Documentos enviados aos EUA mostram clima em SC logo após o golpe militar

    16322316Por Larissa Guerra.

    “O período de 4 a 16 de abril foi tranquilo e a única atividade frenética notada ocorreu entre políticos que nunca perdiam a oportunidade de se expressar a respeito de qualquer coisa e que agora encontraram um tema aceitável para isto. É impressionante como o Brasil reconhece agora que estava se tornando um ponto de foco da penetração comunista e a atividade por aquelas autoridades que até poucas semanas atrás se recusavam a tomar conhecimento do fato de que comunistas e esquerdistas ocupavam posições no governo”.*

    O trecho acima faz parte de um relatório elaborado pelo cônsul americano em Curitiba ao Departamento de Estado Americano em 26 de abril de 1964. Descrevendo detalhes do cenário político de Santa Catarina e do Paraná nos primeiros dias após o golpe militar, o cônsul W. Douglas McLain Júnior, relembra os principais atores políticos da época, as manifestações e, até mesmo, as primeiras prisões feitas no Estado na época.

    — Por outro lado, Jade Magalhães, secretário de Segurança Pública de Santa Catarina, é de extrema direita e nos reporta que prendeu pelo menos um liberal que o atacou em público. Ele disse que há pelo menos 40 esquerdistas na cadeia em Florianópolis e aproximadamente 120 na região Oeste do Estado. Alguns dos esquerdistas presos são considerados como realmente perigosos — relata o documento, em tradução livre da reportagem.

    O cônsul cita ainda uma queda na popularidade do então governador Celso Ramos nos primeiros dias após o golpe devido ao que considerou uma demora em aderir às forças contrárias ao presidente João Goulart.

    Ele recorda de dois nomes que, segundo ele “Santa Catarina gostaria de ver jogados para fora do escritório”: Doutel de Andrade, que era vice-governador e deputado federal pelo PTB, e Paulo Stuart Wright, deputado estadual pelo PSP, classificando o primeiro como um “ultra nacionalista de esquerda” e, Wright, como “um esquerdista e membro do diretório estadual do Partido Comunista”.

    — Um relatório confiável recentemente informou que Wright estava usando a Food for Peace (programa do governo americano para fornecer alimentos em países pobres) para atrair pescadores pobres para a sua confederação de cooperativas de pesca. Eles recebiam mantimentos caso os apoiasse — relata.

    E encerra dizendo que o secretário de Segurança Pública esperava que outros dois ou três deputados estivessem logo “na lista negra”.

    Documentos na internet

    O telegrama citado acima é parte de um acervo de 9.872 documentos americanos produzidos entre os anos de 1963 e 1977 sobre a ditadura no Brasil, disponibilizado a partir desta quarta-feira na internet em um portal de pesquisadores da Brown University e da Universidade Estadual de Maringá (UEM) por meio do projeto Opening the Archives (Abrindo os Arquivos).

    Segundo o jornal Folha de S. Paulo, a pesquisa é resultado de uma parceria entre as instituições, que digitalizaram e indexaram o material do Departamento de Estado americano e da CIA. Há, até o momento aproximadamente 2 mil documentos na página, que ficará disponível até o dia 10 de abril, quando será lançado oficialmente em um simpósio da Brown sobre a ditadura.

    Para consultar todo o acervo, acesse a página do projeto Opening the Archives.

    * Tradução livre da reportagem.

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    Fonte: Memorial dos Direitos Humanos.

    Foto: Acervo / Assembleia Legislativa

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