Coordenação Nacional de Entidades Negras e as eleições em 2014.

“A CONEN como parte do movimento social brasileiro, orienta as entidades que se articulam em seu entorno, para que se esforcem no sentido de mais uma vez derrotarmos os representantes das elites conservadoras brasileiras nessas eleições e impulsionarmos um debate sobre o projeto em condições de promover, de fato, reformas estruturais e as transformações necessárias na sociedade e na vida dos brasileiros e brasileiras.”

Consolidar as mudanças, ampliar as conquistas e impedir qualquer retrocesso!

Negros

A CONEN nunca se omitiu perante decisões que interferem com os grandes temas do país e as eleições deste ano nos coloca de novo no centro de uma tomada de posição que pode significar avanços ou grandes retrocessos para a população brasileira.

Diante do longo e tortuoso caminho que temos percorrido nos últimos 50 anos de luta pela democratização da sociedade brasileira, sabemos que o que está em jogo novamente nessas eleições são dois projetos e modelos de desenvolvimento econômico e social. Um representado pela presidenta Dilma mais os governos do Presidente Lula que garantiram uma série de avanços à sociedade brasileira e à população negra em geral e outro que representa a mesma elite e as mesmas oligarquias políticas que governaram o Brasil por mais de quinhentos anos e que condenaram a maioria do país à miséria e à pobreza.

A candidata Marina Silva tenta, com o discurso da “nova política”, se aproximar dos recados e dos desejos de mudanças das manifestações de junho de 2013. Entretanto, com os problemas apresentados no momento pela candidatura de Aécio Neves, passa a ser vista pelo capital econômico e financeiro, mais os setores que controlam os meios de comunicação, como a alternativa capaz de derrotar a candidata Dilma Rousseff e seu partido, o Partido dos Trabalhadores.

Com o receituário neoliberal presente em um programa contraditório e genérico e com uma base partidária frágil representada pela Rede Sustentabilidade e o PSB, para garantir sua eleição aproxima seu programa e a estratégia eleitoral do que mais atrasado e conservador existe no Brasil, vide o recente manifesto do Clube dos Militares. De uma possível terceira via para a política brasileira, Marina Silva pode passar a ser a própria via dos interesses e projetos da elite conservadora e de direita no Brasil.

A CONEN expressa sua posição e novamente se coloca ao lado dos movimentos sociais e dos setores democráticos e populares que apoiam a reeleição de Dilma Rousseff com a finalidade de consolidarmos as mudanças dos últimos anos, ampliarmos as conquistas e impedirmos o crescimento do discurso e das práticas conservadoras e qualquer retrocesso na afirmação de direitos sociais, culturais, políticos e econômicos da população negra e pobre do país.

Nosso apoio não é condicionado, entretanto, a CONEN considera esgotado o ciclo dos recentes governos de coalização, baseados na busca da conciliação entre interesses políticos quase sempre antagônicos em disputa no interior desses governos e principalmente, no Congresso Nacional. O que abre brechas para possíveis retrocessos ameaçando nossas conquistas e não permitindo avanços.

Embasamos nosso apoio na agenda de lutas dos movimentos sociais e em especial do movimento negro brasileiro.

Programa e Agenda de Lutas

Por uma política de pleno emprego com igualdade de renda entre homens e mulheres de todas as raças, incluindo a regulamentação do trabalho doméstico e das 40 horas semanais de trabalho sem redução de salários, imediatamente;

Assegurar o recorte racial na execução do Eixo 9 da 3ª Conferência Nacional de Política para as Mulheres: Por um Estado sem Racismo, Machismo, Sexismo e Lesbofobia – A 4ª Conferência Nacional de Política para as Mulheres ratificou a relevância e pertinência do Eixo 9 do PNPM, bem como a necessidade de fortalecimento das ações deste eixo, por entender a insuficiência da estratégia da transversalidade para o enfrentamento do racismo, do sexismo e da lesbofobia nas políticas públicas e na sociedade brasileira. Para se ter uma ideia da dimensão do problema, dados da OIT, divulgados no relatório Perfil do Trabalho Decente no Brasil destaca que entre a população jovem em geral, o percentual das pessoas que não trabalha ou não estuda chega a 18,4%, o que corresponde a 6,2 milhões de pessoas. Entre as mulheres jovens, a taxa é 23,1%. Esse fato é identificado com mais intensidade nas áreas urbanas, em que 19,7% dos jovens estão nessa situação, contra 7,9% nas áreas rurais. O relatório sustenta que a população negra persiste como a mais pobre, menos escolarizada e a que mais tem dificuldades para conseguir empregos de qualidade: uma em cada 10 jovens negras, entre 15 e 24 anos não estuda ou não trabalha, o que corresponde a 25,3% desta faixa da população.

