Por José Álvaro de Lima Cardoso.
O estrago feito pelos golpistas em menos de três anos de (des)governo, não foi brincadeira. Enfraqueceram o Estado nacional, estão desmontando as políticas de segurança alimentar, detonaram as políticas de soberania enérgica que a duras penas vinham sendo montadas, estão destruindo o sistema de defesa que o Brasil vinha construindo; afetaram drasticamente a renda dos trabalhadores, e pretendem privatizar tudo o que for possível. Além disso, estão enfraquecendo a Petrobrás através de uma série de mecanismos, e entregando os recursos do pré-sal; reduziram o orçamento em ciência e tecnologia a quase nada; congelaram gastos primários (como educação e saúde) por 20 anos. Prometendo retomar rapidamente o crescimento, destruíram empresas nacionais e causaram a maior estagnação econômica da história do Brasil. Estão condenando, com suas políticas, o Brasil a ser um eterno fornecedor de matérias primas para o mundo desenvolvido, se adequando aos interesses dos países imperialistas, especialmente dos EUA.
O show de submissão explícita que assistimos na semana passada, na viagem de Bolsonaro ao EUA, com direito a declarações bizarras de todo o tipo, nos dá a nítida impressão que estamos sendo governados por representantes de um governo estrangeiro. Além do entreguismo vira lata de Paulo Guedes (“nós vendemos 12 aeroportos. Daqui 3 a 4 meses nós vamos vender petróleo, o pré-sal), as declarações de Bolsonaro no Chile, revelam que a destruição de direitos está só no início, pelo menos pelos planos do governo. Bolsonaro declarou, por exemplo, no país vizinho, que “na questão trabalhista nós devemos beirar a informalidade porque a nossa mão-de-obra é talvez uma das mais caras do mundo“.
Enquanto os extravagantes ministros do governo Bolsonaro seguem afirmando que adoram Coca-Cola e a Disneylândia, os EUA continuam, sem trégua, desestabilizando governos no mundo todo, com atenção especial para a América Latina, que consideram seu “quintal”. A tentativa de entrega da previdência para os bancos, as privatizações de uma forma geral, a privatização da educação e da saúde, significam, antes de mais nada, a possibilidade de aumentar lucros do setor privado, especialmente de grandes empresas estrangeiras, que irão levar a parte do leão.
A espinha dorsal do programa golpista é implacável com os trabalhadores de uma forma geral, mas especialmente com os segmentos mais vulneráveis. Quem está perdendo o emprego neste momento são os segmentos mais pobres da classe trabalhadora, que já foram muito impactados pela crise. Apesar de atingir setores mais vulneráveis, no entanto, as medidas afetam todos os que vivem do trabalho no Brasil. Quem pode, por exemplo, entre 95% da população, se dar ao luxo de prescindir da seguridade social, dos serviços públicos, da educação pública, das leis trabalhistas, dos recursos do pré-sal?
A queda na aprovação de Bolsonaro, detectada pela pesquisa Ibope, recentemente divulgada, mostra que a insatisfação cresceu mais entre os mais pobres no país. Se no conjunto dos eleitores a perda foi de 15 pontos percentuais em relação ao início do mandato, entre os eleitores que auferem de 2 a 5 cinco salários mínimos de renda familiar mensal, a queda é de 18 pontos. Ainda que o resultado do Ibope seja surpreendente, pelo pouco tempo de governo, era esperado para mais cedo ou mais tarde. Afinal de contas o programa ultra neoliberal sob coordenação de Paulo Guedes, prejudica a todos os trabalhadores e classe média de uma forma geral, mas principalmente os seus segmentos mais pobres. Privatizações sem limites, implosão da seguridade social, redução de transferências sociais do governo, ainda que sejam ataques à nação como um todo, afetam principalmente os segmentos mais dependente das políticas estatais.
Como já se previa, Bolsonaro e sua equipe correm contra o tempo. Precisam implantar um programa antinacional e antipovo para ajudar os grandes capitais a enfrentar a queda de seus lucros e a crise mundial do capitalismo. O que significa elevar muito o grau de exploração num país onde o salário médio está em torno de R$ 1.500,00 (setor privado), e onde quase cinquenta milhões de compatriotas dependem do Bolsa Família para não passar fome. Além de ser um governo sem autoridade e legitimidade para realizar tais políticas (já que o precário apoio de uma parte da população está erodindo rapidamente), a economia não parece que irá ajudar. O PIB cresceu somente 1,1% em 2018 e, no quarto trimestre do ano, apresentou expansão de apenas 0,1% em relação ao trimestre imediatamente anterior, o que aponta que não existe perspectiva de crescimento significativo em 2019.
Há uma monumental crise, caracterizada por baixo crescimento, praticamente no mundo todo. Mas nos países onde houve golpes, a retomada do crescimento é ainda mais difícil, em função da total ausência de credibilidade dos governos. No caso do Brasil a situação se agrava pela total incompetência do núcleo de poder para uma ação política e econômica mais eficaz, que faça a economia retomar. Crescimento em torno de 1% num país já estagnado há vários anos, é gravíssimo. O fato de que a economia, desde o golpe em 2016, não engatou um ciclo de crescimento, por modesto que fosse (uma promessa dos golpistas), é elemento decisivo na atual conjuntura. Se a economia estivesse crescendo e gerando empregos, o governo Bolsonaro, mesmo sendo resultado direto de uma fraude, poderia angariar alguma legitimidade para realizar aquilo para o qual lá foi colocado.
Apesar das dificuldades de se pensar cenários sociais e econômicos mais precisos para os próximos meses, em qualquer deles as organizações sindicais serão ainda mais fundamentais. Não conseguiremos enfrentar este turbilhão de desafios de forma isolada, como se os problemas de desemprego, falta de dinheiro, falta de perspectivas, pudessem ser enfrentados individualmente. Esses problemas só conseguirão ser encarados de forma plena através da organização coletiva, principalmente a sindical, que atua na esfera fundamental, que é a econômica. Na prática é isso que vem ocorrendo, apesar da insuficiência das ações no período. Mas sem organização dos trabalhadores via sindicatos, não haveria regulamentação da jornada de trabalho, salário mínimo, seguro desemprego, sistema público de saúde e demais conquistas sociais, obtidas à duríssimas penas ao longo da história mundial do trabalho.
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