Enfim, algo de honesto sobre o Wellington do Realengo


Por Raul Longo.

Eu estava só esperando culparem o governo pela tragédia do Realengo.

Informa a agência Wikileaks que os E.U.A., sempre muito prestos nessas horas, imediatamente orientou a mídia brasileira a culpar Alá.

Não deu certo. Desgraçadamente na carta do Wellington a única referência religiosa foi Jesus.

Mas ainda se especula que o atentado de 11 de Setembro teria sido o incentivo.

Técnicos, bombeiros, sobreviventes, engenheiros e projetistas do WTC, equipes de analistas da França, da Espanha e do próprio Estados Unidos; através de comparações com incêndios em edificações similares, depoimentos e diversas evidências, inclusive registradas em imagens de câmeras de vigilância do Pentágono e filmagem da implosão das Torres Gêmeas e de outro prédio do complexo que sequer foi atingido por avião algum; demonstram claramente que somente a colisão dos jatos não poderia provocar o que se viu acontecer.

Meses antes, um assessor da Casa Branca incriminado por corrupção declarou que o governo Bush precisava de um novo Pearl Harbor. Há quase uma década no Afeganistão não se encontrou Osama Ben Laden que primeiro teria negado para em seguida admitir-se como responsável por aquele atentado.

Assim mesmo nenhum dos atilados analistas brasileiros jamais duvidou ser obra de fundamentalistas islâmicos que com algumas horas de treino em teco-teco se capacitaram para as manobras com os enormes jatos.

Mas que mais cedo ou mais tarde culpariam o governo brasileiro pela tragédia do Realengo, eu não tinha dúvida alguma.

Hoje o noticiário anuncia a ação de mais um franco atirador, mas dessa vez na Holanda. Culpa do governo holandês? Claro que não!

O da Alemanha, foi culpa do governo alemão? O da Finlândia, do governo finlandês?

Evidentemente não pode, afinal são países do primeiro mundo.

Se Bush houvesse aniquilado com o Iraque e o Afeganistão em tempo, ninguém o culparia por Columbine, mas é tão execrado quanto Nixon por perder no Vietnam.

Isso foi em outros tempos. Hoje o grande Satã é o Islã e Deus está conosco.

Com que diabos estaria Wellington?

Eu não tinha a menor dúvida de que logo encontrariam o Satã brasileiro!

Não precisei esperar muito. Hoje já recebi algo nesse sentido. Até vai bem o “analista”, mas não conseguiu escapar da tentação de culpar o governo pelos 24 anos de existência e falta assistência ao jovem Wellington Menezes de Oliveira.

E não é qualquer governo, não! Só poderia ser o governo para todos, mas que não incluiu o Wellington.

Que importa se incluiu tantos, se o Wellington, da classe média e herdeiro de casa de subúrbio, continuou se excluindo?

Para minha sorte, coincide de hoje enviarem o primeiro comentário honesto sobre o assunto. Só mesmo o Ribamar Bessa Freire para resgatar algum senso nessas horas.

Taqui Pra Ti o link do blog do Ribamar, onde sempre se pode comprovar que ainda persiste alguma inteligência e dignidade no país:

 

http://www.taquiprati.com.br/cronica.php?ident=911

ALÔ ALÔ, REALENGO!

José Ribamar Bessa Freire

10/04/2011 – Diário do Amazonas

Não tinha amigos, não batia papo nem contava piada, nunca namorou, jamais lhe deram um cheiro no cangote ou alisaram sua mão, nunca transou, não torcia por time algum, nunca foi ao Maracanã, não xingou juiz de ladrão, de sua garganta jamais saiu um grito apaixonado de gol, não desfilou em qualquer bloco de carnaval. Passava o tempo na internet, em jogos eletrônicos, mas nunca recebeu um aviso no facebook solicitando: “me adicione como amigo”.

Esse filme a gente já viu. Ele é americano. Surge, agora, uma produção brasileira, um compacto que mistura roteiros das várias versões importadas dos Estados Unidos. Aqui o cenário foi uma escola em Realengo, no subúrbio carioca. O personagem principal invadiu a escola, executou friamente doze alunos e feriu mais dez. Foram importados dos Estados Unidos seu nome – Wellington – e os dois apelidos – Sherman e depois Suingue, botados pelos colegas.

O primeiro foi inspirado na figura nerd de Chuck Sherman, “the Sherminator”,do filmeAmerican Pie. O segundo, no seu jeito desajeitado de caminhar, causado por uma perna ligeiramente menor que a outra, que produz um balanço, um ‘suingue’, no dizer debochado dos colegas. Na versão americana de Ohio, o aluno H. Coon, que entrou na escola e atirou em quatro colegas antes de se suicidar, também mancava e ficou conhecido pelo apelido de Deixa-que-eu-chuto.

