Brasília – Laudo divulgado pela Comissão Nacional da Verdade (CNV), na última terça-feira (22/04), em Brasília, atesta que o acidente de carro que provocou a morte do ex-presidente Juscelino Kubitschek, em 26 de agosto de 1976, no quilômetro 164,8 da Rodovia Presidente Dutra, não foi obra de atentado político, como sugerem diversas teorias conspiratórias alimentadas nos últimos 38 anos e até mesmo análises técnicas feitas desde então.
O documento entra em colisão frontal com outro divulgado pela Comissão Municipal da Verdade de São Paulo, em dezembro do ano passado, que contestou a versão oficial do acidente de trânsito, ao apontar 90 indícios de que JK fora vítima de conspiração da ditadura. Entre eles, o de que o motorista Geraldo Ribeiro, que dirigia o Opala em JK viajava, fora alvejado com um tiro na cabeça antes de colidir com um caminhão Scania Vabis.
Os cinco peritos que trabalharam no laudo encomendado pela CNV foram unânimes ao descartar a hipótese do tiro. Segundo eles, o acidente ocorreu porque um ônibus da Viação Cometa, que trafegava no mesmo sentido que o Opala de JK, esbarrou levemente no veículo. Com isso, Geraldo Ribeiro perdeu momentaneamente o controle da direção, invadiu a pista da contramão e, ao conseguir realinhar o carro, acabou colidindo de frente com a Scania, o que levou os dois passageiros à morte.
“Se o motorista tivesse levado um tiro na cabeça, ele estaria inconsciente, não teria como dar essa guinada na direção correta e a trajetória do Opala seria outra. Geraldo Ribeiro era um motorista experiente e estava consciente até a colisão com o caminhão”, esclareceu o coordenador da equipe de peritos, Pedro Lemos.
O perito também rechaçou a versão de que um fragmento de bala fora encontrado no crânio do motorista, em exumação realizada em 1996. Segundo ele, o pedaço de ferro nada mais era do que um fragmento do grampo utilizado para fixar o revestimento do caixão. Lemos também apresentou fotos do acidente e da exumação que comprovam que o crânio estava intacto.
O trabalho de perícia se valeu também dos depoimentos prestados, à época, por peritos criminais que trabalharam no caso e populares que testemunharam o acidente. “Geraldo era calvo. Qualquer lesão na cabeça seria visível para qualquer pessoa, e não houve nenhum relato sobre isso. Imaginar que todo mundo se calou, à época, é supor um conluio enorme”, acrescentou o coordenador.
Coordenador da CNV, Pedro Dalari fez questão de ressaltar que o trabalho realizado pela perícia foi estritamente técnico, baseado em provas materiais. “Não nos move nenhum tipo de motivação política ou ideológica”, afirmou.
Sobre a divergência com o relatório produzido pela comissão paulistana, foi direto.
“Nossa equipe de peritos trabalhou com o documento deles, colheu depoimentos, mas não se convenceu. Temos todo o respeito pela comissão de São Paulo, o que não significa que tenhamos que concordar com tudo”, alegou.
Resgate histórico
Apesar de quase quatro décadas depois, os peritos que trabalharam no laudo sobre a causa da morte de JK conseguiram reunir expressivo material sobre o acidente, disperso em várias partes do país, incluindo 257 películas de negativos ou imagens das perícias realizadas à época, fragmentos do assoalho do carro, um pedaço do para-choque, fragmentos do revestimento do caixão e até mesmo o fragmento de ferro encontrado junto ao crânio do motorista de Jango.
No laudo de 35 páginas que irá embasar a posição oficial que a CNV apresentará sobre o caso, consta como primeira e mais incisiva conclusão: “O ex-presidente Juscelino Kubitschek de Oliveira e seu motorista Geraldo Ribeiro morreram em decorrência de lesões contundentes sofridas quando da colisão frontal entre o veículo Chevrolet Opala, placa NW-9326-RJ, em que viajavam, e o Scania Vabis, placa ZR-0398”.
(Leia aqui o laudo completo da CNV).
Foto: Valter Campanato
Fonte: Carta Maior