Pela provação de uma Reforma Política que combata o financiamento privado das campanhas garantido a verdadeira representação social e paridade entre homens e mulheres e brancos e negros (as).

Pela democratização dos meios de comunicação que permita a inserção da população negra na mídia e que preserve a liberdade de credo e de culto, em especial das religiões de matriz africana.

Pela ampliação do Programa Minha Casa Minha Vida – Reivindicamos um ousado programa nacional de construção de moradias populares que garanta o direito de morar com padrões dignos de habitabilidade nas principais regiões metropolitanas do país, com foco nos grandes aglomerados humanos e de modo a incidir positivamente na questão das ocupações urbanas e reduzir o déficit habitacional as nossas cidades. Para tanto, propomos a constituição de um fundo habitacional específico, a adoção do recorte racial e de gênero para o acesso à moradia nos programas habitacionais existentes como Fundo Habitacional de Interesse Social e a proposição de uma lei de reforma urbana ao Congresso Nacional que facilite a desapropriação das terras dos grandes incorporadores imobiliários, proprietários e especuladores de terras urbanas para fins sociais específicos de construção de moradias para a população negra e pobre. Para tanto, deve-se incorporar a participação dos movimentos sociais que lutam por moradia e do Movimento Negro no controle social na execução dos programas habitacionais.

Demarcação e Titulação dos Territórios Quilombolas – As comunidades quilombolas, ao longo da sua trajetória no Brasil, resistiram de várias formas a um processo constante de retirada dos seus direitos enquanto cidadãos. O principal deles é o direito aos territórios em que efetivamente moram e trabalham. Nestas terras ocupadas há séculos, nos dias de hoje, sofrem graves ameaças de desapossamento e expulsão das terras e dos territórios, levadas a efeito pela força das armas, do dinheiro e pelo poder cartorial por latifundiários, grileiros, grandes empresas agrícolas, mineradoras e megaempreendimentos como a construção de hidrelétricas e barragens.

Apesar de formalmente reconhecidos pelo Estado brasileiro, os quilombolas efetivamente não detém a posse das terras. Enfim, o Estado brasileiro, através dos órgãos fundiários (INCRA), de proteção ao meio ambiente (IBAMA), da Cultura (Fundação Cultural Palmares – MINC), SEPPIR – Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, MDA – Ministério do Desenvolvimento Agrário, Procuradoria Gral da República e Institutos de Terras Estaduais estão atuando de forma muito tímida ou mesmo atuando na contramão para garantir a norma constitucional e assegurar o direito à terra dessas comunidades – uma dívida que a nação brasileira têm para com os afro-brasileiros em função do regime de escravização.

Por esta razão, urge realizar o censo dos territórios das comunidades quilombolas e comunidades negras rurais no Brasil. Caberá, portanto, aos ministérios e órgãos federais acima mencionados titular os territórios quilombolas e executar efetivamente o programa Brasil Quilombola, fortalecer a organização das comunidades quilombolas e comunidades negras rurais, possibilitar a troca de experiências com os problemas enfrentados e perspectivas de ação conjunta, tanto na proposição de políticas públicas quanto na mobilização para a atuação com vistas à solução de problemas fundiários, demarcação topográfica, realização de laudos antropológicos quando necessários e a legalização das terras das comunidades quilombolas e comunidades negras rurais através da titulação, conforme o disposto no Artigo 68 das Disposições Gerais e Transitórias da Constituição Federal e no Decreto 4.887 de 20 de novembro de 2003.

Promoção da liberdade, valorização e respeito às Religiões de Matriz Africana – As religiões de matriz africana, os vivenciadores do candomblé e da umbanda, tem sido alvo de intolerância religiosa, violência e discriminação. O Estado é laico e os direitos das manifestações e expressões religiosas de matriz africana estão assegurados na Constituição Federal, no entanto, são violados cotidianamente e sofrem com a perseguição, a intolerância religiosa, a discriminação e o racismo, propagados pelo conjunto de ideologias e atitudes extremas por parte de outras religiões, principalmente, as religiões neopentecostais.

Com a finalidade de coibir e erradicar as práticas de intolerância religiosa e discriminação das religiões de matriz africana, propomos que a Secretaria de Estado dos Direitos Humanos vinculada à Presidência da República, crie um Grupo de Trabalho Intergovernamental com a participação das lideranças e sacerdotes das religiões de matriz africana para a formulação de um programa de combate a intolerância religiosa e a discriminação, que promova o respeito e valorize a diversidade religiosa. Entre as propostas sugere-se a realização de uma Campanha pelo direito à liberdade religiosa, de combate ao preconceito e que garanta aos Terreiros de Candomblé, Umbanda e as Guardas de Congados e Reinados do Rosário, por meio de regulamentação, anistia e isenção de impostos, direito este já adquirido e garantido pelo Estado e pelos Municípios as demais religiões cristãs e outras confissões religiosas.

