A Frente Nacional contra a Privatização da Saúde, através dos militantes dos Fóruns estaduais e municipais, estudantes, trabalhadores/as e usuários/as do SUS, sempre esteve nas ruas, e nas últimas semanas vem somando-se às mobilizações do povo por mudanças estruturais, alavancadas pelas manifestações que se originaram contra o aumento das passagens.
Estamos nas ruas para defender o caráter público e universal da saúde e para reafirmar que saúde não é mercadoria, e sim direito de todas e todos brasileiros que precisa ser efetivado pelo Estado.
Estamos nas ruas porque não concordamos com os rumos da política de saúde brasileira que está na contramão dos princípios da Reforma Sanitária, do SUS e da Constituição Brasileira, pois tem favorecido os interesses dos grupos poderosos que usam a saúde como fonte de lucro.
O Movimento Sanitário dos anos 1980 defendeu intensamente o uso dos recursos públicos para ampliação dos serviços públicos com a expansão do setor estatal em níveis federal, estadual e municipal, tendo como meta uma progressiva estatização da saúde. Porém, agora quando o SUS faz 25 anos, fazemos o balanço que os governos que se sucederam nesse período favoreceram a mercantilização da saúde e a ampliação do setor privado na oferta de serviços de saúde no livre mercado e por dentro do SUS.
O apoio do Estado à ampliação do livre mercado da saúde tem se dado através da renúncia fiscal relacionada a planos e seguros privados de saúde, tornando o Brasil o 2º mercado mundial de seguros privados perdendo apenas para os Estados Unidos; pela isenção de impostos aos grandes hospitais privados como o Sírio Libanês, Albert Einstein, entre outros; isenções fiscais para importação de equipamentos biomédicos e, recentemente, para produção interna, subsidiando a expansão desordenada de oferta para planos privados de saúde enquanto a população usuária do SUS compõe uma grande fila de espera para procedimentos complexos, por insuficiência de oferta pública. Tal questão tende a ser aprofundada se confirmada a edição de um “pacote” do governo federal de redução de impostos e subsídios públicos a planos privados de saúde, conforme amplamente anunciado pela mídia. Esta proposta pode ser a formalização final para a instituição de um seguro saúde e criação de um Sistema Nacional de Saúde integrado com o setor privado, tendo como consequência acabar com o SUS ou torná-lo um sistema focalizado, consagrando o processo de universalização excludente que vem ocorrendo desde os anos 1990 com a saída dos trabalhadores melhores remunerados que foram impulsionados à compra de serviços no mercado privado devido ao sucateamento do SUS. Esse movimento faz parte do mesmo processo de aprofundamento da subordinação do país ao grande capital financeiro,atrelado aos interessesdoimperialismo.
Recursos públicos do SUS têm sido alocados progressivamente no setor privado através de convênios e contratos: do total de internações realizadas no setor privado, na primeira década dos anos 2000, 74,5% foi custeada pelo SUS; do total dos recursos públicos do SUS destinados aos procedimentos hospitalares e à produção ambulatorial, 57,33% foi destinado à rede privada contratada e apenas 43,52% à rede pública, caracterizando a privatização progressiva do fundo público, uma afronta ao artigo 199 da Constituição Federal que assegura que o setor filantrópico ou privado é complementar ao público.
Propostas de flexibilização da gestão pública e de implementação de modelos organizacionais que seguem à lógica de mercado para gerir os serviços públicos constituem grave ataque ao caráter público da saúde. Seguem uma racionalidade que fere mortalmente os princípios da administração pública direta, e têm sido concretizados nas três esferas governamentais através da proposição ou edição de Leis e Emendas Constitucionais que alteram o arcabouço jurídico e até os princípios que orientam a boa gestão da coisa pública, tendo como exemplos maiores as Emendas aprovadas no período do Governo FHC, o anteprojeto de nova lei orgânica da Administração Pública, e a criação dos denominados “novos modelos de gestão” que têm em comum a personalidade jurídica de direito privado, quais sejam: as Organizações Sociais (OSs) e OSCIPs, entidades privadas ditas “sem fins lucrativos”, criadas pelo governo de FHC; as Fundações Estatais de Direito Privado (FEDPs), proposta apresentada pelo governo Lula, revivida recentemente pelo Governo Dilma, e já implantada através de leis próprias em diversos Estados e Municípios; e a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH), criada em 2011, pelo governo Dilma, voltada para os Hospitais Universitários e demais hospitais sob responsabilidade federal, e que já começa a ser replicada em outras esferas, como é o caso do Rio de Janeiro com a “Rio Saúde”. Estas modalidades de gestão aprofundam a precarização do trabalho, desrespeitam o controle social e são formas mascaradas de privatização que ameaçam os direitos sociais, especialmente o direito à saúde, pois entregam a gestão das unidades de saúde, patrimônio, equipamentos, serviços, trabalhadores e recursos públicos para entidades de direito privado.
Essas três modalidades de mercantilização da saúde constituem o mais grave e intenso ataque contra o SUS em toda a sua história, ameaçando o seu presente e inviabilizando o seu futuro.
