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Localizado no Peri Alto, bairro da zona norte de São Paulo, um campinho de futebol foi responsável pelos primeiros chutes do atacante da seleção brasileira Gabriel Jesus, nascido e criado no bairro e estrela do futebol mundial – há, inclusive, um mural em sua homenagem. Além disso, o campo de terra batida foi palco do nascimento do Pipa (Projeto Integração Peri Alto), que abre espaço na comunidade para a cultura popular entrar em cena. O coletivo leva a cultura como foco, mas também garante o direito do brincar e oferece orientação vocacional aos jovens do Peri. Agora, a missão é alçar novos voos e se firmar como uma ONG (Organização Não Governamental).
Valéria Silva Neto, auxiliar de limpeza, conta como teve início o projeto. “Um grupo de jovens chegou aqui em 2012 com um projetor de vídeo. Eles começaram a exibir filmes lá no campinho, o que foi muito legal porque muitas crianças nunca tinham ido ao cinema”, conta a auxiliar de limpeza. Ela foi a responsável por dar apoio às primeiras projeções e a integração do grupo com os moradores.
Val, como é conhecida na região, cedeu a cozinha de sua casa para o preparo da pipoca e suco, servidos para as crianças que estavam ali para assistir os filmes no cinema improvisado. Também foi ela a responsável por apresentar aqueles jovens aos moradores da comunidade. “Foi a Val que conversou com as mães e nos acolheu, não tínhamos um espaço físico”, conta a coordenadora do Pipa, Alessandra Tavares D’avanzo. “Chegamos ali apenas com a ideia de fazer algo pela comunidade. Fizemos uma pesquisa, ouvimos os moradores e percebemos que não havia espaços para lazer ou cultura na região”, conta.
Com ajuda de Val e ação de Alessandra e os demais jovens, o projeto cresceu. Além dos filmes, o foco do grupo passou a ser oferecer um espaço de integração entre as crianças e os adolescentes do Peri com o meio cultural. Para isso, uma casa foi alugada e o que era um grupo de jovens se transformou no coletivo Pipa (Projeto Integração Peri Alto), com eixo temático o resgate do brincar e da cultura popular.
No ano passado, o Pipa foi contemplado com o edital do programa “Vai” da prefeitura de São Paulo. Com os recursos, as crianças tiveram aulas de maracatu, uma forma de resgatar a cultura popular brasileira. “Muitas crianças têm suas raízes no Nordeste, para alguns isso era motivo de bullying, e por essa razão vimos que é importante valorizar as tradições culturais”, diz Alessandra.
As crianças passaram a ter aulas, mas antes foram estimuladas a desenhar o estandarte do grupo e escolher o nome. Foi daí que nasceu o grupo de maracatu “Encanto da Mata”. “Tanto as cores escolhidas como o desenho têm um significado especial para eles, porque preferem o campo de terra, onde tinham mais autonomia para brincar, e a relação com a mata (a Serra da Cantareira, vizinha da comunidade)”, continua a coordenadora do Pipa.
Após um ano de aulas, a meninada formou o primeiro grupo de maracatu da zona norte de São Paulo, fez apresentações em escolas e CCJs (Centro de Cultura da Juventude), mas não foi o suficiente para manter o apoio do “Vai” neste ano. Mesmo assim, o grupo segue com suas atividades. “Para muitas crianças esse foi o primeiro contato com um instrumento musical, muitos se desenvolveram muito bem”, conta Alessandra.
Segundo ela, a ideia central do Pipa não está nos resultados quantitativos, mas sim nas transformações, consideradas a acontecerem de forma individual e não mensurável. A crença é de que, junto com a comunidade, é possível ser instrumento de conscientização e justiça social. Por essa razão, a sede do Pipa também é usada para atividades voltadas à comunidade do Peri Alto. “Nunca pensamos que nos transformaríamos em uma ONG, queríamos ter liberdade e maior flexibilidade. No entanto, conforme fomos evoluindo, ficamos presos à falta de recursos”, avalia Alessandra.
Para tal, o Pipa busca contribuições a serem feitas pelo seu site.