Por Elisabet Gonçalves Moreira.
Sertão: quais suas fronteiras, seus limites? Espaço simbólico ou um espaço geográfico meio que indefinido, mas que sabemos bem distante do litoral? Será ainda hoje o mesmo sertão que reside no imaginário das secas cíclicas do nordeste brasileiro, dos jagunços, dos fanáticos religiosos – vias diversas – como via Euclides, via o cinema do Glauber, via Graciliano entre outras visagens?
Quem reside nele? Ainda é o Fabiano de poucas palavras ou o sertanejo nômade da periferia das cidades? O sertão virou mar como disse a profecia? Que transformações ele passou ou está passando?
Um sertão ou muitos sertões… Existe? Resiste? Em que linguagem?
Tem cabimento perguntar também: quem escreve sobre o sertão? Nesse ilimitado sertão nordestino, temos os poetas populares, os cordelistas que, ainda, se salvam na representação da miséria sertaneja, de uma origem, de uma vivência. Mas há outros, doutores em sua maioria, que fazem da caricatura do matuto (nem mais o sertanejo rústico e forte) um meio de vida para uma poesia do ridículo, do risível, para uma plateia urbana, conivente com esta pretensa poesia…
Longe dos estereótipos ou da inocência (existiria?) desta representação, há uma vertente de escritores contemporâneos que mostram outro sertão em suas incoerências e novos testemunhos dos tempos pós-modernos e da consciência de uma escrita que não pode mais ser a mesma.
No Clisertão – I Congresso Internacional do Livro, Leitura e Literatura do Sertão – realizado em Petrolina, PE, sertão do semiárido, ribeirinho do São Francisco, neste mês de maio de 2012, houve um pensar sobre esta representação, sob várias modalidades, sob acusações e aplausos…
Diretamente, participei como mediadora da mesa: “Sertão: espelho, miragens – O Nordeste Mítico e o Nordeste Contemporâneo na Literatura” com Raimundo Carrero e Antônio Torres.
Em que espelhos ou miragens ficaram os reflexos do sertão tomado como referência? Carrero, recuperando-se de um AVC, falou mais de sua obra, de sua trajetória e se emocionou muito. Citou várias vezes Ariano Suassuna como seu grande incentivador. Carrero, mesmo sendo de Salgueiro, situado no assim chamado Sertão Central de Pernambuco (qual é o sertão descentralizado?) disse que não conhecia seca (miragem?!) pois lá chove muito, ao que Ariano Suassuna, da plateia, emocionado, discordou e narrou um fato marcante, quando viu uma pessoa morrer de fome em consequência da miséria causada por uma das muitas secas na história destes sertões (espelhos?).
Já Antônio Torres, nascido em Junco, no sertão baiano, autor de “Essa Terra”, fez a ponte entre o sertão mítico e o sertão contemporâneo pois ambos convivem em seus espaços de linguagem, sem se negarem. Em uma entrevista ele frisou que essa é (foi) uma “oportunidade para refletirmos sobre as permanências do legado literário nordestino e suas transformações, em função das mudanças de paradigmas no nosso tempo.” Para mim, uma diferença que não é meramente circunstancial… Eu diria, artística. Basta pegar exemplos de seu livro para que isto fique evidente.
Em outro momento e outra mesa, da plateia, acompanhei “Sertões estrangeiros” com a participação da jornalista Fabiana Moraes e do escritor Ronaldo Correia de Brito, mediada por Schneider Carpeggiani. Aqui algumas respostas foram mais “amarradas”, sem as emoções e a subjetividade que pautaram a outra mesa.
Sim, o sertão mudou: ele existe ainda, porém não tem mais correspondência com a ideia de um lugar eminentemente agrário, estereotipado e fechado ao que é moderno. Incorporou elementos urbanos, inclusive de uma tecnologia que modifica vivências e cria novas perspectivas.
Ronaldo Correia de Brito ressaltou os personagens estereotipados da literatura regionalista e da emergência em reinventar esses modos de ver o sertão. “Então é natural que tudo isso mude, e que a literatura, a música, a poesia popular, não continuem investindo numa ética não existente.” Aliás, seu romance “Galileia” ilustra bem sua fala e o sertão atual.
Como observa Durval Muniz de Albuquerque Jr. “ Se a vida é amiga da arte, é possível com arte inventarmos outros Nordestes que signifiquem a supressão das clausuras desta grande prisão que são as fronteiras.” *
Libertemo-nos pois…
* (p. 317 do livro A invenção do Nordeste e outras Artes. Recife: FJN, Ed. Massangana; SP: Cortez, 1999, 340p.il.)
Boa noite!
Eu não sei qual é o tratamento que altora deste artigo dá, a esta idiossincrasia reinante que é a pós-modernidade, mas sem sombra de dúvida o sertão não é o mesmo, bom parece que a gente está falando de obviedade, se é isto mesmo que tal a gente pensar que mesmo a literatura está num contexto histórico-social, os personagens mudam, seus valores mudam, mas o problema do semi-árido persiste, parece que temos chuva,é como fala um dos autores ou não é verdade? Bem pensando melhor talvez isto seja relativo como diz muito pós-moderno.