O grave cenário de assassinatos, violência e criminalização em Rondônia leva os membros do Comitê Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos a encaminhar, nesta segunda-feira, (24) uma Ação Urgente à ONU para que intervenha junto ao Estado brasileiro, exigindo que medidas sejam tomadas para modificar a situação. De janeiro a outubro deste ano, o número de defensoras e defensores mortos no estado já chega a, pelo menos, 17, o que representa 30% do total de assassinatos de defensores de direitos humanos no país. Mesmo com os números alarmantes, os governos federal e estadual não tomam medidas para refrear a onda de violações.
Segundo dados da Comissão Pastoral da Terra, Rondônia teve, em 2015, o maior número de mortes em conflitos agrários, com 20 assassinatos, dentre indígenas, quilombolas, posseiros, sem-terra, ambientalistas, trabalhadores rurais e lideranças, muitos deles com evidentes características de execução. A situação em 2016 mostra um agravamento, o que leva a decisão do Comitê de solicitar intervenção da ONU.
“Utilizamos esse instrumento de Ação Urgente porque assim os trâmites são mais simplificados, e os relatores da ONU entram em contato com o governo federal mais rapidamente. A situação lá é extremamente grave, muita gente já foi morta e o tensionamento é altíssimo. Esperamos que, com a pressão internacional, o Estado atue para estancar essa violência desenfreada, já que os esforços dentro do país até agora não surtiram efeito”, explicou Alice De Marchi, pesquisadora da Justiça Global.
As últimas vítimas foram Sebastião Pereira dos Santos, 39 anos, Isaque Dias Ferreira, 34, e Edilene Mateus Porto, 32, mortos no mês de setembro deste ano. Isaque e Edilene eram membros da Liga dos Camponeses Pobres (LCP) e denunciavam aos órgãos públicos as arbitrariedades cometidas por parte de um grileiro que tem posse irregular da fazenda Formosa, em Vale do Paraíso, e que, para impedir a luta das famílias pela terra, utiliza-se dos serviços ilegais de policiais militares, que intimidam e atacam as famílias. No dia 13 de setembro, por volta das 8h, o casal foi assassinado próximo ao seu lote de terra. Já são quatro pessoas mortas apenas neste ano no acampamento Jhone dos Santos, do qual faziam parte as vítimas.
O Comitê, em seu apelo à ONU, afirma que a relação promíscua entre as forças de segurança pública, milícias e proprietários de terra no local, além do largo histórico brasileiro de arquivamento ou inconclusividade de casos aumenta ainda mais a preocupação com aqueles que seguem na luta pela terra. O governo estadual, por sua vez, é altamente negligente frente às situações, quando não é, ele próprio, ou cúmplice ou responsável pelas violações, na medida em que envolvem agentes da Polícia Militar, da Polícia Civil e autoridades locais. Há ameaças reais contra vidas defensoras, como a advogada popular Lenir Correia e lideranças da luta pela reforma agrária, como Zonália Neres dos Santos Ferreira, Lurdilande Gomes da Silva, conhecida como Ludma, e Iza Cristina Bello, conhecida como Índia. Alice ressalta o fato de serem todas mulheres e integrantes de movimentos sociais. “As mulheres, muitas delas ocupando posições de liderança, vêm sendo especialmente atacadas e ameaçadas na sua condição de gênero”, afirma a pesquisadora.
A expectativa do Comitê é de que os seis relatores da ONU que receberão o documento cobrem do governo federal um plano de proteção para as defensoras e defensores vulneráveis e adote medidas para impedir novos ataques aos acampamentos e assentamentos dos movimentos sociais, garantam que as milícias privadas e grupos de extermínio estejam nas prioridades de combate das autoridades brasileiras, com atuação da Polícia Federal, entre outras medidas que enfrentem a causa estrutural da violência, que é a questão da terra.
Fonte: MAB.