva de imprensa que o pagamento da segunda parcela será mais eficiente. “Já temos a base das pessoas que receberão [os pagamentos]. Uma parte relevante do que a gente estava pagando eram pessoas que a gente ia montando dentro da base de dados. E, para não esperar um mês para começar a pagar, fomos pagando as pessoas sendo analisadas”, afirmou Guimarães.
O ministro da Cidadania, Onyx Lorenzoni, afirmou, nesta quinta-feira (7), que o pagamento da segunda parcela sairá na próxima semana e que o cronograma completo deve ser divulgado nesta sexta (8). Também na quinta, a Justiça Federal no Maranhão determinou a reorganização do sistema de pagamentos no estado em até 15 dias, e orientou que ocorra a descentralização entre os bancos públicos.
Desde terça-feira (5), o governo federal disponibilizou uma ferramenta de consulta do status do pedido, como resultados, datas de recebimento e envio dos dados pela Caixa à Dataprev e justificativa para eventual negativa do benefício. O cidadão pode acessar a ferramenta por meio dos seguintes endereços: www.cidadania.gov.br/consultaauxilio e www.consultaauxilio.dataprev.gov.br.
A parcela da população que obtém seu sustento com o trabalho informal cresceu de forma expressiva nos últimos anos. De acordo com os dados mais recentes da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a 41,1% dos trabalhadores brasileiros são informais, o equivalente a 38,4 milhões de pessoas.
“Se a gente considerar todos aqueles trabalhadores, inclusive os autônomos, chega a quase 50% do mercado de trabalho informal, mais 12% de desempregados. Então, tem toda uma massa de pessoas que, nesse cenário de restrição da atividade econômica, perderam totalmente a renda”, analisa a diretora técnica do Dieese.
Nesse sentido, segundo ela, o auxílio emergencial é importante, mas não tem sido suficiente para suprir a carência das famílias “Do ponto de vista social é uma tragédia porque sequer está garantindo a segurança alimentar para a população de baixa renda, isso acaba expondo as pessoas a saírem para procurarem alternativas de renda, sair do isolamento social.”
Marcolino conclui ressaltando que a massa de trabalhadores informais é fruto de políticas econômicas e sociais que foram “escolhidas no último período”, como as reformas trabalhista e previdenciária. “Aumentaram a desigualdade, pobreza e informalidade e agora a gente está lidando com esse volume gigantesco de pessoas que não têm renda.”
Edição: Rodrigo Chagas.