Por Carla Ayres[1].
No último dia 30 de abril Santa Catarina – aquele pedacinho de chão entre a Gralha Azul paranaense e o Chimarrão gaúcho, aquele território conhecido pelo mais belo litoral do sul do Brasil – amanheceu mais colorida. No final do dia anterior a Corregedoria Geral do estado aprovara o provimento de Lei que regulamenta a conversão da união estável em casamento e autoriza o processamento dos pedidos para casamento entre pessoas do mesmo sexo.
Desde maio de 2010 quando o STF (Superior Tribunal Federal) autorizou a União Estavél entre casais homoafetivos, o movimento LGBT do Brasil, em especial as ações da ABGLT (Associaçao Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e transexuais) vem solicitando aos tribunais estaduais que acatem a medida do Supremo. Santa Catarina tornou-se a 13º unidade da federação a conquistar o casamento civil igualitário, uma dia antes da Paraíba também adotar a mesma medida. A espectativa é que todos os estados adotem tal iniciativa para que torne-se mais consistente a reivindicação de que esta medida torne-se uma Lei Nacional.
A partir de agora, aqui no estado, os casais homossexuais passam a contar e compartilhar, na prática, com os mesmos direitos que já são garantidos aos casais heterossexuais. Trata-se de um passo muito importante na conquista e na construção da cidadania das pessoas LGBTs no país. Ao passo que os homossexuais não têm assegurados todos os direitos que lhes deveria conceder a Constituição pelo princípio do “todos são iguais perante a Lei”.
O fato é que por trás da usurpação da cidadania da população LGBT está embutida estigmas e dogmas construidos socialmente, que faz com que nossa sociedade dissemine culturalmente o preconceito. Preconceito este que se estende ainda aos negros, mulheres, indígenas, deficientes, pobres, etc.
É importante frizar que o debate sobre a ampliação dos direitos LGBTs têm tomado proporções bastante grande nos últimos tempos. Trata-se de um ponto chave para a construção efetiva dos Direitos Humanos justamente por romper com padrões até então sólidos da sociedade burguesa, cristã, machista e heteronormativa. Os avanços rumo à equidade de direitos e a cidadania dos homossexuais, caminham a passos largos pelo mundo. Mesmo que a maioria do países da Ásia e da África não reconheçam, proíbam e até condenem à morte a homossexualidade, a Europa e as Américas têm conseguido pautar conquistas significativas para esta população.
Ação e reação. Como pode ser visto, no último mês esteve em destaque nos noticiários do Brasil e do mundo o embate entre as reivindicações do Movimento LGBT e os posicionamentos contrários à pauta LGBT protagonizados em grande medida pela comunidade Cristã. Afinal, aumentou o número de “gays” ou multiplicaram-se os fundamentalistas religiosos? Em tese nenhum, nem outro. Trata-se de uma questão de visibilidade.
A homossexualidade, é sem dúvida anterior ao próprio cristianismo, pois como afirmara Drauzio Varela, “não há descrição de civilização alguma, de qualquer época, que não faça referência à existência de mulheres e homens homossexuais”. A questão é que durante muito tempo, séculos pode-se dizer, os Gays, Lésbicas, Travestis e Transexuais foram renegados ou à condição de aberração, ou à papéis folclóricos, quando não aos guetos e à situação de invisibilidade social. Neste último caso, em virtude do estabelecimento e da construção da Família capitalista, cristã, monogâmica e heterossexual.
O “casamento” não é a única pauta do movimento LGBT, junto dele está sem dúvida uma dezena de reivindicações que tem por objetivo assegurar nossa condição de cidadãos em todas as esferas. Nem mais, nem menos. Apenas o mesmo. Queremos dizer que existimos e que nossa orientação sexual não deve ser motivo para nossa segregação social, nem tão pouco justificativa para centenas de mortes todos os anos. A desconstrução desta cultura segregacionista, portanto, é fundamental para a construção da cidadania plena e uma condição fundamental para os Direitos Humanos no mundo. Romper com estes paradigmas é a chave para uma humanidade com menos preconceito.
[1] Cientista Política, ativista do Movimento LGBT – integrante da ABGLT (Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais) e da ABL (Articulação Brasileira de Lésbicas).