Na contramão do que recomendam os especialistas, o Brasil reduziu em 11,5% os testes diagnósticos de Covid-19 no último mês. Conforme dados preliminares do Ministério da Saúde, a testagem do tipo PCR (também conhecidos como testes moleculares) alcançou 944.712 pessoas em setembro, ante 1.067.656 em agosto.
Os dados ainda podem mudar devido ao tempo de atualização dos resultados. Mas já é certo que, desde o início da pandemia, setembro foi o primeiro mês que registrou queda na quantidade de testes feitos em relação ao mês anterior.
Também diminuiu o total de testes enviados pelo governo Jair Bolsonaro aos estados e municípios. A queda entre o total entregue pelo Ministério de Saúde em maio e em setembro é de 68%. O problema é que, diante de uma quantidade muito baixa de testes, não é possível enxergar efetivamente onde estão os focos da infecção.
“O comportamento das epidemias é muito assincrônico. No Brasil, são 27 estados – então, existem 27 epidemias diferentes, e cada uma delas está se comportando de maneira diferente”, afirma o virologista Eduardo Flores, da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), no Rio Grande do Sul. “No início, houve um pico muito grande no Rio, em São Paulo, Fortaleza, Manaus, Recife. Aqui no Sul, por exemplo, nosso pico foi agora – agosto, setembro.”
Os últimos dados põem em dúvida a capacidade de o País testar doentes e rastrear aqueles que com eles tiveram contato. “O que dá para ver claramente nos dados é que a gente está diminuindo o número de testes. Por consequência, está reduzindo o número de diagnósticos automaticamente”, diz Marcio Bittencourt, médico e pesquisador do Hospital Universitário da USP.
Para o epidemiologista Bernardo Lessa Horta, da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), no Rio Grande do Sul, a diminuição na quantidade de testes feitos pode significar uma queda na incidência da doença. Mac, como há um alto número de testes positivos, “estamos testando pouco”.
É possível, diz ele, que pessoas com sintomas leves não procuram atendimento, e os testes acabam restritos a que têm mais complicações da Covid-19. “Temos 20% de positivos. Nova York tem 2%, grande parte da Europa tem 1%. Quando está muito ruim, eles têm 10%. Com 20%, isso indica uma quantidade muito grande de casos circulando e não testados”, afirma Bernardo.
Uma vez que a crise do coronavírus não está sendo devidamente rastreada – e os testes positivos seguem na faixa dos milhares por dia –, a pandemia permanece longe do fim no País. Para Bittencourt, uma das consequências da queda do número de testes é que não conseguimos determinar, exatamente, a intensidade da diminuição do número de casos no país.
Segundo ele, com a taxa de positividade que os testes feitos no Brasil apresentam, o país deveria testar mais, e não menos. Isso porque os dados semanais mais recentes divulgados pelo governo indicam que, na semana de 27 de setembro a 3 de outubro, cerca de 18% dos testes PCR feitos no país tinham resultados positivos – uma taxa que Bittencourt qualifica como “absurdamente alta”.
Desde o começo da pandemia, o percentual mais alto foi alcançado na semana de 7 a 13 de junho, quando 39,5% dos testes tiveram resultados positivos. A Organização Mundial de Saúde (OMS) aconselha que países deveriam ter taxas de positividade de até 5% para fazerem reaberturas.
“Isso quer dizer ter um teste positivo em cada 20 para ter uma confiabilidade de que se está testando um número suficiente de pessoas para não perder muitos casos”, avalia Bittencourt. Se considerados os cerca de 7,7 milhões de testes do tipo PCR feitos no Brasil desde março até 10 de outubro, cerca de 35,5% tiveram resultado positivo. Na rede pública, o percentual é de quase 41%, segundo dados do Ministério da Saúde.
O primeiro caso brasileiro de Covid-19 foi confirmado no país no dia 26 de fevereiro, com a primeira morte em 12 de março. Em julho, o país teve o número mais alto de mortes em toda a pandemia. Até as 20 horas desta terça-feira (20), eram 154.888 óbitos por Covid-19 registrados no Brasil.
Com informações do G1