Por Roberto Liebgott, Cimi Sul-Equipe Porto Alegre.
A antipolítica indigenista do governo brasileiro foi planejada e executada pelo coisa ruim, um monstro de cabeça coroada com chifres, sobre um corpo de cinco pernas e patas cheias de garras afiadas.
A cabeça representa os pensamentos cruéis, o preconceito, a tirania e ela faz agir o corpo de cinco pernas, patas e garras nas ações repletas de maldades contra os povos indígenas e as comunidades quilombolas no Brasil.
As patas e suas garras são movidas conforme a função e os objetivos a serem alcançados nos caminhos percorridos por esse monstro.
A primeira perna é a da desumanização dos indígenas e quilombolas, considerados pelo monstro como sujeitos desvinculados dos direitos constitucionais. Eles são tratados como coisas, objetos ou bichos do mato, portanto, podem ser abatidos, caçados e eliminados. A desumanização autoriza a violência contra aqueles que não compõem o rol de pessoas brancas, produtivas, desenvolvidas e que buscam a lucratividade a partir dos bens da natureza e da terra. Indígenas e quilombolas representam o atraso, o passado, os penduricalhos que atrapalham o progresso.
A segunda perna é da desterritorialização, ela se move no sentido de liberar os territórios indígenas e quilombolas para os exploradores. Esta perna anda ao lado da desumanização, elas se complementam no processo de eliminação daqueles que são os originários filhos da Mãe Terra, buscam facilitar a invasão, ocupação e usufruto dos bens para a obtenção de lucro rápido, fácil e farto. Essa perna liberaliza os territórios, dá as garantias de que os invasores não serão importunados e nem criminalizados pela violência e pela exploração. Se matarem, não haverá punição porque trata-se daqueles seres desvestidos de humanidade, os selvagens.
A terceira perna é a que promove a execução da barbárie, trata-se da devastação/destruição, ela age no sentido de colocar em prática o que vem sendo planejado pelo monstro de cabeça coroada de chifres, que é a de explorar de forma intensa e contínua os recursos da Mãe Terra, sem escrúpulos, sem medo, sem compaixão. A destruição é componente intrínseco do capital e precisa ser feita para que a lucratividade seja rápida e eficiente.
A quarta perna visa dar as garantias jurídicas de que tudo aquilo que foi planejado e executado, pelas outras três pernas, tenha validade e legitimidade, trata-se da perna, com sua pata e garras, da desconstituição dos direitos indígenas e quilombolas. Essa desconstituição é realizada através das medidas legislativas – PL191, 490, PEC 215, administravas – portarias, instruções normativas e recomendações da Funai, IBAMA, Ministério da Justiça, Presidência da República – e as teses jurídicas – Marco Temporal, Condicionantes do Caso Raposa Serra do Sol, que viabilizam os planos do monstro de cabeça coroada de chifres de legalizar a barbárie, o horror e a matança dos originários filhos da Mãe Terra.
A quinta perna executa o plano final, em relação aos povos indígenas e quilombolas, a integração ou assimilação forçada deles à sociedade nacional. Esta perna acompanha as outras em toda a trajetória e apresenta, como solução final, aos que subsistirem a ofensiva do monstro coroado de chifres, duas possibilidades, a humanização, tornando-se brancos e produtivos ou o extermínio. A perna da integração compõe o cenário final, denominado, genocídio.
Embora o coisa ruim esteja comandando as pernas que pisoteiam e matam há, de parte dos povos indígenas, quilombolas e outras comunidades e movimentos, lutas contínuas, resistências ao avanço do crime organizado no ambiente político, econômico, social, cultural, religioso. Os povos nos ensinam que há alternativas, que se pode construir caminhos de esperança, laços de solidariedade, de justiça e respeito aos modos de ser e viver e que não podemos e nem devemos baixar os olhos, calar a voz e paralisar nossos corpos por medo do monstro da destruição. Ele, como outros que já passaram, será combatido.
Porto Alegre, RS, 18 de agosto de 2022.
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