Dados de vacinação do governo federal têm discrepância de mais de 1 milhão de doses

Diferença está entre Painel de Vacinação e números do OpenData SUS; entidades criticam defasagem e criam monitoramento

Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

Os dados do Ministério da Saúde de contagem de vacinação contra a covid-19 no Brasil têm uma discrepância que chegou a 1,2 milhão de doses entre o Painel de Vacinação no site da pasta e os microdados do OpenData SUS.

Os números são diferentes apesar de a fonte dos dados (Sistema de Informação do Plano Nacional de Imunização) e a periodicidade de atualização (diária) serem a mesma.

As distorções constam no Painel de Dados, elaborado pela Open Knowledge Brasil com apoio da Lagom Data para monitorar a defasagem dos dados sobre a imunização contra a covid-19.

A ferramenta integra a campanha “Caixa Aberta”, criada no final de 2020 em uma parceria de Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), Transparência Brasil, Transparência Internacional – Brasil, Observatório Covid-19 BR e Rede de Pesquisa Solidária em Políticas Públicas e Sociedade. O projeto tem apoio e supervisão do Laboratório Anticorrupção da Purpose Brasil e foi endossado por mais de 70 organizações da sociedade civil.

No painel, atualizado semanalmente, é possível observar a quantidade de municípios que estão atrasando o registro de pessoas vacinadas. O informe, que deve ser feito em até 48 horas após a vacinação, tem levado mais de seis dias em 2.126 cidades (38% do total) para ser atualizado. Em 51 localidades, não há atualização há mais de um mês.

Outra informação alarmante é a quantidade de registros que deixam de informar o grupo prioritário, ou seja, a razão pela qual a pessoa foi vacinada — se pertence ao grupo de idosos, trabalhadores de saúde etc. Isso acontece atualmente em quase 500 mil registros.

O painel de qualidade dos dados da vacinação apresenta, ainda, indicadores como a falta de preenchimento dos dados de raça/cor no sistema e a quantidade de registros duplicados existentes na base de dados.

“São indicadores fundamentais para compreender se os dados que estão sendo disponibilizados pelo Ministério são íntegros e confiáveis, além de atualizados e consistentes”, explica Fernanda Campagnucci, diretora-executiva da Open Knowledge Brasil. “Abrir os dados é fundamental e representa um avanço, mas se não houver qualidade, as análises ficam distorcidas”, completa.

O acesso às informações e transparência dos dados durante a pandemia foram temas incluídos no debate da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid no Senado. Em requerimento apresentado pelo senador Alessandro Vieira (Cidadania-RS), ainda a ser aprovado pela comissão, as organizações envolvidas na campanha, Abraji, Open Knowledge Brasil, Transparência Brasil e Transparência Internacional – Brasil, foram convidadas a audiência pública para compartilhar os estudos e análises realizadas.

Procurado, o Ministério da Saúde não respondeu aos questionamentos feitos pelo Brasil de Fato.

O deputado federal Alexandre Padilha (PT-SP), médico e ex-ministro da Saúde, disse ao Brasil de Fato que “desde o primeiro dia do seu governo, Bolsonaro colocou em curso um trator destruidor do PNI (Programa Nacional de Imunização), cujas sequelas vão ficando evidentes aos poucos”.

O primeiro sinal, segundo o ex-ministro, é o fato de que 2019, antes mesmo do início da pandemia, foi o primeiro ano do século XXI em que metas vacinais para crianças não foram atingidas no Brasil.

O segundo indicativo, para Padilha, é a escassez de vacinas que faz com que o Brasil, que sempre liderou esforços internacionais de vacinação, esteja abaixo da quinquagésima posição entre os países na proporção de população vacinada.

“Outro sintoma dessas sequelas é essa desorganização da oferta das vacinas, porque a atuação técnica do Programa Nacional de Imunização e do Ministério da Saúde, junto com os estados e municípios, foi destruída”, afirmou Padilha.

O deputado petista apontou também que a Saúde foi responsável por notas técnicas contraditórias sobre a aplicação da segunda dose e por falta de informação sobre como proceder na vacinação das pessoas com comorbidades.

Sociedade cobra transparência

Um mês depois de ter sido lançado, o site transparenciavacina.org.br já recolheu mais de 4.500 assinaturas para a petição que será encaminhada pelos organizadores aos órgãos competentes exigindo dados objetivos e transparência.

A página ajuda o usuário a entender os problemas sobre o programa de imunização contra o coronavírus. Elaborado por uma equipe de especialistas em políticas públicas, transparência e saúde, o site ajuda a população a saber quais dados e informações são divulgados pelo Ministério da Saúde e os que deveriam ser de conhecimento público, mas não estão acessíveis ou disponíveis.

Quem acessar o portal vai perceber que, mais de um ano depois dos primeiros casos confirmados no Brasil, o país ainda patina sobre o planejamento para enfrentar a pandemia.

“A falta de informações claras sobre a vacinação, que é a única saída da crise, afeta a vida real de todos nós. Não é uma questão meramente burocrática, técnica. E foi isso o que mostramos no site”, diz Marina Atoji, gerente de projetos da Transparência Brasil.

A repercussão e o alcance da campanha refletem a relevância do tema na sociedade. Os posts do site foram vistos por mais de 1 milhão de usuários  nos últimos 30 dias.

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