Cultura em Protesto: arte é fogo que arde para que se veja

Por Paula Sequeiros.

Os vídeos estão disponíveis em artprotestersartprotesters.

Acreditam, como diz Raquel Freire, que “um povo sem cultura” “é um povo escravo” e que “a crise é sempre a desculpa usada na história para eliminar artistas e o seu trabalho”.

O Sítio está redigido em inglês, o âmbito deste protesto é claramente o território virtual da Internet, replicando-se no FacebookFacebook, em blogues, no Vimeo no Youtube.

“Embora seja difícil destruir dez obras de arte de que gosto, fi-lo com a convicção de que esta destruição ajudará a as mentalidades atuais a reconhecer a situação em que está a cena cultural portuguesa”, afirma João Galrão. Colagens, escultura em papel, desenhos vão ardendo nos vídeos, as características e a autoria dessas obras são-nos apresentadas depois de já estarem reduzidas a cinzas. No final de cada vídeo esse autor inscreveu: “As galerias de arte e os artistas não estão a vender e estamos numa situação crítica”. Trabalhos entregues ao fogo de forma aparentemente calma, sons de pássaros no exterior ou de música a tocar no interior do espaço de trabalho.

Na página principal do sítio uma longa lista de nomes de mais artistas aparece a juntar-se a este “protesto contra as políticas europeias de austeridade contra Portugal e seus artistas. O governo existente extinguiu o Ministério da Cultura e está a empobrecer cada vez mais o povo português. artistas queimam a sua arte recusando-se a desaparecer gradualmente” – no original, em inglês, um trocadilho com o fade out, o desaparecimentogradual da imagem característico da arte do cinema. João Bacelar filmou trabalhos a arder com música de fundo que, tendo em comum a palavra fogo nos seus vários sentidos figurados, proporcionam um ambiente perturbadoramente calmo a essas imagens.

“Se oferecer dez peças a uma boa causa como esta ajudar a lançar alguma luz sobre a situação difícil por que criadores incríveis estão a passar, sinto-me honrado em dar o meu contributo. A cultura é tão essencial como o ar que as pessoas respiram”, diz João Vilhena. E cada uma das suas obras expõe de forma despudorada cenas de destruição massiva, insana, ambientes de guerra com explosões e incêndios que não deixam nada para trás.

“Rasganço”, o filme de Raquel Freire sobre a praxe académica, é queimado nestas páginas também. Imagens do filme vão sendo sobrepostas à da sua destruição, a Assembleia da República, vista duma janela, torna-se cenário para essa outra queima. A cineasta afirma-se nas páginas do projeto como “artista nascida com a revolução dos cravos, a liberdade e a democracia”. Afirma aí também, que a revolução foi política, nunca social.

O projeto afixa a páginas (Web) tantas esta frase de Benjamin Franklin: “a casa não é lar a menos que contenha comida e fogo para a mente e para o corpo”. O fogo como arma de protesto portanto, contra a falta de comida na casa, em todas as suas formas.

Estes gestos de protesto, hoje, são claramente públicos, são claramente políticos. A arte não o será sempre, duma ou doutra forma?

Paula Sequeiros é investigadora em sociologia da cultura.

Fonte: esquerda.net/

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