Alvo de críticas de especialistas da segurança pública, os quatro decretos que facilitam o acesso a armas de fogo, assinados por Jair Bolsonaro na semana passada, também têm sido questionados por diferentes parlamentares no Congresso Nacional.
A reação aos decretos sinaliza a ausência de apoio irrestrito do Centrão, somente duas semanas após a eleição de Arthur Lira (PP-AL) como novo presidente da Câmara. Líderes do PL, PSD e MDB já se manifestaram contra as medidas.
Projetos contrários
Diversos projetos já foram apresentados para barrar os efeitos das medidas. A bancada do Partidos dos Trabalhadores (PT) no Senado, por exemplo, apresentou quatro projetos de decretos legislativos (PDL).
“Não é possível a edição de norma visando aumentar o armamento da população enquanto vigora em nosso ordenamento jurídico o Estatuto do Desarmamento”, diz um dos textos.
A bancada petista ainda argumenta que os decretos pró-armas de Bolsonaro extrapolam o poder regulamentar. Ainda não há data definida para que os projetos comecem a tramitar no Senado.
O mesmo argumento foi apresentado pelo Cidadania, que apresentou outro decreto legislativo e endossou que o ato do presidente usurpa poderes do Congresso de legislar.
Para além das competências presidenciais
Até mesmo o vice-presidente da Casa, Marcelo Ramos (PL-AM), eleito ao lado de Lira com amplo apoio do Planalto, concordou que Bolsonaro exacerbou sua competência.
“Mais grave que o conteúdo dos decretos relacionados a armas editados pelo presidente é o fato de ele exacerbar do seu poder regulamentar e adentrar numa competência que é exclusiva do Pode Legislativo. O presidente pode discutir sua pretensão, mas encaminhando um PL a Câmara”, manifestou-se no Twitter.
Segundo prevê a Constituição Federal, o presidente da República pode publicar decretos para regulamentar leis, mas não criar novas. Bolsonaro, por sua vez, afirma que está regulamentando pontos do Estatuto do Desarmamento, aprovado em 2003.
Ação Direta de Inconstitucionalidade
Já o Partido Socialista Brasileiro (PSB) apresentou, nesta terça-feira (16), uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) em defesa da suspensão do conjunto de decretos. O pedido foi encaminhado ao ministro Luiz Fux, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF).
De acordo com a ação, os decretos ferem frontalmente a Constituição Federal.
“A ampla facilitação para o porte e aquisição de armas de fogo, inclusive de uso restrito, o aumento alarmante de munições disponíveis e a diminuição de fiscalização pelos órgãos competentes produz evidente retrocesso em direitos fundamentais, especificamente no que se refere a proteção à vida e à segurança dos cidadãos”, diz o documento.
O líder do PSDB na Câmara, deputado Rodrigo de Castro (MG), declarou que o partido também estuda apresentar um PDL para derrubar os decretos.
No Senado, Eliziane Gama (MA), líder do Cidadania, seguiu a linha do partido e apresentou quatro projetos para sustar as medidas defendidas pelo presidente. A senadora também apresentou outro projeto para criar uma Frente Parlamentar pelo Desarmamento.
Apoio ao projeto de Bolsonaro
Por outro lado, o deputado Vitor Hugo (GO), ex-líder do governo na Câmara dos Deputados, manteve apoio a Bolsonaro. Em entrevista à CNN Brasil, ele afirmou que os decretos são legais e são resultados de promessas da campanha eleitora.
“Acompanhei de perto a elaboração dos decretos e todos estão dentro do que a lei permite”, disse ele.
Entenda as mudanças
Ao publicar os decretos na sexta-feira da semana passada (12), às vésperas do Carnaval, o presidente da República anulou os decretos anteriores que haviam sido publicados desde 2019 sobre o tema.
Além do aumento de limite de quatro para seis o número de armas de fogo que podem ser adquiridas por qualquer cidadão comum, um dos decretos também aumenta a quantidade para oito no caso de integrantes do Ministério Público e tribunais, agentes prisionais e policiais.
Para isso, no entanto, é preciso atender os requisitos legais para a obtenção do Certificado de Registro de Arma de Fogo.
Já o segundo decreto passa a permitir o chamado porte simultâneo, ou seja, cada cidadão poderá circular com até duas armas ao mesmo tempo na rua.
Entre outras facilidades, o governo também não exigirá mais a comprovação de aptidão psicológica por um profissional cadastrado na Polícia Federal. Com a mudança, qualquer psicólogo com registro no Conselho Regional de Psicologia pode assinar o laudo.
No caso dos CACs, o limite para munições saltou para até cinco vezes mais. Pela regra anterior, caçadores, atiradores e colecionadores poderiam comprar até mil munições por ano para cada arma. Agora são cinco mil no total.
Além disso, a quantidade de cartuchos nas armas de uso restrito foi ampliada para até dois mil e o limite de insumos para recarga chega a cinco mil cartuchos nas de uso permitido.
Outro ponto, que também consta no novo decreto, é que o Exército ainda pode autorizar atiradores e caçadores a ultrapassar esses limites entre duas e cinco vezes mais, dependendo da categoria.
Ao todo, colecionadores poderão agora acumular cinco armas de cada modelo; caçadores, 15 unidades; e atiradores, 30 para cada modelo, seja de uso comum ou restrito.
Caso não sejam interpeladas pelo Congresso, as novas regras entrarão em vigor 60 dias após a publicação dos decretos.
Leia mais: