Ditadura militar proibiu Mujica de entrar no Brasil em 1970

Por Vitor Sion.

Era 1970. O Brasil vivia o período de repressão mais intenso em seus 21 anos de ditadura militar, logo depois da instauração do AI-5, em 1968. Nos porões da delegacia do DOI-CODI (Destacamento de Operações de Informações do Centro de Operações de Defesa Interna), na rua Tutóia, em São Paulo, milhares de militantes de esquerda eram barbaramente torturados.

Em janeiro de 1970, uma jovem de 22 anos foi colocada no pau de arara e torturada por vinte e dois dias consecutivos. Era Dilma Vana Rousseff, hoje presidente do Brasil, que relatou em depoimento que o momento mais difícil era quando recebia choques elétricos, principalmente nas partes íntimas.

Os brasileiros, porém, não eram os únicos procurados pelo governo. Documento da Polícia Federal de fevereiro de 1970 mostra uma lista de “estrangeiros indesejáveis”. Entre eles, outro futuro líder latino-americano: o uruguaio José Alberto Mujica Cordano, conhecido como Pepe Mujica.

Vitor Sion/Opera Mundi

Imagem do documento que impedia José Mujica de entrar no Brasil durante a ditadura militar

O motivo para que o atual presidente do Uruguai fosse impedido de entrar no país era a sua atuação no MLN-T (Movimento de Liberação Nacional – Tupamaros), do qual foi um dos nove principais líderes. Na mesma época, a ditadura uruguaia, comandada por Jorge Pacheco Areco e Juan María Bordaberry, exigia perseguição — sem perdão — aos guerrilheiros tupamaros.

Além de Mujica, a PF proibia dezenas de outros tupamaros de virem ao Brasil. Um deles, Lucia Topolanski Saavedra, atual senadora e primeira-dama do Uruguai.

Poucos meses depois, Mujica foi detido no Uruguai e ficou 14 anos na prisão, até 1985. Hoje, ele é considerado um dos presidentes mais carismáticos da América Latina. Doa 90% do seu salário para ONGs e, em março, negou-se a comparecer à missa que inaugurou o pontificado do papa Francisco por ser ateu e defender o Estado laico no Uruguai.

Comissão da verdade

Enquanto isso, no Brasil, a Comissão da Verdade completou um ano nesta semana e tenta restaurar a memória coletiva do país, indicando os agentes responsáveis pela tortura e a repressão. Isso sem saber, devido à Lei da Anistia, se eles serão julgados pelas violações aos direitos humanos, como tem ocorrido em outros países da América Latina, como a Argentina.

Wikicommons

Mujica e a primeira-dama do Uruguai, Lucia Topolanski Saavedra

No que se refere à luta armada, da qual fizeram parte os grupos de Dilma e Mujica, a Comissão da Verdade esclareceu que esse tipo de ação só foi iniciada após a tortura. “A tortura começou a ser praticada nos quartéis em 1964. A tortura está na origem da ditadura militar. Ela ocorre antes da luta armada”, afirmou a historiadora Heloísa Starling, integrante do grupo de pesquisadores.

Uma das principais justificativas para a implementação do AI-5, que instituiu oficialmente a repressão em 1968, era o combate aos “subversivos que queriam um regime comunista no país”.

Fonte: Ópera Mundi

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