A história de Wellington começa a ser contada, aos fragmentos, por colegas, vizinhos e irmãos adotivos entrevistados pela mídia, com registros esparsos sobre seu nascimento e sua passagem pelo mundo da família, da escola e do trabalho.  Aliás, ele não nasceu, foi excluído do ventre de sua mãe – uma moradora de rua com problemas mentais.

Precisa de carinho

Na escola, usava calças com cós acima da cintura e meias até os joelhos. A menina mais bonita da turma se jogava em cima dele, fingindo assediá-lo, só pra sacanear. Ganhou fama de homossexual. Não reagia às agressões, à semelhança do estudante de origem sul coreana, nos Estados Unidos, Cho Seung-hui, que matou 32 pessoas na Universidade de Virginia e deixou uma carta dizendo ter sido discriminado como um bicho: “eu morro como  Jesus Cristo, para inspirar gerações de pessoas fracas e indefesas”.

Seguindo o modelo americano, Wellington também escreveu uma carta, “rogando para que na sua vinda Jesus me desperte do sono da morte”. Nela, deixou um testamento, legando sua casa para alguma instituição encarregada de cuidar dos animais abandonados, “pois os animais são seres muito desprezados e precisam muito mais de proteção e carinho do que os seres humanos que possuem a vantagem de poder se comunicar”.

Wellington não tinha o poder de se comunicar. “Mal ouvíamos a voz dele, vivia no mundo dele– contou uma vizinha. “Era muito calado, muito fechado e a galera pegava muito no pé dele, mas não a ponto de ele fazer isso – disse seu ex-colega Bruno Linhares, 23 anos, se referindo ao massacre. Precisava de proteção e carinho?

Outros colegas admitiram que o rapaz foi vítima de ‘bullying’ na Escola Municipal Tasso da Silveira, onde estudou de 1999 a 2002, quando sofreu constantes intimidações. “Além de tudo, ele ainda tirava notas baixas” – completou Bruno. No 8º ano, ficou em recuperação em quase todas as matérias.

“A gente chorou muito pensando que Wellington matou aquelas 12 crianças em represália pelo que aconteceu com ele quando nós estudávamos juntos” – contou Thiago da Cruz, outro ex-colega, que usou o adjetivo assustador para se referir ao bullying e à chacota a que Wellington foi submetido. Em entrevista à Folha, reconheceu que não suspeitava do dano que cometeram e acrescentou chorando: “Não era para ninguém ter pago por uma coisa que nós fizemos”.

“Ele era tímido e calado” – confirmou ao Globo o gerente da fábrica de alimentos Rica, sediada em Jacarepaguá, adiantando que Wellington permaneceu silencioso o tempo todo numa dinâmica de grupo realizada na firma, onde trabalhou durante dois anos como auxiliar de almoxarifado. A indústria, que abate 170.000 aves por dia e aloja cerca de 46 milhões de pintos, considerou “baixa” a produtividade dele.

Por isso, Wellington Menezes de Oliveira, 23 anos, foi excluído do trabalho, demitido em agosto de 2010. Ficou desempregado. Depois da morte da mãe adotiva, passou a morar sozinho mergulhado na mais extrema solidão. Não foi apurado ainda com que recursos ele sobreviveu nos últimos meses.

Nessa quinta feira, 7 de abril, vestido de preto e com duas armas, como o menino de Ohio, Wellington voltou ao local do crime – a escola onde estudou – para acabar com aquilo que o molestara. Incorporou o apelido de “the Sherminator”, encurralou e executou 12 crianças, feriu outras 13, quase todas mulheres, num banho de sangue nunca visto numa escola brasileira. Depois, ferido, se suicidou com um tiro na boca.

Escola de merda

Errou o alvo. Atirou no que viu e matou o que não viu. Ceifou os sonhos de Larissa,14 anos, que  queria ser modelo; de Bianca, a gêmea de 13 anos, que gostava de navegar na internet; de Mariana, 12 anos, o xodó da família, que adorava tirar fotografias; de Géssica, 15 anos, uma menina alegre que havia feito planos de estudar na Marinha; de Igor que gostava de futebol, torcia pelo Flamengo e jogava na Escolinha do Vasco. E de  tantas outras adolescentes sonhadores.

“Ela morreu naquela escola de merda” gritava dentro do hospital dona Suely, mãe de Géssica. Familiares e amigos ficaram imersos no desespero, na revolta, na dor e na perplexidade. Como foi possível isso acontecer? Podíamos ter evitado? Como?

– “Poderia ter sido um de nós, um de nossos filhos” – escreveu uma leitora do Globo, sem atentar que foram doze de nós, doze de nossos filhos. Por isso é que o Brasil inteiro se sentiu ferido com os tiros disparados por Wellington, que atingiu a todos nós, embora com intensidade diferente.

