Por Fenando Ramos
Na última sexta-feira, 6 de Julho, estreou nos cinemas brasileiros o filme “Custódia”, forte candidato da França para concorrer ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro do ano que vem, segundo apontam diversos críticos.
Trata-se da estreia em longa-metragem do cineasta Xavier Legrand, que nos surpreende com a maturidade de sua direção de atores nesse drama poderoso, entremeado a uma tensa atmosfera de suspense. Xavier ganhou o Leão de Prata (Melhor Diretor) no Festival de Veneza por esse filme, que também concorreu em outros festivais de renome como San Sebastián (Espanha) e RiverRun International Film Festival, nos Estados Unidos.
O filme conta a história de um casal separado que disputa judicialmente a custódia do filho mais novo; já que a filha mais velha, com dezoito anos, é livre para escolher viver com o pai ou com a mãe, ficando fora da disputa. Na cena inicial, durante audiência de conciliação diante da juíza, ouvimos os argumentos dos dois lados.
O lado materno argumenta sobre o descontrole emocional do pai, que espreita a antiga residência e segue os passos dos filhos e da ex-mulher, demonstrando que não aceita a separação e é capaz de tudo para restituir a união familiar. No passado, episódios de violência contra a mulher e a filha engatilharam o pedido de divórcio.
Por outro lado, a advogada do pai ressalta que seu comportamento abusivo só foi motivado diante das negativas da mãe para que ele visse os filhos regularmente, e que afastar os filhos do pai não auxiliaria em nada o já traumático processo de separação.
O espectador oscila entre os dois lados, uma vez que o fato de ambos os filhos se negarem a ver o pai poderia refletir um caso típico de alienação parental, na qual a mãe poderia estar manipulando a psique dos filhos com informações falsas ou exageradas, demonizando a figura paterna para obter a custódia integral em ato de vingança contra o marido – embora sua extrema fragilidade possa indicar o contrário.
Assim, somos jogados dentro desse turbilhão emocional, sem sabermos, ainda, onde repousa a verdade. Pouco a pouco, o filme desvela o desespero do pai, que instaura um estado permanente de tensão no qual, a qualquer momento, a violência pode eclodir. Nem mesmo a mudança da mãe e dos filhos para novo endereço, sem comunicar a justiça, pôde neutralizar suas tentativas de domínio.
Embora a narrativa não traga grandes surpresas, o que chama a atenção é a naturalidade do drama que perpassa essas vidas. Podemos sentir na pele o terror estampado nos olhos dos filhos e da mãe, que entraram nesses personagens, a ponto de nos fazer esquecer que estamos assistindo a um filme.
Justamente, essa é a marca das grandes interpretações. E da mesma forma com o personagem do pai, que se coloca a todo tempo a um milímetro da explosão. No decorrer do filme, os tons de suspense vão ganhando contornos mais nítidos à medida em que o clímax se aproxima, o que fica claro na iluminação mais escura e sombria que vai tomando conta dos quadros.
No final das contas, o verdadeiro terror reside nas coisas reais, nas histórias que se repetem exaustivamente no cotidiano, aquelas que já vivemos ou conhecemos de perto alguém que as tenha vivido.
A factibilidade dessa narrativa nos sensibiliza para os perigos de uma relação abusiva ao escancarar o pesadelo da violência doméstica, que encerra segredos entre quatro paredes, sem ignorar as sequelas comportamentais imputadas aos filhos, reféns de um espetáculo macabro que nunca pagariam para assistir.