A Frente considera que as propostas apresentadas para a Saúde pela presidenta diante dos reclamos das ruas são insuficientes e não apresentam nenhuma mudança de fundo ou reforma estrutural para o atendimento das necessidades sociais que estão fazendo o país explodir. Não enfrenta nenhum aspecto relacionado à determinação social da saúde, rebaixa a pauta da saúde à lógica incrementalista e assistencial, e reitera o modelo médico-centrado e a privatização. Os problemas do SUS não serão estruturalmente resolvidos, e em algumas dimensões até poderão ser aprofundados, com a implantação das propostas do chamado “pacto para a saúde pública”:
1) a contratação de médicos estrangeiros não resolverá o problema de pessoal no interior e na periferia;
2)a abertura de vagas para a graduação em Medicina e para a Residência também não são soluções para a crise da saúde se não acompanhadas de discussão sobre o modelo de formação para o SUS priorizar vagas para o setor privado;
3)a construção de novas unidades de saúde pública sem especificar se serão 100%estatal, sob as normas do direito público,com contratação de pessoal pelo RJU e financiamento efetivo também não trará melhorias para a saúde;
4)o fortalecimento da rede filantrópica é uma medida que aprofunda a privatização do sistema público de saúde.
Face às questões apontadas, a Frente Nacional contra a Privatização da Saúde continuará nas ruas com as seguintes bandeiras:
· Defesa incondicional do SUS público, estatal, universal, de qualidade e sob a gestão direta do Estado e contra todas as formas de privatização e Parcerias Público Privadas.
· Alcançar um mínimo de 10% do Produto Interno Bruto (PIB) para a Saúde, garantindo o investimento público e o financiamento exclusivo da rede pública estatal de serviços de saúde, cumprindo o aprovado pela 14ª Conferência Nacional de Saúde, espaço de efetiva manifestação e vocalização popular sobre suas reivindicações para a saúde.
· Pelo fim da Desvinculação das Receitas da União (DRU)
· Pela Auditoria da Dívida Pública.
· Contra os subsídios públicos aos Planos Privados de Saúde.
· Contra a entrada de capital estrangeiro nos serviços de assistência à saúde e pelo arquivamento do Projeto de Lei do Senado (PLS) 259/2009 que altera a artigo 23 da Lei 8080/90 para viabilizar o rentismo.
· Pela revogação da Lei 12.550/2011 que cria a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH) e pela procedência da Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.895/2013 que tramita no STF. Não podemos entregar os Hospitais Universitários a uma Empresa de direito privado, quebrando a autonomia universitária no que diz respeito ao ensino e à pesquisa. Também não podemos permitir a criação de subsidiárias que entreguem os Hospitais Federais e Institutos, à EBSERH, como a denominada Saúde Brasil.
· Pela revogação da Lei 9.637/1998 que cria as Organizações Sociais (OSs) e pela procedência da Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.923/1998 que tramita no STF. As OSs desrespeitam o controle social, promovem a cessão de servidores públicos para entidades privadas, contratam trabalhadores sem concurso público, garantem a aquisição de bens e serviços sem processo licitatório, facilitando o desvio de recursos públicos.
· Pela anulação imediata da Proposta de Lei Complementar nº 92/2007, em tramitação no Congresso Nacional, que propõe as Fundações Estatais de Direito Privado (FEDPs) para gerir todas as áreas sociais: saúde, assistência social, cultura, desporto, ciência e tecnologia, meio ambiente, previdência complementar do servidor público, comunicação social, e promoção do turismo nacional.
· Defesa de concursos públicos pelo RJU e da carreira pública de Estado para pessoal do SUS e contra todas as formas de precarização do trabalho. Por reajustes salariais dignos e política de valorização do servidor, isonomia salarial, estabilidade no trabalho, e implantação de Planos de Cargos, Carreiras e Salários (PCCS).
· Pela eliminação do limite da Lei de Responsabilidade Fiscal para despesa com pessoal na saúde.
· Defesa da implementação da Reforma Psiquiátrica com ampliação e fortalecimento da rede de atenção psicossocial, contra as internações e recolhimentos forçados e a privatização dos recursos destinados à saúde mental via ampliação das comunidades terapêuticas.
· Pelo cancelamento do Projeto de Lei do Deputado Federal Osmar Terra que propõe alterações na Lei 11.343/2006 e inverte a prioridade de intervenção na área da saúde mental que tem na internação compulsória o último recurso clínico para pessoas que apresentam problemas no uso das drogas, conforme a Lei 10.216/2001, colocando-a como primeira e principal estratégia de cuidado.
· Contra o modelo “médico assistencial privatista” centrado no atendimento individual e curativo subordinado aos interesses lucrativos da indústria de medicamentos e equipamentos biomédicos, e pelo fortalecimento da atenção básica com retaguarda na média e alta complexidade.
· Pela efetivação do Controle Social Democrático e das deliberações da 14ª Conferência Nacional de Saúde.
Enfim, a determinação social do processo saúde e doença vinculada às relações sociais capitalistas, reprodutoras de desigualdades sociais e da barbárie, nos mobiliza a articular as lutas pela saúde com as demais lutas sociais pela superação desta sociedade. Desta forma, estamos nas ruas por uma sociedade justa, plena de vida, sem discriminação de gênero, etnia, raça, orientação sexual, sem divisão de classes sociais!
O SUS é fruto de lutas sociais e patrimônio do povo brasileiro, não abrimos mão dele.
Saúde não se vende, se defende! Estatização já!
Povo unido é povo forte. Não teme a luta, não teme a morte!
Avante companheiros, que essa luta é minha e sua. Unidos venceremos. E a luta continua!
Continuemos nas ruas empunhando nossas bandeiras!
FRENTE NACIONAL CONTRA A PRIVATIZAÇÃO DA SAÚDE
No calor das ruas, Julho de 2013.
www.contraprivatizacao.com.br
Fonte: Sindsaúde