O presidente do Senado, José Sarney, sempre ‘brilhante’, sugeriu que “o governo deve, a partir desse episódio, reforçar a segurança dentro das escolas brasileiras e até mesmo incluir no currículo um item chamado segurança”. Outras sugestões foram feitas: instalação de câmeras, detectores de metal, catracas, guaritas, porteiros armados. Por que não canhões? Ou fossos ao redor como nos castelos feudais? Isolar a escola da comunidade onde está encravada é alguma garantia de segurança?

A prefeitura do Rio chegou a iniciar, em novembro do ano passado, a contratação de porteiros para as escolas, mas houve denúncias de que as vagas estavam sendo loteadas através de indicação política, naquele modelo que o Sarney gosta, usa e abusa. Suspenderam as contratações e abriram uma CPI.

O governador Sérgio Cabral, ainda desorientado, diagnosticou o assassino como “psicopata”, como um “animal”, reforçando as palavras de Sarney para quem Wellington é “um fanático”,“um fronteiriço, possesso – esta é a palavra – entre a loucura e a maldade”. O diagnóstico dos dois configura ‘exercício ilegal da profissão’.

Quem produziu Wellington? Por que um espetáculo tão macabro, no qual todos somos perdedores? Se não procurarmos responder essa pergunta, outros Wellingtons surgirão, tirando o gostinho dos Bolsonaros por seu linchamento, já que se suicidou.  O diabo é que estamos todos perplexos, confusos. Quem diz que sabe o porquê do acontecido, sinalizando um único fator como a causa de tudo, comete um erro. Uma certeza nós temos: nem o presidente do Senado nem o governador sabem o que dizem.

Desconfio que além das pessoas tocadas de perto pela tragédia, precisamos todos, os 180 milhões de brasileiros, de assistência psicológica. No meio de tanta dor, não temos ainda a grandeza sequer de dizer: Descansa em paz, Wellington. Enquanto isso, só nos resta fazer como os familiares das crianças assassinadas e os moradores de Realengo que nesse sábado deram um enorme abraço na Escola Tasso da Silveira.

Alô, Alô, Realengo, aquele abraço solidário e aquele cheiro no cangote que Wellington nunca recebeu, levando consigo três fiapos de humanidade: o beijo na testa da professora de literatura, a preocupação com os animais desamparados e a retirada de um aluno de sua mira: “fica frio, gordinho, que eu não vou te matar”.

 

 

1 COMENTÁRIO

  1. E NO MEIO DISTO TUDO UM FILHO DA PUTA HONESTO:
    A Ponte e a Fila
    A HISTÓRIA DE UM FILHO DA PUTA HONESTO
    A VENDA NA LIVRARIA SARAIVA

    Resumo
    O grau de honestidade, de certa forma, sempre foi tratado como um tabu. A esperança em encontrá-lo de forma satisfatoria nas outras pessoas é o que fazem alguns não enterra-lo dentro de si próprio de uma vez por todas. Ninguém quer ser vitima dos desonestos, mas, às vezes, fazem vitimas para os iguais.

    Autor
    Sufi, Sergio

    MAIS IMAGENS

    Detalhes
    Em nossa contemporaneidade, mas no passado distante, Laura Santos, uma órfã abandonada no portão de um convento, ainda bebê recém-nascido, foi encontrada pela irmã Sofia, uma freira, que com a ajuda de outras irmãs a criou e a educou dentro dos princípios cristãos. Aos seus dezessete anos, em uma investida de caridade, Laura conheceu Rebeca, uma drogada, interna em um hospício. Laura, em sua ingenuidade, achou ter encontrado uma amiga, porém, Rebeca a desvirtuou dos caminhos e das práticas cristã, levando-a a prostituição. Já pós-Balzaquiana, e conhecendo os dois lados da vida, resolve dar um sentido à sua existência, concebendo um filho e ensinando-o, na sua concepção, o lado mais compensador da vida, pela sua experiência. O certo é que o menino foi aprimorado e se tornou o filho de uma puta honesto! Mas, mesmo na fase adulta, seus empreendimentos eram escassos. Formado em história, vivia conspirando contra a própria história da humanidade; sempre reinventava interpretações, que embora lógicas, não tinha como prová-las. Nos fatos históricos, que podiam ser temperados com profecias, para cada acontecimento, como marco na humanidade, criava hipóteses em forma de teorias, que ele norteava como certa, ainda mais quando essas podiam ser recheadas de algo divino, nestes acontecimentos. Quando perde a mãe por uma doença terrível, desenvolve em si um estado de inércia que nada parecia ter a menor importância. Assim, algo extremamente cotidiano o desperta para vida. Então, resolve ser um político, como forma de ocupar-se e trazer um novo sentido para a sua existência. E daí? Um filho duma puta honesto ele conseguiu ser! E agora como político! Será que ele conseguirá ser um político honesto? Esta é a historia de A Ponte e a Fila!
    Informação Adicional
    A VENDA NA SARAIVA
    Autor Sufi, Sergio
    ISBN 978-85-7923-251-0
    Páginas 243
    Formato

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