Por Marco Weissheimer.
Um grupo de entidades da sociedade civil, sindicatos de trabalhadores, coletivos e movimentos populares encaminhou uma representação ao Procurador-Geral de Justiça do Rio Grande do Sul, Fabiano Dallazen, solicitando a abertura de investigações para apurar a possível ocorrência de uma série de crimes contra trabalhadores de indústrias frigoríficas instaladas no Estado, em especial das empresas JBS, Minuano e BRF. Na representação, as entidades pedem apuração sobre a ocorrência dos seguintes crimes: infração de medida sanitária preventiva; perigo para a vida ou saúde de outros; desobediência a ordem legal de servidor público; crimes contra a fiscalização do Poder Público em questões que dizem respeito ao Meio Ambiente de Trabalho; lesão corporal e homicídio, decorrentes da exposição de trabalhadores e trabalhadoras da indústria frigorífica ao contágio da covid-19 nos municípios de Passo Fundo, Marau e Lajeado.
A representação cita os debates e decisões decorrentes dos crimes ambientais de 2015 (Samarco) e 2019 (Brumadinho), em Minas Gerais, relativas à responsabilização de empresas, seus técnicos e executivos pela morte de trabalhadores. O caso de Brumadinho, citam as entidades, resultou na “denúncia de 16 pessoas, entre elas o então presidente da Vale, Fábio Schvartasman, além de diretores, gerentes, geólogos, engenheiros e consultores da mineradora e das empresas Vale S.A., Tüv Süd Bureau de Projetos e Consultorias Ltda., por 270 homicídios qualificados (de funcionários, empresas terceirizadas, moradores dos municípios e turistas), além de crimes contra a fauna e a flora, crime de poluição e crimes ambientais”. Ainda no caso de Brumadinho, a denúncia sustenta que “os crimes de homicídio foram praticados mediante recurso que impossibilitou ou dificultou a defesa das vítimas e também foram praticados através de meio que resultou em perigo comum, uma vez que um número indeterminado de pessoas foi exposto ao risco”.
Segundo Rafaela Cacenote, integrante da Rede Nacional de Advogados e Advogadas Populares (Renap) e da Comissão de Direitos Humanos de Passo Fundo, o objetivo das entidades é provocar a atuação do Ministério Público Estadual, para que adote as medidas necessárias à investigação da possível ocorrência de crimes e a responsabilização criminal das empresas e de seus representantes, em decorrência do descumprimento das disposições sanitárias determinadas pelo Poder Público e a exposição de trabalhadores da indústria frigorífica ao risco de contágio da Covid-19 nos municípios de Passo Fundo, Marau e Lajeado.
“É necessário investigar a quem competia dirigir, monitorar e controlar a efetividade das medidas que vinham sendo adotadas pelas empresas, que possivelmente resultaram na exposição ao risco e contaminação de funcionários e de seus familiares, quando podiam e deviam adotar medidas preventivas efetivas de maneira célere”, afirma a advogada.
Hoje no Estado, destaca ainda Rafaela Cacenote, “o setor emprega mais de 50 mil pessoas, de modo que as decisões tomadas pelos dirigentes das empresas, que não levem em conta a realidade epidemiológica da cidade e região de atuação desses frigoríficos, e que não priorizem a saúde do trabalhador das plantas frigoríficas, criando as condições necessárias ao surgimento de focos de contágio da Covid-19, certamente geram um impacto bastante grave para a saúde pública”. Além disso, acrescenta, também colocam em risco a cadeia de produção e o abastecimento de alimentos, gerando prejuízos à população, em decorrência da interdição e fechamento de indústrias.
A representação assinala que até o início de maio, os frigoríficos do Rio Grande do Sul já tinham registrado pelo menos 124 casos confirmados de covid-19 e mais de 16 mil trabalhadores teriam sido expostos à doença dentro de unidades frigoríficas. O documento cita nove frigoríficos com casos confirmados em sete municípios do Estado: Passo Fundo, Marau, Garibaldi, Lajeado, Carlos Barbosa, Encantado e Tapejara.
Os signatários da representação encaminhada ao MP assinalam ainda que, em que pese a indústria frigorífica ser reconhecida como essencial, por ser vinculada a produção de alimentos, parte importante de sua produção é destinada à exportação. ˜Há uma decisão das empresas de seguir com a produção e o trabalho em toda a cadeia produtiva do setor (agricultores, aviários, transporte, insumos, abatedouros) voltada à exportação, num período em que a Organização Mundial da Saúde recomenda a restrição da parte não essencial da produção e a diminuição do contato interpessoal, para evitar a propagação do vírus e assim salvar vidas”, criticam as entidades.
Assinam a representação encaminhada ao Ministério Público Estadual as seguintes organizações:
Acesso – Cidadania e Direitos Humanos, RENAP-RS Rede Nacional de Advogados Populares – Rio Grande do Sul, AJURD – Associação de Juristas pela Democracia – Núcleo Planalto Médio, Conselho Municipal de Saúde de Passo Fundo, Comissão de Direitos Humanos de Passo Fundo (CDHPF), Central Sindical e Popular Conlutas (CSP Conlutas) – Regional Passo Fundo, Movimento Nacional de Luta pela Moradia (MNLM), Centro de Educação e Assessoramento Popular (CEAP), Articulação Nacional de Movimentos e Práticas de Educação Popular e Saúde – ANEPS, Movimento Mulheres em Luta (MML) – Regional Passo Fundo, Associação Cultural de Mulheres Negras (ACMUN), Movimento de Mulheres Camponesas/RS, Federação dos Trabalhadores da Saúde (FEESSERS), Sindicato dos Trabalhadores da Saúde (Sindisaúde), Sindicato dos Metalúrgicos de Passo Fundo, Sindicato dos Comerciários de Passo Fundo, Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos Bancários de Passo Fundo e Região e 7° Núcleo CPERS Passo Fundo.