Depois de Manaus, quanto falta para SC começar a abrir valas? Por Claudia Weinman.

 

Vista aérea de valas comuns sendo construídas em Manaus, capital do Amazonas (Foto: MICHAEL DANTAS / AFP)

Por Claudia Weinman, para Desacato. info.

Hoje, segunda-feira, dia 4 de maio, o primeiro caso de covid-19 foi confirmado na cidade de um pouco mais de 40 mil habitantes, em São Miguel do Oeste, interior de Santa Catarina, local onde dizia-se estar tomando todos os cuidados, porém, sem isolamento social garantido pelo governo federal, estadual e municipal, a prova de que a contaminação só deve aumentar mostra-se evidente.

A mulher de 36 anos, diagnosticada com o novo coronavírus não possui histórico de viagem recente, o que, na prática, remete a uma possibilidade de transmissão comunitária. No dia 29 de abril a trabalhadora recebeu atendimento da rede pública de saúde por meio de uma ligação telefônica com entrevista clínica, e, em seguida, encaminhou-se a coleta para o exame laboratorial. Na manhã desta segunda-feira, em coletiva de imprensa (on-line), divulgou-se por intermédio do prefeito Wilson Trevisan, a confirmação do primeiro caso de covid-19 no município. A trabalhadora para complementar, apresentou sintomas de febre, tosse seca, diarreia e vômito além da fraqueza intensa.

Na coletiva de imprensa, a fala do prefeito remete a ideia de que o município está preparado para a situação, mas isso, é o que ele diz. “São Miguel do Oeste tem feito um trabalho efetivo de prevenção ao covid-19, centro de triagem, UPA 24h preparada, forte atuação do hospital regional, equipe treinada e preparada, mas hoje estamos aqui ao vivo pois tivemos o primeiro caso do coronavírus. Era visto e previsto que teríamos isso uma hora dessas. São Miguel do Oeste não está fora do mundo, entra pessoas e sai pessoas, por isso é preciso evitar aglomeração, usar máscaras”.

O Hospital Regional Terezinha Gaio Basso, administrado pelo Instituto Santé, fica localizado em São Miguel do Oeste e atende uma região com mais de 200 mil habitantes. Apenas nove leitos de UTI estão liberados para pacientes diagnosticados com o covid-19, outros nove, atendem a outras patologias. A responsabilidade do município e do estado sobre a questão da saúde é imprescindível para evitar as aglomerações e o contágio avançado por exemplo. No entanto, no final do mês de abril, a promotora de justiça Marcela Fernandes, da 4° promotoria de justiça de São Miguel do Oeste, ajuizou uma ação por ato de improbidade administrativa contra o prefeito Wilson Trevisan. Segundo a ação, o prefeito teria descumprido recomendações do Ministério Público segundo as quais, não se poderia editar normas flexibilizando serviços e fazendo contraposição ao que já estava sendo previsto na legislação estadual.

A preocupação diante do cenário no município torna-se alarmante pelos índices que estão fazendo com que o estado de Santa Catarina seja o próximo a abrir valas para enterrar seus mortos, vítimas para além do novo coronavírus, de uma política de beneficiamento de grandes empresários que têm, como historicamente, colocado os/as trabalhadores/as na linha de frente para morrer.

Para se ter uma ideia, na data de hoje, no site da Apufsc.org.br, foi divulgada uma matéria citando o estado catarinense em um cenário triste. “A coluna Painel, da Folha de S. Paulo, informa hoje que, depois do colapso de Manaus, Santa Catarina já é considerado o próximo local crítico por causa do coronavírus, segundo técnicos do Ministério da Saúde. Em uma semana, o número de casos confirmados quase dobrou. Até 24 de abril, 1.200 estavam com Covid-19 oficialmente e agora já são 2.346. A avaliação é que o número de mortes vai começar a aumentar”.

Isolamento social e as forças do capitalismo

Na primeira quinzena de março, quando no Brasil o assunto do novo coronavírus tomou dimensão e desprezo na mesma proporção, pelo governo de Jair Bolsonaro, alguns estados tomaram medidas importantes seguindo as recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS). Serviços de todos os tipos foram suspensos. Ninguém mais frequentaria Igrejas, academias, shoppins, entre outros. Nos primeiros quatro dias uma pressão gigantesca partindo dos grupos de empresários fizeram com que o governador Carlos Moisés cedesse aos poucos, até a liberação dos mesmos serviços que até então eram considerados de grande risco para o povo.

Foram várias as forças contrárias ao isolamento social. No dia 29 de março, por exemplo, o Deputado Estadual Milton Hobus do PSD divulgou um áudio em que teceu ameaças ao governador Carlos Moisés e disse que a partir daquele dia várias articulações seriam feitas junto à Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo de Santa Catarina- Fecomércio e a Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarina- Fiesc, exemplos citados por ele, para que o governador retomasse as atividades econômicas. E assim se fez, não demorou muito para que um novo decreto fosse pretendido e firmado.

Por outro lado, os/as que sempre pagaram o preço pelo lucro dos patrões preocupam-se em ter o que comer e como pagar as contas. No entanto, existe uma reflexão interessante que a Educadora Popular e Militante da Pastoral da Juventude Rural, Jociani Alves Pinheiro Hammes trás e diz respeito ao discurso que o capitalismo introduziu na vida de milhares de trabalhadores e trabalhadoras. “Quem precisa ser responsabilizado pela vida das pessoas diante de uma pandemia é o governo, esse que tanto teme quando os/as trabalhadores/as não vão para as fábricas, frigoríficos, lojas, grandes e pequenos comércios. Sabemos que as famílias precisam ter condições de sobreviver a essa situação, mas isso não pode acontecer às custas da própria vida deles/as. O discurso de que, se não trabalharem vão morrer de fome é o discurso do capital, esse mesmo que expõe as pessoas à morte”, explicou.

Jociani reforça essa ideia dizendo que uma quantia bilionária foi investida pelo governo federal para alimentar os bancos. “Esse dinheiro deveria servir para garantir a vida dos/as trabalhadores/as, é nisso que deveria ser investido. Mas estamos falando dentro da lógica capitalista onde o lucro está acima da vida. Não temos uma distribuição de renda que possa sustentar esse momento e as condições estão cada vez mais difíceis, porém, precisamos partir de uma reflexão de que não são os/as trabalhadores que precisam perder as suas vidas na tentativa de salvar uma economia que não existe mais”.

A Educadora Popular disse ainda que o isolamento social é uma pauta de luta das organizações, pastorais sociais e movimentos. “A preservação da vida é nossa principal pauta e por isso é preciso de forma urgente que ampliemos a rede de solidariedade entre nós, se estamos com dificuldades, precisamos falar disso entre nós e pressionar o fechamento dos serviços, denunciar esses grandes empresários que estão matando os/as trabalhadores/as. Precisamos partir desse debate para fazer as denúncias”, finalizou.

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Claudia Weinman é jornalista, vice-presidenta da Cooperativa Comunicacional Sul. Militante do coletivo da Pastoral da Juventude do Meio Popular (PJMP) e Pastoral da Juventude Rural (PJR).

A opinião do autor/a não necessariamente representa a opinião de Desacato.info.
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