A “coisa feita em papel couché”, Veja, propôs que o Brasil passe a ter voto censitário. Em sua última edição, em mais uma ação debochante sobre questões que necessitam seriedade, a “coisa” elaborou questões que, segundo ela, deveriam estar no plebiscito proposto pelo governo federal. Sua pergunta número nove diz o seguinte: você concorda que quem recebe dinheiro do governo federal poderia ter o direito de se declarar impedido de votar por óbvio conflito de interesses?
O voto censitário foi estabelecido no país pela constituição de 1824 e abolido pela constituição de 1891. Esteve em vigor no período monárquico na primeira metade do século XIX. Para votar precisava-se ter renda mensal de 100 mil réis. Outra experiência semelhante ocorreu em 1934. A Constituição daquele ano excluía dos mendigos o direito ao voto. E tem gente que acha que não há preconceito de classe no Brasil.
O discurso preconceituoso de Veja em relação aos assistidos pelo Bolsa Família não é novo e, muita gente da classe média – sempre ela – começou a defender tal presepada. No caso, seriam 13 milhões de famílias que perderiam, caso essa ideia fosse materializada, o direito de votar. Agora, para Veja, além de vagabundos, não são cidadãos. Como se essas pessoas não pagassem proporcionalmente mais impostos do que os donos da “coisa feita em papel couché”.
E olhe que em 2010, foi divulgada uma pesquisa de intenção de voto entre beneficiários do Bolsa Família. Apenas 40% diziam ter a intenção de votar em Dilma. Algo perto de quatro milhões de pessoas. Dilma obteve 47.651.434 de votos no primeiro turno e 55.752.483 de votos no segundo.
Se “quem recebe dinheiro do governo federal” não deveria votar, quase ninguém no país hoje exerceria esse direito. A “grande imprensa” recebe bilhões por ano em publicidade. Por tabela, os salários de seus funcionários são pagos por esse capital. Portanto estão fora.
Quem comprou carro e produtos da linha branca com redução de IPI, também, de forma indireta, recebeu recursos do governo federal. Estão fora! Quem recebeu e recebe bolsa de estudo (PROUNI incluso), no Brasil e no exterior, também está. Compra comida e paga conta de luz com isenção de impostos federais, também deixa de votar. Quem mora em residência do Programa Minha Casa, Minha Vida também está fora. Famílias do campo, agricultura rural ou agronegócio, que recebem recursos para construção de casas e compra de máquinas, por exemplo, também estão fora.
Na eleição padrão Veja, ninguém vota. Em seu deboche com os próprios leitores que lhe restam, ao invés de defender, mesmo sua visão conservadora, atrasada e reacionária de sociedade, brinca com uma questão séria. E tem gente que ainda a lê…
Pior é que, o que tem de gente que repete todas as presepadas publicadas nela não está no gibi. Veja é tão cara de pau que em outra pergunta ela questiona o fato de se pagar duas vezes por educação e saúde. Mas omite que o Grupo Abril comprou por R$ 106 milhões de reais uma franquia de escolas particulares.
Essa é a sociedade perfeita de Veja: ninguém vota; ninguém pensa. Apenas vocifera ódio de classe.