Debatedores relatam violação de direitos humanos na República do Saharaui

saharauiPor Soraya Mendanha.

Debatedores presentes na audiência pública da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) sobre a atual situação da República Árabe Saharaui Democrática, uma nação cujo governo está no exílio, destacaram as frequentes violações dos direitos humanos na região.

A jornalista Laura Daudén, coautora do livro Nem Paz Nem Guerra, Três Décadas de Conflito no Saara Ocidental relatou viagem feita ao local na qual presenciou a violência policial e social nos territórios sobre o controle do Marrocos, país que ocupa grande parte do espaço da República do Saharaui.

Segundo ela, a prática de tortura do povo saaraui nas prisões marroquinas é algo frequente que acontece debaixo dos olhos da Missão das Nações Unidas para o referendo no Saara Ocidental (Minurso), criada em 1991 para manutenção da paz no Saara Ocidental.

– Desde 1991, quando foi instalada, seu mandato é renovado pelo Conselho de Segurança sem incluir a questão da garantia dos direitos humanos. Essa é a única missão da ONU que não possui essa atribuição – disse.

A jornalista Laura Daudén também lamentou a situação das pessoas que vivem nos territórios não ocupados pelo Marrocos e dos refugiados em acampamentos. Segundo ela, os territórios liberados são escassamente povoados devido à alta contaminação por minas terrestres, que atinge 100 mil quilômetros quadrados.

Em relação aos refugiados, que vivem em acampamentos na Argélia, Laura explicou que esses indivíduos sofrem carência de água e alimentos que se refletem na deterioração da saúde dos mesmos.

– 45% das mulheres sofrem aborto espontâneo durante a gestação, 66% tem anemia. O índice de escorbuto, que provoca o sangramento da gengiva por conta da falta de vitamina C, chega a 27% da população. Segundo o Programa Mundial de Alimentos da ONU, a desnutrição crítica atinge 18% da população dos acampamentos e a desnutrição crônica 31,4% – destacou.

Interesses econômicos

Laura Daudén destacou que a independência do território se arrasta há décadas, bloqueada por interesses geopolíticos e, sobretudo, econômicos. De acordo com a jornalista, o motivo do embargo militar e midiático da  República do Saharaui são as grandes reservas mundiais de fosfato presente na região.

Ela também afirmou que o Saara Ocidental guarda sobre suas areais 9% das reservas mundiais do mineral, que é utilizado principalmente na produção de fertilizantes. Além disso, conforme explicou Laura, a região também tem riqueza em suas águas, já que possui um dos maiores bancos pesqueiros do mundo.

A jornalista destacou que, desde 1963, já foram feitas varias declarações favoráveis à independência do local, mas nenhuma foi implementada. Para ela, o Marrocos não poderia se beneficiar dos recursos provenientes da exportação, já que não possui soberania sobre o território do Saara Ocidental e nem o status de administrador.

– A exploração dos recursos naturais do Saara Ociental é uma séria violação do povo saaraui que hoje sobrevive de ajuda humanitária – disse.

O embaixador no Brasil da República Saharaui, Mohamed Laarosi Bahia, destacou que a própria ONU reconhece que a presença marroquina no território é ilegal e destacou que qualquer decisão a ser tomada sobre o tema deve ser feita de forma democrática, escutando o povo saaraui.

Autodeterminação

O senador João Capiberibe (PSB-AP), vice-presidente da CDH, destacou que toda causa em defesa da autodeterminação dos povos, da democracia e da liberdade é também uma causa da sociedade brasileira. Para ele, é inadmissível que, em pleno século XXI, o mundo permita o assassinato e tortura de um grande número de cidadãos civis em decorrência dessa disputa pela independência.

O senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) lembrou que a própria Constituição brasileira prevê em seus princípios basilares a defesa da autodeterminação dos povos. Ele solicitou que a comissão encaminhe sugestão para que o Brasil reconheça a situação dos saaraui e faça a intermediação para o diálogo entre a República do Saharui e o governo do Marrocos.

Marrocos

A deputada marroquina Amina Maelimine, que estava acompanhando o debate, destacou a importância da verdade na resolução do conflito e criticou a comissão por ter convidado apenas um lado da questão para se expor.

– Isso não é democrático, ético e nem legal – protestou.

Em razão do início da sessão do Congresso, o senador Capiberibe suspendeu a audiência e destacou que vai convocar outra discussão sobre o assunto destinada a escutar as duas partes.

Histórico

Há mais de 35 anos, o povo saaraui luta pela independência do Saara Ocidental, território que está anexado ao Marrocos desde 1979. Mais de 500 mortos e desaparecidos já foram contabilizados em confrontos entre os saarauis e forças marroquinas.

O Saharaui foi colônia espanhola até 27 de fevereiro de 1979, quando proclamou sua independência. No entanto, naquele mesmo ano, o Marrocos invadiu o país, paralisando a consolidação do processo de independência e mantendo parte do país sob domínio militar situação que permanece até hoje.

Mais de 80 governos já estabeleceram relações diplomáticas com o Governo Saharaui, que exerce soberania sobre 40% do seu território. Também a Organização das Nações Unidas (ONU) vem interferindo para implementar um plano de paz sobre a autodeterminação daquele povo.

Fonte: Agência Senado

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