Colombianos voltam às ruas nesta quarta após noite de violência policial

Humano Salvaje/FlickrCC

A Colômbia enfrentou uma nova noite de violência nas ruas nesta terça-feira (04/05), dia em que as manifestações contra medidas neoliberais do governo Ivan Duque completaram uma semana – sob forte repressão policial e denúncias de desrespeito aos direitos humanos. Nesta quarta (05/04), o Comitê Nacional de Greve na Colômbia se mobiliza para uma nova grande jornada de manifestações.

Estão previstos protestos na Colômbia já desde o começo da manhã, nas principais cidades. Ainda na madrugada, um grupo de caminhoneiros do departamento de Norte de Santander decidiu aderir à greve, e foram registrados episódios de violência na rodovia que liga as cidades de Pamplona e Bucaramanga, na mesma região.

De acordo com o jornal El Espectador, manifestantes, puxados por estudantes universitários, irão às ruas em Bogotá, Medellín, Barranquilla, Cali, Cartagena e outras cidades.

Até esta terça-feira, a Defensoria colombiana havia recebido 87 relatos de pessoas desaparecidas durante as manifestações. De acordo com o órgão estatal, 36 desaparecimentos foram reportados da cidade de Cali (departamento de Valle del Cauca), enquanto na capital, Bogotá, 18 denúncias foram registradas, incluindo dois menores.

Nesta quarta, na capital, houve repressão policial – que terminou com 91 feridos, distúrbios e postos policiais destruídos. A prefeita da cidade, Cláudia López, falou em “vandalismo”  e disse que o “nível de ataque contra os cidadãos, contra nossos bens públicos, contra nossa polícia é realmente insólito”.

Há registros de violência também em Barranquilla, Medellín e Cali.

Violações de direitos humanos na Colômbia

Ao longo dos dias de greve, Cali vem registrando a maioria dos casos de violência policial. Segundo a Human Rights International, um massacre perpetrado pela polícia ocorreu na noite de segunda (03/05) no bairro popular de Siloé, em Cali. A ONG investiga as mortes de 6 pessoas, entre elas um menino de 11 anos, além de 18 feridos, incluindo uma criança de 7 anos. Contudo, a violência policial também se dirige aos defensores de direitos humanos, que relatam ameaças físicas e verbais por parte de agentes do Estado.

Organizações de direitos humanos do país registram 1.181 casos de violência policial entre os dias 18 de abril, início dos protestos, e a segunda-feira, além de 26 mortes, 142 vítimas de violência física e 761 detenções arbitrárias por parte das forças de segurança estatais.

No final de semana, Duque anunciou que colocaria os militares nas ruas para tentar controlar os protestos.

Resultados das manifestações na Colômbia

A greve iniciada no último 28 de abril, ainda que sob forte ataque, já conquista vitórias. O ministro da Fazenda colombiano, Alberto Carrasquilla, renunciou na segunda, depois que Duque desistiu de seu projeto de reforma tributária e pediu ao Congresso que retirasse a proposta.

A derrubada da reforma tributária – que pretendia aumentar em 19% impostos sobre serviços públicos, como gás e energia – é uma das pautas da jornada de protestos. A lista de reivindicações ainda inclui a retirada do “pacotaço” – que prevê mudanças e reformas nas leis do trabalho, na área da saúde e da previdência social –, o fim da violência policial contra líderes sociais e defensores de direitos humanos, além de uma série de exigências em diversas áreas sociais.

Conflitos recentes na Colômbia
Desde 2019, a Colômbia é cenário de manifestações contra abusos policiais. A cidadania exige o fim do Esquadrão Móvil Antidistúrbios (Esmad), criado em 1999, durante a gestão do ex-presidente Andrés Pastrana. De acordo com a ONG Liga contra o Silêncio, em 20 anos de existência do Esmad, 43 pessoas foram assassinadas de forma sumária. 

Enquanto na cidade a Polícia Nacional atua na repressão, no campo a tarefa fica à cargo do Exército Nacional e de grupos paramilitares.

Para Clemencia Carabalí Rodallega, vencedora do Prêmio Nacional de Defesa de Direitos Humanos na Colômbia de 2019, os eventos violentos seguem acontecendo pela impunidade dos agentes de segurança do Estado e grupos irregulares que atuam nos territórios.

“Justamente esta violência se agudiza no país porque o sistema de Justiça não funciona. Realmente não existem investigações sérias que levem à captura tanto dos autores materiais como intelectuais, que seguem promovendo a violência apesar dos Acordos de Paz de 2016”, assegura.

Organizações sociais denunciam que a impunidade se expressa em novas ameaças. Jovens e estudantes receberam mensagens do grupo paramilitar Águilas Negras [Águias Negras] prometendo a “morte da esquerda”.

Os paramilitares também são acusados pelos movimentos populares como responsáveis por crimes que vitimaram 267 líderes sociais e ex-combatentes em 2020, segundo levantamento do Indepaz. Outro informe sinaliza que entre novembro de 2016 e o 14 de julho, 2020, 973 líderes sociais, defensores de direitos humanos e ex-combatentes foram assassinados.

Já o governo Duque sinaliza o narcotráfico como principal gerador de violência no país.

O senador Carlos Lozada, do partido Farc, afirma que tanto paramilitares, como narcotraficantes estão relacionados aos crimes cometidos contra jovens nas zonas rurais e urbanas colombianas, no entanto, o Estado utiliza a narrativa como argumento negacionista.

“Sem dúvidas há uma intenção de ocultar sua responsabilidade, determinada pela Constituição, de que o Estado deve garantir a vida de todos colombianos. Nessa afirmação, o que existe é uma tentativa de reduzir a complexidade desse fenômeno”,  opina o parlamentar.

Duque chegou ao poder através de uma forte campanha contra as guerrilhas colombianas e os Acordos de Havana. Durante seu governo, estima-se que foram mortos 52% dos 349 ex-combatentes assassinados nos últimos quatro anos.

“Eles tentam utilizar o argumento do narcotráfico como justificativa para esse banho de sangue, quando realmente eles estão vinculados ao narcotráfico. É o que evidencia o financiamento da campanha de Iván Duque, que recebeu dinheiro a máfia, e esse é o Centro Democrático, isso é o que se conheceu também com Alvaro Uribe e outros personagens que se vinculam a esse partido”, aponta o senador Lozada.

O processo de paz entre o governo nacional e o Exército da Liberação Nacional (ELN), que entrou na fase pública em março de 2016, também sofreu muito após a posse de Duque. O presidente nunca designou funcionários para participar dos diálogos em Havana e finalmente suspendeu o processo depois de um atentado em Bogotá, em janeiro do 2019.

(*) Com Brasil de Fato

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