Em 1992, STF deu ao Senado poder de rejeitar impeachment

Presidentes da Câmara e do Senado travam batalha para definir quem dará a palavra final sobre a abertura do processo contra Dilma Rousseff.
Por Débora Melo.

Dilma Rousseff tem motivos para estar otimista em relação ao julgamento, pelo Supremo Tribunal Federal, de ações que questionam o rito do impeachment na Câmara, nesta quarta-feira 16. Além da possibilidade de o STF anular a eleição da comissão especial conduzida pelo presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), há chances de os ministros entenderem que o Senado tem o poder de reverter decisão dos deputados e, assim, dar a palavra final sobre a abertura do processo de impeachment.

Foi esse o entendimento da Corte em 1992, ao definir o rito para o afastamento do ex-presidente Fernando Collor de Mello, conforme noticiou o site Jota, de notícias jurídicas. Entendimento semelhante, hoje, poderia beneficiar Dilma, que tem entre seus aliados, ao menos momentaneamente, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Além disso, ao contrário da Câmara de Cunha, abertamente hostil à presidente, o Senado seria um fórum de debate mais amistoso para a petista.

Em 1992, ao admitir o impeachment de Collor, a Câmara autorizava os senadores a “instaurar” o processo. O Senado, então, criaria uma comissão que teria dez dias para elaborar um parecer sobre a admissibilidade da peça. Na ocasião, o STF determinou que o presidente da República só seria afastado temporariamente depois que uma maioria simples votasse, em Plenário, pela abertura do processo. Caso o parecer fosse rejeitado pelo Senado, o processo de impeachment seria arquivado.

Processo contra Dilma

Na sexta-feira 11, Renan enviou ao Supremo um parecer no qual afirma que o Senado não pode ser obrigado a referendar o que foi definido pela Câmara e que, portanto, cabe aos senadores uma votação própria antes de dar continuidade ao processo de impeachment. Na prática, Renan quer ter o poder de rever a decisão tomada por dois terços dos deputados.

Esse entendimento, que segue o rito de 1992 e também é defendido pela presidenta Dilma e pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, se baseia no artigo 86 da Constituição de 1988, que estabelece que a suspensão do presidente só ocorre após a “instauração” do processo pelo Senado.

O rito estabelecido por Cunha, contudo, baseia-se na Lei do Impeachment (1.079/1950), segundo a qual o afastamento temporário do presidente deve ocorrer imediatamente após a admissão do processo pelos deputados. A tese defendida por Cunha é que a instauração do processo é um “ato meramente formal” e não há necessidade de deliberação por parte dos senadores. Ele argumenta, ainda, que a votação de 1992 no Senado foi “simbólica”.

De acordo com o jurista Dalmo Dallari, professor emérito da faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, o consenso que havia contra Collor em 1992 representa uma diferença “essencial” em relação ao momento atual. “Ninguém defendia o Collor, por isso a questão da formalidade não foi discutida. Como não houve esse debate no Congresso, a continuidade do processo foi quase automática”, afirma.

Cunha-Renan
Os presidentes da Câmara e do Senado, Eduardo Cunha (à esquerda) e Renan Calheiros

Segundo Dallari, a Constituição determina que cabe ao Senado dar a palavra final. “A Câmara prepara o julgamento e manifesta uma opinião. É uma mera opinião. A decisão sobre a abertura do processo é do Senado”, diz.

O professor de direito constitucional da FGV-SP Roberto Dias afirma que o ideal é manter o entendimento de 1992. “Parece-me mais interessante que mantenhamos o entendimento adotado no caso Collor. Na ocasião, o rito foi defino pelo Supremo e, de lá para cá, não houve nada de excepcional em matéria de impeachment. Então não há razão para afastar o precedente.”

Para o professor Floriano Peixoto de Azevedo Marques Neto, da USP, “não há dúvida” sobre o poder de decisão do Senado, mas cabe ao Supremo estabelecer regras. “Se a Câmara aceita e o Senado rejeita a abertura do processo, há um conflito entre as duas Casas. Possivelmente o Supremo vai estabelecer alguma regra para essa decisão do Senado, para que seja uma decisão qualificada.”

Fonte: Carta Capital

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