Por Nara Lacerda.
Dez anos depois de aprovado, o Código Florestal, que estabelece normas para proteção da vegetação nativa em áreas rurais ainda não foi colocado em prática no Brasil e enfrenta obstáculos para se tornar efetivo.
Alvo de protestos por parte de movimentos de defesa do meio ambiente ao longo do processo de elaboração, o código hoje é visto como um mecanismo que pode reverter os processos de alta nos índices de devastação.
Isso porque, em uma década, o país retrocedeu tanto na preservação que mesmo a lei considerada insuficiente em 2012 tem potencial para colocar em prática garantias esquecidas atualmente.
“Quando foi aprovado, o Código Florestal permitiu regularizar 40 milhões de hectares que foram desmatados ilegalmente antes de ele entrar em vigor. Isso gerou uma tristeza, uma revolta, porque pensamos que não era possível que a lei iria criar essa anistia em um volume tão alto”, explica a secretária executiva do Observatório do Código Florestal, Roberta del Giudice.
Advogada e especialista em desenvolvimento sustentável, Giudice pondera, no entanto, que de lá para cá o cenário piorou e a implementação da lei poderia ter impedido avanços recordes de desmatamento.
“Depois disso, tivemos desmatamento de 13 milhões de hectares e a não restauração dos 12 milhões que faltavam para a implementação do código e continuam faltando. São cenários completamente diferentes. Era um cenário em que tínhamos uma ministra do meio ambiente [Izabella Teixeira] que era uma técnica, para um cenário em que temos falta de diálogo e planejamento”, completa Roberta del Giudice.
O que é o código
O Código Florestal é, formalmente, a Lei 12.651, de 25 de maio de 2012. O texto estabelece as áreas de proteção em imóveis rurais e inclui as Áreas de Preservação Permanente, de Reserva Legal e de Uso Restrito.
No texto estão previstos mecanismos de controle da exploração florestal para extração de matéria prima e produção de produtos e prevenção de incêndios. Além disso, traz os meios financeiros necessários para implementação do que prevê.
“Todo mundo que tem um sítio, uma chácara, uma fazenda, tem limites para usar todo o terreno daquele imóvel. Você tem ali a sua vegetação natural e 20% dela, fora da Amazônia Legal, tem que ser mantidos. É para isso que serve Código Florestal, para proteger a vegetação natural dentro dos imóveis rurais. Pode ser um imóvel público, privado, um assentamento, um território tradicional, uma grande fazenda. Todos têm a mesma regra”, explica Giudice
Segundo a advogada, a grande vantagem da norma é o processo de implementação, que começa com o Cadastro Ambiental Rural. A inscrição permite que o poder público possa ter informações específicas sobre a localização, a área dos imóveis e o que é destinado à proteção. O problema é que o Brasil está nesse processo desde que a lei foi aprovada.
“Ainda precisamos fazer a análise dos dados que foram inseridos de forma autodeclaratória. A boa notícia é que 88% dos imóveis cumprem o Código Florestal. Em termos de área, não é a mesma proporção. Hoje, nós temos de 12 a 13 milhões de hectares de déficit de áreas que precisam ser restauradas. Se começarmos priorizando a análise desses cadastros com déficit, conseguimos acelerar a implementação da lei”, afirma, destacando que o planejamento é fundamental.
As vantagens de colocar a lei em prática extrapolam a pauta ambiental. Segundo Roberta del Giudice, a lei traz segurança jurídica, atrai investidores, proporciona commodities agrícolas mais sustentáveis e melhora a imagem do Brasil para o mundo.
“No entanto, temos sofrido ameaças de redução da proteção feita pelo Código Florestal. Temos inúmeros projetos de lei no Congresso Nacional que reduzem a proteção. Isso passa um recado muito negativo para quem cumpre a lei e para quem não cumpre até hoje. Acaba provocando uma falsa instabilidade jurídica nessa proteção legal que já é estável. Já temos 10 anos da mesma proteção”.
Semana de debates
Para reforçar a discussão sobre a lei, o Observatório do Código Florestal promove uma série de eventos até o próximo dia 2 de junho. Na agenda estão oficinas e mesas redondas que podem ser acompanhadas pela internet.
A série de encontros “Código Florestal +10” discute os temas essenciais para que a legislação seja colocada em prática e debate também questões ligadas à emergência climática. O evento faz parte da plataforma Rio2030, que busca mobilização e engajamento dos setores público e privado.
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Edição: Felipe Mendes
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