Via FEPAL – Federação Árabe Palestina no Brasil
A representação do Brasil no Conselho de Direitos Humanos da ONU acompanhou os Estados Unidos e votou contra, ontem, o relatório sobre a “Situação dos direitos humanos no Território Palestino Ocupado, incluída Jerusalém Oriental, e a obrigação de garantir a prestação de contas e a justiça”. Com o Malawi, foram três votos contra os direitos humanos do povo palestino, contra 37 a favor e sete abstenções, dentre elas a do Reino Unido, membro permanente do Conselho de Segurança da ONU, tal qual os EUA.
À exceção do Brasil, os seis países latino-americanos no conselho votaram a favor da Palestina e apenas um (Honduras) se absteve. Os votos dos demais membros permanentes do Conselho de Segurança (Rússia e China) foram favoráveis ao relatório. Uma surpresa foi a posição da Ucrânia, entendida como aliada de Israel, que preferiu se abster.
Desde o final da década de 1940, quando a ONU aprovou a Resolução 181 (29 de novembro de 1947) recomendando a partilha da Palestina, o que na prática levou à atual situação, com todo o território palestino ocupado por Israel e mais de seis milhões de refugiados palestinos, o Brasil manteve posição favorável a todas as resoluções que afirmam os direitos nacionais, civis e humanitários do povo palestino. Somente a partir de 2019 é que o Brasil se alinha com Israel em apoio a suas políticas para a Palestina, apontadas por relatórios da ONU e das maiores organizações não governamentais de direitos humanos como crimes de lesa-humanidade, dentre eles o de apartheid.
Para o presidente da Federação Áraba Palestina do Brasil (FEPAL), Ualid Rabah, a posição brasileira nos últimos três anos, de subordinação aos interesses de Israel, não reflete a real visão da diplomacia profissional do país para a Questão Palestina. “É mais uma posição de setores extremistas, que não enxergam os interesses nacionais brasileiros e que desprezam os direitos humanos, inclusive no Brasil e em outras partes do mundo”, explica.
Segundo ele, quando o assunto é a Palestina, a posição brasileira é orientada pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que entende da questão e do mundo “tanto quanto um cidadão comum de física nuclear”. Rabah reclama que o deputado “nutre um ódio aos palestinos que é imotivado, racionalmente inexplicável e que ultrapassa a mera ignorância do que se dá na Palestina e na região”, podendo estar ligado (o ódio) a “interesses que talvez não possam vir a público”.
Segundo Rabah, nem de um ponto de vista econômico, que muitas vezes leva os países a desprezarem os direitos humanos, esta posição se sustenta, “já que Israel é o país que mais prejuízos dá ao Brasil em sua balança comercial”, o que não é levado em consideração por “um grupo que, mesmo pequeno, tem influência no governo brasileiro”, a ponto de impor a subordinação da política externa do país ao “regime imoral, de apartheid, hoje investigado por crimes de lesa humanidade pelo Tribunal Penal Internacional, o TPI”.
O que diz o relatório
O Informe Anual do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos foi apresentado para o 49º período de sessões do órgão, reunido desde o dia 28 e com término de suas deliberações previsto para hoje. O texto (projeto de resolução) foi apresentado por Chile, Cuba, Equador, Namíbia, Paquistão, Venezuela e Palestina e pede urgência para “alcançar sem demora o fim da ocupação israelense iniciada em 1967”.
O relatório aponta, também, que Israel fere “gravemente as Convenções de Genebra de 1949” (ratificadas e promulgadas pelo Brasil), bem como que não respeita a decisão da Corte Internacional de Justiça, de 2004, que pede o fim do chamado “muro do apartheid”, com mais de 700 quilômetros de extensão e que cerca e isola a Palestina do mundo. Diz, ainda, que Israel fere o direito internacional ao tomar e ocupar territórios pela força e fragmentá-los, que o cerco israelense a Gaza provoca uma “desastrosa situação humanitária, socioeconômica e de segurança”, pedindo pelo seu imediato desbloqueio, e que são “deploráveis” as ações dos colonos israelenses em território palestino ilegalmente ocupado.
As prisões e detenções de palestinos nos cárceres israelenses, especialmente de crianças e mulheres, são condenadas no relatório, que deplora, ainda, a “prática de reter os cadáveres dos (palestinos) que resultem mortos” pelas forças de ocupação de Israel.
São preocupantes, conforme o relatório, as “restrições impostas por Israel que impedem o acesso dos fieis cristãos e muçulmanos aos lugares sagrados no Território Palestino Ocupado, incluída Jerusalém Oriental”.
Embora o relatório não traga expressamente o termo “apartheid”, seu texto cita diversas vezes as políticas discriminatórias de Israel para muitos aspectos da vida cotidiana dos palestinos, justamente as que foram apontadas nos recentes relatórios de organizações internacionais de direitos humanos para afirmar haver na Palestina um “regime de apartheid” imposto pelo estado israelense em toda a Palestina, e mesmo aos refugiados, conforme apontado pela Anistia Internacional.
O relatório finaliza pedindo que “todos os responsáveis por violações do direito internacional humanitário e dos direitos humanos (na Palestina) sejam responsabilizados por suas ações por meio de mecanismos de justiça criminal nacionais ou internacionais apropriados, imparciais e independentes, e que todas as vítimas recebam um recurso efetivo que inclua reparação abrangente”, enfatizando a necessidade de que “medidas práticas sejam adotadas para atingir esses objetivos e, assim, fazer justiça a todas as vítimas e contribuir para a prevenção de violações semelhantes no futuro”.