Por Thiago Burckhart, para Desacato.info.
Nesta última semana encerraram-se os trabalhos da Comissão Nacional da Verdade, comissão esta criada com a finalidade de apurar e tornar público graves violações de Direitos Humanos cometidos entre os anos de 1946 e 1988, sobretudo no período da ditadura militar. No dia 10 de dezembro, dia internacional dos direitos humanos, foi entregue em solenidade oficial o relatório final do trabalho da comissão, que comprovou as graves e sistemáticas violações de direitos humanos cometidas naquele período.
A Comissão criada com o assente no direito à memória e à verdade – reconhecido em tratados internacionais e na legislação doméstica brasileira – ouviu ao longo de seus dois anos e meio de atividade mais de mil vítimas da violação de direitos humanos por meio de diversas táticas empreendidas com maior frequência no regime militar, por agentes de Estado. Além disso, a CNV teve acesso a documentos até então desconhecidos, realizou diligências em locais de repressão, além de ter feito inúmeras audiências públicas em todo o Brasil. Todos os casos, relatos de fatos e circunstâncias foram documentados e podem ser considerados fatos jurídicos passíveis de averiguação maior pelo Ministério Público Federal, com a efetiva punição dos fatos que forem comprovados, haja vista que os direitos humanos são imprescritíveis.
De fato, em virtude do caráter público e estatal do relatório, este mostra-se como um dos principais documentos que retratam as graves violações de direitos que ocorreram durante os regimes ditatoriais por agentes estatais. Contribui pra o reconhecimento por parte do Estado brasileiro dos crimes cometidos durante aquele período. Além disso, o relatório também expressa uma síntese do seu trabalho, conclusões e proposições.
Recomendações da CNV
Foram diversas as recomendações realizadas pela CNV em seu relatório, que vão desde a proposição de medidas institucionais até a necessidade de reformas constitucionais para pôr fim a determinadas práticas institucionais que ainda carregam similaridades com o período militar – como o fim da política militar -, de modo a proporcionar o aprimoramento e fortalecimento das instituições. Dentes as inúmeras propostas, segue abaixo algumas:
- Reconhecimento, pelas Forças Armadas, de sua responsabilidade institucional pela ocorrência de graves violações de direitos humanos durante a ditadura militar (1964 a 1985);
- Determinação, pelos órgãos competentes, da responsabilidade jurídica– criminal, civil e administrativa – dos agentes públicos que deram causa às graves violações de direitos humanos ocorridas no período investigado pela CNV, afastando-se, em relação a esses agentes, a aplicação dos dispositivos concessivos de anistia inscritos nos artigos da Lei no 6.683, de 28 de agosto de 1979, e em outras disposições constitucionais e legais;
- Modificação do conteúdo curricular das academias militares e policiais, para promoção da democracia e dos direitos humanos;
- Promoção dos valores democráticos e dos direitos humanos na educação;
- Revogação da Lei de Segurança Nacional;
- Aperfeiçoamento da legislação brasileira para tipificação das figuras penais correspondentes aos crimes contra a humanidade e ao crime de desaparecimento forçado;
- Desmilitarização das polícias militares estaduais;
- Extinção da Justiça Militar estadual.
A atuação da CNV contribuiu diretamente para o fortalecimento das instituições brasileiras e para o aprimoramento da democracia, de modo que proporcionou ao povo brasileiro conhecer a verdade sobre as truculentas violações de direitos humanos cometidos no século passado. Contudo, cabe agora a nós – sociedade civil de modo geral – cobrar a implantação das recomendações sugeridas pela CMN, de modo que suas propostas não tornem-se mera retórica demagógica, para que essas fatos nunca mais voltem a ocorrer. Foram no total 29 recomendações realizadas pela CNV, e que podem ser acessadas no site da Comissão (http://www.cnv.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=571) pelo qual pode-se ter acesso ao relatório final completo.
Thiago Burckhart é estudante de Direito.