É proibido sonhar com o desenvolvimento nacional

Presidente Lula com 70 funcionários da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco – Foto: Ricardo Stuckert/PR

 

Por José Álvaro Cardoso.

Na semana passada o governo federal anunciou a retomada das obras da Refinaria Abreu e Lima (RNEST), em Ipojuca, no Litoral Sul de Pernambuco. O objetivo anunciado pela Petrobras é o de dobrar a capacidade de refino de petróleo e produção de óleo diesel no país. A empresa anunciou investimentos de R$ 17 bilhões até 2028, sendo que até R$ 8 bilhões serão investidos na RNEST. As obras na refinaria estavam paralisadas desde 2015, em pleno processo de construção do golpe de Estado, que foi sacramentado no ano seguinte. A retomada da construção da refinaria faz parte dos investimentos previstos no Programa de Aceleração do Crescimento, anunciado em agosto do ano passado. A meta do governo federal é aumentar a capacidade de processamento da refinaria, dos 100 milhões atuais, para 260 milhões até 2028.

A decisão do governo é, no essencial, extremamente oportuna. É fundamental tomar medidas para reter ao máximo a renda petroleira no Brasil, não tem cabimento extrair petróleo com extrema eficiência, como faz a Petrobras,  e não aproveitar todo o potencial de geração de emprego e renda possibilitado, pela longa e densa cadeia do petróleo.  A conjuntura econômica atual do Brasil requer a atenção, conseguiu-se poucos avanços econômicos em 2023. Por essa razão, o esforço incansável para reindustrializar e agregar valor aos produtos deveria estar no centro da estratégia econômica e política.

Como o Brasil, entre os países atrasados, é um dos mais industrializados ainda, apesar de todo o processo de recuo da indústria nos últimos anos, ele é atacado com muita ferocidade. Não foi por acaso, a reação da mídia conservadora, em relação à decisão do governo de retomar as obras na Refinaria Abreu e Lima. Todo o ódio dos setores conservadores, em relação às aspirações de soberania econômica e política do Brasil, vem a tona, quando o governo toma qualquer iniciativa no campo da industrialização do país. É bom considerar que esse pessoal acalente um sonho, que mal consegue disfarçar: transformar o país em definitivo, em um exportador de matérias primas e em uma base onde as companhias estrangeiras possam explorar seus negócios, aproveitando a abundância de recursos naturais, como petróleo e água, e uma população super explorada, acostumada a baixos salários. Da qual, inclusive, uma parcela significativa depende de auxílio público para não morrer de fome.

A margem de operação política, de um governo que é duramente criticado por fazer uma obra fundamental para o desenvolvimento nacional, é muito apertada. As ações econômicas que o governo conseguiu desenvolver em 2023 foram importantes, como o Novo Marco Fiscal, mas insuficientes. O governo tenta realizar uma gestão que agrade a todos, o que é muito difícil na atual conjuntura nacional e internacional. Por exemplo, não foram desenvolvidas ações para reestatização da Eletrobrás, que seriam fundamentais do ponto de vista dos interesses dos brasileiros, para garantir oferta de energia a preços mais baratos, a retomada da indústria etc.

A reação da direita só não tem sido mais violenta porque a situação econômica está razoavelmente controlada neste momento. A inflação está relativamente baixa e a economia obteve um certo crescimento do PIB no ano passado (deve-se confirmar algo em torno de 3%). O crescimento, modesto para as necessidades do Brasil, possibilitou uma redução da taxa de desocupação. Além disso, o câmbio se manteve estável e o Brasil terminou o ano com o superávit comercial recorde, US$ 98,84 bilhões, o que foi fundamental para o balanço de pagamentos. Ou seja, tem uma parte significativa do empresariado que está ganhando muito dinheiro, o que desestimula a construção de um golpe, neste momento. Mas é uma correlação muito difícil para o governo.

Além disso, a parte do empresariado que tem um pouco mais de juízo, está observando atentamente o que pode acontecer com o processo de demolição da Argentina, que está sendo posto em prática pela direita neoliberal, que está dando corda à vontade para o Javier Milei (que supõe que o capitalismo vigente é o do Século 19). Como se sabe, o país vizinho, com a experiência desse governo anarcocapitalista, está servindo de laboratório para um novo paradigma de ajuste ultra neoliberal, na América Latina, caso o processo consiga ser implantado. Claro, o processo da Argentina está em aberto, não é possível prever o que irá acontecer – mas coisa boa não virá dali.

