Por mais que digam que o objetivo das religiões é promover o amor, o respeito e a união, não é de hoje que sabemos que várias religiões e igrejas são pautadas em opressões históricas (machismo, racismo, LGBTfobia) e que repercutem até os dias de hoje. Isso fica cada vez mais evidente quando artistas tentam mostrar outras representações da história com grupos discriminados.
Recentemente, o espetáculo “O Evangelho Segundo Jesus: Rainha do Céu”, escrito por Jo Clifford e dirigido por Natalia Mallo, sofreu inúmeras tentativas de censura e ataques no Brasil. Várias pessoas ditas religiosas rejeitaram absolutamente a mensagem respeitosa do espetáculo, e focaram que a atriz que representa Jesus é uma travesti, Renata Carvalho. A classificaram como imprópria e uma afronta à religião.
A obra surge exatamente de um contexto transfóbico. A autora – que era frequentadora assídua de uma igreja – foi expulsa de sua comunidade logo depois que se revelou mulher trans. Enquanto artista, ela foi refletir as motivações disso e escreveu o texto do espetáculo por meio da pergunta: “Se Jesus voltasse, na pele de quem ele seria tão estigmatizado?”.
Outra representação que vem sendo atacada é a recriação da artista norte-americana Harmonia Rosales do quadro “A Criação de Adão”, de Michelangelo. No lugar das figuras masculinas de Deus e Adão, ela representou figuras femininas como mulheres negras. E só porque a imagem mostra mulheres negras foi o suficiente para que considerassem a imagem um desrespeito, degradação e de mal gosto.
“Eu queria fazer uma pintura significativa, amplamente reconhecida que subconsciente nos condiciona a ver figuras masculinas brancas como poderosas e autoritárias e mudar o script, estabelecer uma contra narrativa”, declarou ao Buzzfeed. Ela aponta ainda para uma versão muito mais realista: Se você considera que toda a vida humana saiu da África, do Jardim do Éden e tudo mais, faz sentido pintar Deus como uma mulher negra”.
Todas essas representações mostram o papel importante da arte no questionamento e na transformação social. Evocam e evidenciam também o lado transfóbico, machista e racista das igrejas e varrem para debaixo do tapete as mensagens de amor ao próximo, respeito e acolhimento – tão necessários nos tempos de hoje.
Se isso te incomoda, já parou para perguntar o motivo? Vale a reflexão das artistas e a tentativa de responder sem ser preconceituoso:
“E se Adão e Deus fossem mulheres negras?”, “Qual é o problema de Deus ser representado como uma mulher negra?”, “Por qual motivo uma figura feminina e negra não pode ser representada como poderosa?”, “Por que considero uma travesti menos indicada, menos digna, de mal gosto, uma afronta, um desrespeito para o papel?”, “E se Jesus voltasse como travesti, seria crucificada de novo em nome da religião?”.
Fonte: NLucon