Por uma assistência estudantil no ensino superior que permita ao estudante cotista cumprir o ciclo do tripé na educação: acesso, permanência e sucesso.
Impedir a redução da maioridade penal e pressionar o Congresso Nacional para a aprovação do Projeto de Lei que altera o Código de Processo Penal e acaba com os recursos dos ” Autos de Resistência” , com vistas a coibir práticas de extermínio e de execução extrajudicial.

Implementar, de fato, o Plano Nacional de Enfrentamento á Mortalidade da Juventude Negra, “O Plano Juventude Viva” como prioridade da gestão. “Conquistar direitos, desenvolver o Brasil” foi o mote da 2ª Conferência Nacional de Juventude realizada em Brasília em 2011, onde centenas de jovens negros e negras discutiram e aprovaram junto a Secretaria Nacional de Juventude as políticas para os jovens negros e negras como prioridade do Governo Federal. O Brasil possui cerca de 50 milhões de jovens, com idade entre 15 e 29 anos, que já demonstraram determinação em assegurar seus direitos e ocupar um lugar de destaque no processo de desenvolvimento do país. Hoje, apesar dos avanços que a juventude vem conquistando, não só no Brasil, mas em diversos países, sabemos que muitos dos mais de um bilhão de jovens do Planeta permanecem sem acesso a direitos básicos, como saúde, educação, trabalho e cultura, sem falar dos direitos específicos, pelos quais vêm lutando, de forma cada vez mais expressiva nos últimos anos.

Propomos que o Governo priorize as principais bandeiras da Juventude Negra. No conjunto de programas e ações em desenvolvimento pelo governo federal, destacamos o Plano de Prevenção à Violência contra a Juventude Negra, Juventude Viva, que visa prevenir a violência e combater sua banalização através de políticas de inclusão e ampliação de oportunidades para os jovens negros; o Programa Estação Juventude, que tem por objetivo informar sobre as Políticas Públicas de Juventude, construir percursos para a inclusão dos jovens e assegurar a integração territorial das políticas, programas e ações, com novas tecnologias e redes sociais; o Observatório Participativo da Juventude (Participatório) que, inspirado nas redes sociais, se caracteriza como um espaço interativo de promoção da participação, produção do conhecimento, mobilização e divulgação de conteúdo, focado nos temas ligados às políticas de juventude; e o Programa Juventude Rural, de Inclusão Produtiva, Formação Cidadã e Capacitação para Geração de Renda para os jovens rurais, em especial, ribeirinhos, indígenas e quilombolas; além do apoio ao fortalecimento institucional dos órgãos gestores municipais de juventude.

Por ampliação de mecanismos que garanta o fim do racismo, do machismo e do sexismo e de das diversas formas de violência de gênero, geracional e orientação sexual.

Criação do Museu Nacional da Memória Afro-brasileira e adoção de cotas de participação dos grupos, entidades, artistas, mestres e produtores vinculados a cultura e arte negra para o acesso aos recursos, programas e projetos do Ministério da Cultura e entidades correlatas.
Apoio a proposta de criação do Fundo Nacional de Combate ao Racismo, através de um Projeto de Lei de Iniciativa Popular.

Um novo impulso as iniciativas da política externa brasileira, implementadas principalmente durante os governos do Presidente Lula, para contribuir com o desenvolvimento e integração dos países da América Latina (essa região possui uma população negra próxima de 150 milhões de pessoas e de cerca de 40 milhões de indígenas) e da ampliação dos laços de amizade e cooperação do Brasil com o Continente Africano através dos acordos bilaterais na áreas de ciência e tecnologia, comércio e indústria, educação, saúde, cultura, agricultura e outros.

Para cumprir o seu papel de uma organização de luta de combate ao racismo, a CONEN como parte do movimento social brasileiro, orienta as entidades que se articulam em seu entorno, para que se esforcem no sentido de mais uma vez derrotarmos os representantes das elites conservadoras brasileiras nessas eleições e impulsionarmos um debate sobre o projeto em condições de promover, de fato, reformas estruturais e as transformações necessárias na sociedade e na vida dos brasileiros e brasileiras.

No próximo governo precisamos aumentar os orçamentos e consolidar a gestão de órgãos importantes do Estado e estratégicos para a execução de ações, programas e projetos que possam fazer avançar e consolidar as politicas sociais, de promoção da igualdade racial e combate ao racismo, melhorar a condição de vida da população negra, combater o racismo e, sobretudo, fortalecer as organizações do Movimento Negro brasileiro.

Um governo cujo projeto deve ter como centro o desenvolvimento econômico e social com sustentabilidade, igualdade racial, de gênero e combate ao racismo, para continuar impulsionando as mudanças que o Brasil precisa.

 Coordenação Nacional de Entidades Negras (CONEN)

Setembro de 2014

Leia a declaração completa aqui

Fonte: Geledés

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