Por André Cintra.
A expressão “ajudante de ordens” está em evidência – e não é pelos valorosos serviços que esses profissionais podem prestar para seus chefes. Com o tenente-coronel Mauro Cid – que ocupou a ajudância de ordens da Presidência da República durante os quatro anos do mandato de Jair Bolsonaro (PL) –, o posto ficou inteiramente chamuscado.
Diante da série de crimes cometidos pelo ex-presidente no poder, Cid se destacou menos pelas habilidades secretariais exigidas pelo cargo e mais como um cúmplice dos escândalos bolsonaristas. A tese de que “apenas cumpriu ordens” não se sustenta. Em diversos momentos, o ex-ajudante de ordens foi advertido da ilegalidade de seus atos.
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Essa proximidade com Bolsonaro, porém, deve ser determinante para amenizar as próprias condenações e levar o ex-chefe para a cadeia. Seu acordo de delação premiada só foi aceito pelo STF (Supremo Tribunal Federal) porque Cid, de tão onipresente no dia a dia de Bolsonaro no Planalto, não apenas se envolveu direta ou indiretamente em maracutaias – mas também testemunhou inúmeros ilícitos.
“O depoimento de Cid será uma peça importante para ajudar a PF a confirmar as funções e ações individuais dos suspeitos em cada investigação”, informou o UOL. “Ele pode, inclusive, explicar se houve uma ordem direta para o cometimento de crime. Além disso, o ex-ajudante de ordens pode colaborar com novos nomes de envolvidos.”
Conforme apurou o Valor Econômico, a colaboração de Cid para as investigações contra Bolsonaro tem pelo menos cinco eixos – e alguns deles se desdobram em mais apurações. O ponto de partida é o inquérito que trata das milícias digitais envolvidas em ataques ao Estado Democrático de Direito, mas se estenderá a outros temas. Confira os cinco eixos da delação de Cid:
1) Ataques virtuais a opositores do governo Bolsonaro;
2) Ataques às instituições, como o STF e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ao sistema eleitoral e às urnas eletrônicas;
3) Tentativas de golpe de Estado e de abolição violenta do Estado Democrático de Direito;
4) Ataques às vacinas contra a covid-19 e às medidas sanitárias de combate à pandemia;
5) Uso da estrutura do Estado para obtenção de vantagens em ao menos três casos: falsificação de cartões de vacina nos sistemas do Ministério da Saúde; venda ilegal de presentes oficiais recebidos pelo governo, como as joias sauditas; e uso dos cartões corporativos para pagamento de despesas pessoais da família Bolsonaro.
Os cinco eixos não precisam ser concluídos simultaneamente, de modo que Bolsonaro pode ser julgado, condenado e preso já ao fim dos primeiros processos. Algumas investigações, especialmente a sobre fraude nos cartões de vacinação, estão na reta final.
Cid – que conquistou liberdade provisória após ter o acordo de delação homologado – também corre risco de ir para a cadeia novamente por participação nos variados crimes atribuídos a Bolsonaro. Mas sua delação envolve redução de pena e, dada a gravidade das denúncias, precisa ser o mais minuciosa possível. O entorno bolsonarista que se cuide.
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