Por José Álvaro de Lima Cardoso.
Até uns dois ou três meses atrás a equipe econômica do governo dizia que, se aprovada a destruição da previdência (PEC 06/2019) no Congresso, o crescimento econômico, e o emprego, voltariam como num passe de mágica. Diziam o mesmo, em 2017, a respeito da contrarreforma trabalhista que liquidou direitos em escala industrial. Curiosamente, o discurso do governo e do “mercado”, mudou. Estão dizendo que, mesmo com o avanço das “reformas” a economia continuará patinando e não há perspectivas de recuperação no curto ou médio prazos. A previsão esperada do crescimento do PIB para este ano é 0,8% e para o ano que vem estão falando em 2%. É bom considerar que já são três anos com o PIB na casa do 1% (2017,2018,2019), após dois anos da mais grave recessão da história do Brasil.
Não só não há recuperação a vista, como continua a destruição da economia, com muitas falências e uma piora dramática nas condições de emprego e renda dos trabalhadores. Cálculos de assessorias empresariais estão projetando que, mesmo que o PIB retorne ao patamar de antes da crise, em 2021, o PIB per capita só voltará a esse nível em 2023. Esta não é uma crise capitalista comum, ela decorre de um golpe que, para se legitimar, devastou deliberadamente setores fundamentais da economia brasileira, como o de construção pesada e o de óleo e gás.
Para justificar a estagnação, que deveria acabar com as “reformas”, estão agora se reportando à aspectos que poderão provocar efeitos na economia no longo prazo, como simplificação tributária, qualificação da força de trabalho, e elevação do nível de investimentos. Alguns economistas do chamado mercado estão dizendo que para o Brasil crescer, em face da crise mundial, o país terá que fazer “reformas mais severas”.
O que esses economistas do grande capital não explicam é como, num país que apresentou crescimento zero no primeiro semestre, no qual a população está empobrecendo e o mercado interno está sendo esmagado, a economia irá retomar o crescimento? É evidente que o arrocho previdenciário, que vem aí com a PEC 06/2019, irá piorar muito a situação dos brasileiros e da economia nacional como um todo. O mais grave é que o governo Bolsonaro está desmontando o sistema de seguridade social em um momento de risco de uma grave crise financeira mundial, talvez tão dramática quanto a de 2008.
Temos observado a gravidade da crise Argentina, que dificilmente irá se resolver simplesmente através de um processo eleitoral isolado, pela simples vitória da oposição, sem amplo movimento de massas. As eleições não resolvem porque a crise econômica é muito grave. Além disso, as turbulências financeiras que temos verificado não se limitam à América do Sul. Por detrás das turbulências está a guerra comercial entre EUA e China, que é gravíssima em função do protagonismo das duas economias. Há fortes riscos de que o referido conflito se transforme em guerra cambial, o que levaria a consequências desastrosas para a economia mundial. A disputa pela hegemonia mundial entre os dois países se desenrola em todos os campos: tecnológico, político, militar, econômico, e assim por diante.
Esta nova disputa entre as duas potências já afeta uma economia mundial em desaceleração. Os analistas falam em risco de recessão na economia norte-americana e a economia chinesa vem desacelerando seu ritmo de crescimento, em função de alguns fatores, incluindo o próprio desgaste da batalha comercial com os EUA. Em meio a toda essa crise, o PIB da maior economia da Europa, a Alemanha, considerada um dos motores da economia mundial, recuou 0,1 ponto percentual no segundo trimestre do ano. Esse dado levanta a possibilidade de uma recessão no país, após uma década de crescimento praticamente contínuo. A queda nas exportações, em função da crise mundial, foi o principal fator desencadeador do problema.
Enquanto nuvens carregadas se formam no horizonte, ameaçando uma tempestade financeira que pode ser mais grave do que a de 2008, o Brasil toma medidas que pioram substancialmente a vida dos trabalhadores, com dezenas de medidas que acabaram (ou reduziram), direitos sociais e trabalhistas, encaminhadas de forma sistemática. O Brasil sofre um verdadeiro colapso dos investimentos produtivos. O baixo nível de investimentos na construção civil, como máquinas e inovação tem poucos precedentes históricos na história do país. Em 2008, quando explodiu a crise mundial, em pleno epicentro do sistema capitalista, o Brasil soube enfrentar o tsunami com políticas anticíclicas de crescimento, manutenção das políticas sociais, expansão do mercado consumidor interno (via salário mínimo e geração de empregos) e aumento dos investimentos públicos. Agora, perante a possibilidade de uma crise mais grave que a de 2008, o governo está desmantelando as estruturas econômicas e sociais, que poderiam enfrentar a crise, e ameaça encaminhar “reformas mais severas”.
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José Álvaro Cardoso é economista e supervisor técnico do DIEESE em Santa Catarina.
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