Encantou no último sábado, o paladino da biomassa: José Walter Bautista Vidal. Um nacionalista, apaixonado e apaixonante. Impossível ficar impassível diante do profundo amor que tinha pelo país e pelo pensamento próprio, autóctone, original. Cientista, professor universitário, físico de renome, ele foi, juntamente com Urbano Ernesto Stumpf (1916-1998), o idealizador do motor à álcool, que hoje move a maioria dos carros brasileiros. Fez da sua vida uma peregrinação incansável pela soberania energética, dando conferências por todo o país, nos recantos mais inauditos, e escrevendo livros. Conseguiu editar 12 títulos entre os quais estão : De Estado Servil à Nação Soberana; Civilização Solitária dos Trópicos; Soberania e Dignidade, Raízes da Sobrevivência; O Esfacelamento da Nação; e A Reconquista do Brasil.
O último trabalho foi a “Economia dos Trópicos”, no qual martela pesada crítica ao pensamento cepalino do desenvolvimento e manifesta seu desejo de ver o Brasil saindo da dependência, rompendo com o sistema de dominação global. Bautista acreditava que o sol, a água e a mata eram as maiores riquezas do país e que com esses dois elementos o Brasil poderia ser auto suficiente em energia. Fez dessa ideia o seu discurso itinerante e defendeu até o fim dos seus dias a proposta da biomassa como substituta do petróleo e dos outros sistemas poluentes e destruidores.
Bautista Vidal era chamado para discutir energia em todos os lugares do Brasil, mas foi muito pouco escutado por aqueles que tinham o poder de fazer acontecer as suas idéias. Sonhava com um encontro íntimo com Fidel. Acreditava que o gigante cubano iria entender a sua proposta e ser cúmplice dos seus desejos. O encontro nunca se deu. Quando Chávez assomou no cenário latino-americano, voltou seus olhos para o venezuelano sonhando também trazê-lo para sua proposta de energia limpa. Com esse teve muitas conversas mas, ao que parece, não teve tempo de fazer brotar uma outra proposta de matriz energética para a Venezuela. Foi-se o comandante, e agora Vidal.
Lembro dele, numa noite amena em Campina Grande, falando alto, as bochechas vermelhas na excitação das palavras que jorravam aos borbotões. Tudo o que queria era que o Brasil acreditasse nos seus jovens, que os governos criassem laboratórios, centros de pesquisa, e criassem a ciência nova, descolonizada. Vidal se mudava em menino quando defendia esse sonho. Ele acreditou nisso até o fim dos seus dias. Crítico feroz do neoliberalismo e das privatizações efetuadas por FHC, Bautista não poupava imprecações contra aqueles que chamada de vende-pátria. Amava o Brasil, amava a ciência.
Enquanto vivo, suas ideias mofaram nas prateleiras. Agora, encantado, haverá de brotar outra vez, descoberto por um ou outro. E, dos livros agora heréticos, haverão de repercutir seus sonhos de um país autônomo, soberano. Porque é sempre assim que acontece. Existem pessoas que são póstumas, com suas ideias reconhecidas só bem depois de deixarem o mundo. Espero que não demore.
De minha parte, tive a alegria de ter convivido com esse “quixote” por várias ocasiões, sentada a seus pés, ouvindo seus ensinamentos, seus palavrões, suas indignações. O Brasil fica mais pobre sem esse homem especial. Mas, Bautista Vidal é um desses seres eternos, que deixam sua marca indelével. Agora, transformado ele mesmo em energia, retornará, na íntima fusão a qual tanto amava, de sol, verde a água. E nós, que o conhecemos e o amamos, o receberemos como merece: estudando seus livros, defendendo nossa soberania, criando pensamento próprio.
Bautista Vidal, nacionalista, tropical, homem de paixão. Nunca nos deixe em paz. Tua voz troante, indignada e profética seguirá ecoando. Tu vives.
Fonte: Palavras Insurgentes.