O Brasil tem outra questão fundamental, a qual o governo não consegue enfrentar, que é o “saco sem fundos” do pagamento dos juros da dívida pública, um dos maiores processos de extorsão de dinheiro público já vistos. No acumulado de doze meses, os juros nominais alcançaram R$720,1 bilhões, uma verdadeira fortuna, que come o equivalente a 6,80% do PIB, destinados a um punhado de especuladores. Como consequência destes gastos, o resultado nominal do setor público consolidado, que inclui o resultado primário e os juros nominais pagos, foi deficitário em R$834,3 bilhões, no acumulado em doze meses, até outubro de 2023 (7,88% do PIB). Imaginem se o governo dispusesse de 7% do PIB todo ano, para investir no projeto de fortalecimento da indústria e na retomada do desenvolvimento?

As dificuldades econômicas do Brasil, para serem compreendidas plenamente, devem ser analisadas no contexto mais geral da conjuntura internacional. A previsão de crescimento para a América Latina, segundo a Cepal (Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe), é de apenas 1,9% para 2024, um crescimento inferior ao de 2023, que foi de 2,4% (estimados). O Brasil tem uma população muito pobre, com quase 10 milhões de desempregados, e quase 4 milhões de desalentados, que nem mesmo entram nas estatísticas de desemprego, porque desistiram de procurar emprego. Esses brasileiros conseguem consumir apenas o mínimo para sobreviver, gerando o gargalo do subconsumo na sociedade. Como esse problema é antigo, as empresas adotam algumas técnicas de compensação, como a produção just in time e outras, evitando estoques de mercadorias. Mas tais medidas apenas aliviam o problema, sem resolvê-lo em definitivo, empurrando a contradição “com a barriga”.

No final de 2023 o Brasil recebeu a boa notícia de que subiu duas posições no ranking de maiores economias do mundo, tendo fechado 2023 em 9º lugar. Conforme o estudo do Fundo Monetário Internacional (FMI), o Brasil cresceu 3,1% no ano passado, o que possibilitará superar o PIB (Produto Interno Bruto) do Canadá, por muito pequena margem.  O PIB nominal do país deve fechar o ano em US$ 2,13 trilhões e o Canadá chegará a US$ 2,12 trilhões. Em 2022, último ano do governo Bolsonaro, o Brasil estava em 11º lugar no ranking. Os dados foram publicados no relatório World Economic Outlook (Perspectiva Econômica Mundial), divulgado em outubro último.

A subida do Brasil no citado ranking é especialmente relevante. Se o país quiser melhorar a vida de seu povo, terá que produzir cada vez mais riqueza. As condições econômicas iniciais para isso são as melhores possíveis: PIB expressivo, recursos naturais abundantes, população grande e território imenso. Mas o país é subdesenvolvido. Por exemplo, entre as 500 maiores empresas do mundo, que em 2021 geraram receitas de 37,8 trilhões de dólares (mais de um terço do PIB mundial), o Brasil possui apenas 7, inclundo duas estatais.  O poder e a influência desproporcionais dessas corporações, que centralizam a economia, e que são uma das principais expressões da dominação imperialista mundial, só poderão ser enfrentados com projeto nacional de desenvolvimento e mobilização da maioria.

A opinião do/a/s autor/a/s não necessariamente representa a opinião de Desacato.info.

1 COMENTÁRIO

  1. A história da imprensa no Brasil. Passa desde sempre pelo caixa dos americanos. A primeira TV do Brasil. A tv Tupy, de Assis Chatobriant Bandeira de Melo. Era Made in usa. Fábricada pela General Elétric. Eles forneceram os equipamentos, em troca de veiculação de anúncios. Tbm havia o repórter Esso. Auto intitulado, testemunha ocular da história. Como quem paga a conta , é quem manda, fica mole entender. O dinheiro americano, as malas cheias de dólares, são as que viabilizam as operações deficitárias destas homogenizadoras de pensamento. Sempre formam fileiras para dar golpes de estado. Foi assim com Getúlio , que abriu o cofre do Banco do Brasil, para Samuel Weiner , montar o Jornal ULTIMA HORA. Quando Getúlio meteu chumbo no peito, o povo revoltado, queimou camionetes do globo. Este povo lutava para comprar naquele dia, o jornal do homem. Por que todos sabiam que Samuel era suportado por Getúlio. A fofoca foi “notícia ” do globo e da tribuna do povo, do criador de corvos Carlos Lacerda.

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