Por Rodrigo Gomes.
O rebaixamento do Departamento de IST, AIDS e Hepatites Virais do Ministério da Saúde para parte de um setor mais amplo chamado Departamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis, feito pelo governo de Jair Bolsonaro (PSL), revoltou ativistas, pessoas que convivem a doença e o ex-ministro da Saúde e atual deputado federal Alexandre Padilha (PT-SP). O parlamentar avalia que essa mudança é muito grave, pois o setor perde em autonomia para a execução de políticas. E a retirada do termo AIDS do nome é uma forma de “tentar colocar no esquecimento algo grave, que é a epidemia do vírus, existente no Brasil e no mundo”.
Padilha ressaltou que o governo está acabando com uma política que é referência internacional em saúde pública, construída ao longo dos últimos 20 anos e fortalecida pelos governos petistas. “O trabalho de prevenção ao vírus ultrapassou vários governos e foi fortemente aprimorada por Lula e Dilma. Em 2013, por exemplo, o Brasil voltou à vanguarda mundial na resposta à AIDS ao adotar a estratégia de ampliar o acesso ao tratamento da forma mais rápida possível. Isso fez com que pudéssemos reduzir o número de mortes causadas pelo vírus”, relembra. Dados do Ministério da Saúde mostram a taxa de mortalidade pela infecção teve queda de 16,5% entre 2014 e 2017.
O Movimento Nacional de Luta Contra a AIDS destacou que o governo agiu de forma “perversa,” não tendo informado qualquer proposta de alteração nas reuniões da Comissão Nacional de IST, HIV/Aids e Hepatites Virais (CNAIDS) e da Comissão Nacional de Articulação com Movimentos Sociais (CAMS), ocorridas há um mês. “Não se trata apenas de uma questão de nomenclatura: é o fim do Programa Brasileiro de AIDS. O governo, na prática, extingue de maneira inaceitável e irresponsável um dos programas de AIDS mais importantes do mundo, que foi, durante décadas referência internacional na luta contra a Aids”, diz o movimento.
Jair Bolsonaro nunca escondeu uma visão preconceituosa sobre pessoas que têm HIV. Em entrevista ao programa Custe o Que Custar (CQC), em 2010, Bolsonaro declarou que a infecção é problema de quem tem a doença. “A pessoa não pode ficar aí na vida mundana e depois querer cobrar do poder público um tratamento que é caro nessa área aí. Se não se cuidou, o problema é dele”, afirmou. Na prática, as políticas de enfrentamento da doença passam a ser elaboradas conjuntamente e dividindo recursos com ações contra a Tuberculose e a Hanseníase. A medida foi oficializada pelo Decreto 9.795, de 17 de Maio de 2019.
As organizações ressaltam que a AIDS ainda “mata cerca de 12 mil pessoas por ano e que, longe de estar controlada, continua crescendo, especialmente entre populações pobres e estigmatizadas, já tradicionalmente excluídas e que com este ato se tornam mais invisíveis e desrespeitadas”.
Vanessa Campos, integrante do Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas avaliou que o objetivo do governo é tornar a invisível tanto a AIDS quanto suas demandas específicas. “Isso já vem sendo feito na prática com a campanha de prevenção no Carnaval que focou em homens cis héteros. Além disso, com a incorporação da hanseníase na pasta, também divide-se a atenção com esta outra especificidade que já não recebe o enfoque necessário há anos. Resta a pergunta: e a implementação de recursos financeiros para tudo isso, como fica? A AIDS não é prioridade para este governo”, afirmou, à Agência de Notícias da AIDS.