Durante a 54ª Assembleia Geral da Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), que ocorreu entre os dias 6 e 15 de abril em Aparecida (SP), dom Roque Paloschi, presidente do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e arcebispo de Porto Velho (RO), fez um comunicado sobre a situação dos povos indígenas no Brasil. “Em nosso Brasil, os povos indígenas continuam sendo flagelados e crucificados”, afirmou dom Roque.
No comunicado, o arcebispo afirma que a alegria trazida pela Constituição de 1988 durou pouco. “Os setores político econômicos anti-indígenas atuam fortemente no âmbito dos Três Poderes da República e pretendem implementar ações estruturantes e sistemáticas contra os povos”, diz o comunicado.
O informe aos bispos dá conta de que grupos ligados a interesses do agronegócio, das mineradoras e de empreiteiras buscam, por um lado, impedir o reconhecimento e a demarcação das terras tradicionais atualmente invadidas, sob posse de não índios, e, por outro, “invadir, explorar e mercantilizar as terras demarcadas, que estão na posse e sendo preservadas pelos povos”.
Citando os projetos legislativos que visam a retirar os direitos indígenas, como a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215 e o Projeto de Lei (PL) 1610, que permitiria a mineração em terras indígenas, e o clima de criminalização que impera no Poder Legislativo brasileiro, Dom Roque Paloschi considera que “é altamente preocupante o aumento de manifestações de preconceito, discriminação e ameaças aos povos”.
Em seu comunicado, dom Roque também alerta para as interpretações restritivas do artigo 231 da Constituição Federal feitas pela Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), as quais acabam por descaracterizar o dispositivo que garante aos povos indígenas a demarcação de seus territórios tradicionalmente ocupados, reduzindo sua efetividade apenas às terras sob posse dos indígenas na data de 5 de outubro de 1988.
Tal interpretação já resultou na anulação de atos administrativos de demarcação de três terras indígenas: Guyraroká, do povo Guarani-Kaiowá, e Limão Verde, do povo Terena, ambas no Mato Grosso do Sul, e Porquinhos, do povo Canela-Apãniekra, no Maranhão.
“A 2ª. Turma do STF, especialmente na pessoa do Ministro Gilmar Mendes, também tem insistido em negar o direito fundamental de acesso à justiça aos povos indígenas, suas lideranças e comunidades”, destaca o comunicado de dom Roque. “Os povos, suas comunidades e suas organizações nunca foram intimados e não são parte em qualquer dos processos judiciais que resultaram na anulação de atos administrativos de demarcação das três terras indígenas acima citadas, mesmo tendo seus direitos frontalmente atingidos no âmbito desses processos”.
Dom Roque aponta ainda a “omissão como decisão de governo”, falando sobre a paralisação das demarcações de terras indígenas por parte do governo federal, e “o Retorno aos ‘anos de chumbo’”, afirmando que “os povos e seus aliados voltam a ser tratados da mesma forma que o eram nos chamados ‘anos de chumbo’ do período ditatorial”, com o aumento de perseguições, criminalizações, prisões, assassinatos e expulsões com uso de força bélica estatal e paraestatal.
O presidente do Cimi também informou aos bispos da CNBB sobre os processos de criminalização que os indígenas e seus aliados vem sofrendo, a exemplo do próprio Cimi, que tem sido mencionado na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Funai e do Incra e enfrenta uma CPI com a finalidade específica de criminalizar a entidade, na Assembleia Legislativa do Mato Grosso do Sul (MS), e na qual o próprio dom Roque depôs na última terça-feira (13).
“As perseguições, as ameaças, os ataques que o Cimi e nossos missionários sofrem cotidianamente mostram que estamos trilhando o caminho certo, pois o próprio Senhor Jesus chamou de bem-aventurados ‘os que são perseguidos por causa da justiça’”, conclui dom Roque, que terminou seu comunicado lembrando aos bispos o recente pedido de perdão feito pelo Papa Francisco, em nome da Igreja Católica, aos povos indígenas em Chiapas, no México.
Foto: Reprodução/CIMI
Fonte: CIMI