Por Raul Fitipaldi, para Desacato.info.
Dias atrás estava escutando uma entrevista que meu amigo da Rádio Nacional Argentina, Julio Rudman, fez a Juan Carlos Monedero, politólogo, escritor e ideólogo de PODEMOS, a segunda grande notícia progressista na União Europeia, depois de Siryza. Monedero relatava as motivações que o povo espanhol teve para se organizar num partido novidoso, fruto das mobilizações 15-M. O 15-M leva esse nome por causa das manifestações que ocuparam as ruas das principais cidades da Espanha, em 2011. Essas mobilizações tinham matrizes diferentes do que se conhecia historicamente, não só na Espanha. De que estavam compostas e contra que protestavam?
O 15-M nem só se mobilizou convencionalmente contra o sistema econômico, judiciário e contra o desemprego. Denunciou seu descrédito na classe política, não sou do bipartidismo representado pelo PP – Partido Popular (direita rançosa pro imperial) e o PSOE – Partido Socialista Espanhol (socialdemocratas de direita, nada tênue), também protestou contra outras agremiações, como Esquerda Unida (IU), que sim é progressista, porém, se viciou nos corredores da burocracia legislativa e municipal, institucionalizou a reivindicação e se corrompeu, em não poucos casos. Uma história que nos resulta familiar no Brasil e em Florianópolis.
Na última segunda-feira, assisti a uma reunião de um movimento social da Capital catarinense. Vi, escutei e falei pouca coisa útil, certamente. No entanto, verifiquei que os tempos mudaram. Entre as lutas da década de 90, Parque da Luz, Marina da Barra, as da primeira década do novo século (Passe Livre) e as atuais, há até estéticas bem diferentes. Desesperançador? Animador? Não, outra coisa. Novos rostos, um discurso mais novidoso, alguns labirintos a serem percorridos, pouco peso político partidário (quase nenhum) e consciência de solidão nos militantes. É ruim? Não acredito.
A bancada legislativa progressista de Florianópolis é diminutíssima. A quantidade de ações jurídicas, técnicas, legislativas, sociais e políticas não permitem esperar mais do que um esforço gigante, resultados parcos e voluntarismo representativo emergencial. Boa vontade sobra em um ou outro gabinete. Faltam pernas. A sociedade de Ilha e Continente, a cada 4 anos, afirma eleitoralmente a direita na Câmara de Vereadores. É espantoso. Mas, qual o por quê.
Devem se esgrimir muitos argumentos, no entanto, se sobressai a desconfiança, desinteresse e impossibilidade real de acompanhar o que gira em torno aos negócios lastimáveis que emporcalham a Cidade. Ao fim, as pessoas tem que trabalhar, são levadas a se alienar, se individuar, se endividar e desaparecer como conjunto. O stress de Florianópolis, não permite muito mais que ouvir ou assistir a versão oficial dos fatos e produzir até a escravidão para pagar as contas. O resto se sabe: brutalização na baldeação dos terminais de ônibus, emprego irregular, ocupação vertical, dinheiro transnacional que vai tomando conta do território, especialmente do lado da Ilha, e uma conhecida lista de etcéteras.
Em tal contexto, Florianópolis se parece à Espanha de 4 anos atrás. Não se avista um discurso centralizador, com receitas prontas, com um partido político determinado que sintetize as demandas. A direção sindical, salvo poucos casos, não está no seu melhor momento, e sem a Classe organizada tudo se torna mais íngreme. Porém, há gente descontente, jovens inquietos, novas anatomias sociais que por vezes ocupam uma reitoria, outras um terminal, mas, que parecem prenunciar a necessidade de ocupar um espaço político maior na disputa de Modelo de Cidade, de enfrentamento ao Capitalismo destruidor e à parte mais podre da classe política e institucional.
Quando alguns grupos mais à esquerda, na Espanha, começaram a soltar as amarras que os tinham presos na Esquerda Unida, na Esquerda Catalã, incluso no PSOE, primeiro foram para a rua. Ocuparam a rua! Foram inorgânicos, dispersivos, emotivos. Foram e aconteceram e, quando parecia que daria em nada, surgiu esse tal PODEMOS, que tem com o rabo entre as pernas ao bipartidismo PP-PSOE, e pode vencer as eleições gerais de 2015, como já venceu Syriza na Grécia.
Florianópolis, ao dizer do vereador Lino Peres, está na Unidade de Terapia Intensiva. Tão grave seu estado, que já houve meia dúzia de manifestações nos primeiros 40 dias do ano. Vontade de se mobilizar existe. Gente querendo manifestar seu desconforto também. Eleitores da direita, do centro, da esquerda (se é que algo disso tem a política local). Tudo parece indicar, pelo começo que teve o ano e pelo deterioro que apresentam o Executivo Municipal, a Câmara Municipal e até as reitorias das universidades públicas, sem contar as direções partidárias e até alguns sindicatos, que aquela consciência de solidão que observei na segunda-feira, pode vir a compor uma Unidade de Lutas que nos abra a porta de uma trilha sociopolítica desconhecida, desafiante e com poder de mudar o atual estado de coisas. Se em Florianópolis PODEMOS ou não, 2015 nos dará uma boa medida.
Foto de Fernanda Pessoa – arquivo do Portal Desacato.