Por Cristiane Sampaio/Brasil de Fato.
Tradicional entidade do campo civil e popular, o Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST), que desde 1984 investe em uma expressiva luta em prol da reforma agrária, pretende agora ampliar o número de representantes da organização em parlamentos. A ideia é lançar mais candidatos tanto ao Poder Legislativo local como no Congresso Nacional.
A 11 meses do pleito de 2022 – quando os brasileiros deverão eleger novos senadores, deputados estaduais, distritais e federais –, há candidaturas que estão em fase de acertos políticos e consolidação, portanto, o movimento ainda não sabe a quantidade exata de postulantes a esses cargos. Um número, no entanto, já está no horizonte da organização: haverá correligionários concorrendo em 15 estados e no Distrito Federal.
“Nossa principal preocupação é a democracia, e ela passa pela distribuição da terra. O MST está, neste momento, fazendo todo um debate. Nossa estratégia principal sempre vai ser a luta pela terra e a reforma agrária, mas, pra isso, precisamos atuar em outros espaços”, afirma Alexandre Conceição, da direção nacional da entidade.
O MST é tido como um dos principais adversários políticos do governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) entre as entidades da sociedade civil que fazem oposição à gestão. O avanço conservador, que teve início no governo Temer (2016-2018) e se agravou de 2019 para cá, deu impulso para que a organização trabalhasse a ideia de dar mais musculatura ao seu corpo de representantes no Poder Legislativo.
Um dos principais articuladores dos grandes protestos populares de rua pelo país, o movimento é crítico especialmente da agenda econômica do governo e faz coro permanente contra o arrocho fiscal, a alta da inflação, a pauta das privatizações, além da estagnação dos pedidos de impeachment.
Nascido também na década de 1980 e no seio da resistência à ditadura militar, o PT tende a ser a principal sigla que irá acomodar candidatos do MST ano que vem, mas outras legendas do campo da oposição também podem se tornar destino dos sem-terra , segmento onde a entidade vê um grau de permeabilidade ideológica para a agenda que pretende levar adiante.
Figuras como o governador Flavio Dino, do Maranhão, e o deputado federal Marcelo Freixo (RJ), por exemplo, fortalecem o diálogo do MST com o Partido Socialista brasileiro (PSB), partido que hoje abriga os dois políticos. Freixo deve concorrer ao cargo de governador pela sigla e ajuda a costurar a candidatura da militante sem terra Marina dos Santos, que atua no movimento desde a adolescência. Ela também mantém tratativas atualmente com o PT.
Outro possível candidato do MST é o militante Erivan Hilário, que deverá tentar uma vaga na Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF). Ele tem forte envolvimento com a área de formação educacional da entidade e deve figurar nas urnas como “Ruth Venceremos”, identidade drag queen à qual o ativista costuma dar vida em Brasília, onde desenvolve também um trabalho de luta pela agenda do público LGBTQIA+.
Tropa
Atualmente, o MST tem três deputados na Câmara Federal. Valmir Assunção (PT-BA), João Daniel (PT-SE) e Marcon (PT-RS) compõem o chamado “núcleo agrário” da bancada petista, que faz oposição à Frente Parlamentar Agropecuária (FPA), conhecida como “bancada ruralista”.
Os três são originalmente de bases da militância do campo e foram assentados pela reforma agrária antes de ocuparem cargos no Congresso. Valmir Assunção destaca que os representantes do MST encontram embaraços políticos para fazer avançar a pauta da reforma agrária inclusive entre membros oposicionistas na Câmara.
“O formato de reforma agrária de alguns, mesmo sendo de oposição, não compreende a necessidade da democratização do acesso à terra, então, lógico que tem dificuldade. A necessidade de se ter mais deputados é justamente para superar essas dificuldades”, afirma Assunção.
Para João Daniel, o Legislativo federal carece de mais parlamentares com origem no MST por ser a arena onde se aprova o orçamento da União, principal terreno de disputa no país e ponto definidor dos rumos das diferentes políticas públicas. Ele se queixa da configuração de forças na Câmara e no Senado, onde as vagas são hegemonizadas por interlocutores de grandes grupos econômicos.
“Por isso é fundamental termos deputados da classe trabalhadora, dos movimentos populares e sindicais. O MST e a Via Campesina têm força, têm voto, por isso é fundamental que debatam o papel da política e a importância de termos mandatos parlamentares para disputarem as políticas publicas, disputar orçamento, debater ideias e construir grandes projetos ligando parlamento e ruas.”
Marcon (PT) lembra que a pauta levada pelos militantes sem terra ao Poder Legislativo vai além da reforma agrária, incorporando demandas que têm ligação direta ou indireta com o tema. É o caso da agenda ambiental.
“Nós precisamos de mais deputados e deputadas assentados da reforma agrária na Câmara e nas Assembleias Legislativas dos estados para defender a reforma agrária popular, mas também a reforma urbana, o povo trabalhador do campo e da cidade, a agroecologia e combater o uso de venenos.”
Edição: Rodrigo Durão Coelho.