O assessor internacional da Presidência da República, Filipe Martins, não foi a única pessoa no círculo de amigos, ou de aliados de Jair Bolsonaro (sem partido), que recorreu a gestos e símbolos que fazem referência ao nazismo. O Brasil de Fato encontrou outros cinco momentos em que bolsonaristas mostraram a relação estreita que existe entre o brasileiro e o movimento fundado por Adolf Hitler, responsável pelo assassinato de seis milhões de judeus.
Na última quarta-feira (24), Martins aparecia na TV Senado, atrás do presidente da Casa, o senador Rodrigo Pacheco, quando fez um gesto de “OK” com as mãos, mas com três dedos retos, em forma de W. O gesto é classificado pela Liga Antidifamação (ADL), entidade com sede nos Estados Unidos, que combate o antissemitismo, como forma de identificação entre supremacistas brancos.
Em suas redes sociais, o Museu do Holocausto criticou o gesto: “Pesquisas acadêmicas, como da antropóloga Adriana Dias, mostram crescimento no número de células neonazistas e no engajamento de integrantes no Brasil. O Museu do Holocausto, consciente da missão de construir uma memória dos crimes nazistas que alerte a humanidade dos perigos de tais ideias, reforça que a apologia a este tipo de símbolo é gravíssima. Nossa democracia não pode admitir tais manifestações.”
Roberto Alvim
O caso mais emblemático, até então, era do ex-secretário especial de Cultura, Roberto Alvim, que em janeiro de 2020, copiou uma citação do ministro de propaganda da Alemanha nazista, Joseph Goebbels, em um discurso para as redes sociais, para divulgar o Prêmio Nacional das Artes.
Em um de seus discursos, Goebbels afirmou: “A arte alemã da próxima década será heroica, será ferreamente romântica, será objetiva e livre de sentimentalismo, será nacional com grande páthos e igualmente imperativa e vinculante, ou então não será nada”.
Na adaptação de Alvim, ficou assim: “A arte brasileira da próxima década será heroica e será nacional. Será dotada de grande capacidade de envolvimento emocional e será igualmente imperativa, posto que profundamente vinculada às aspirações urgentes de nosso povo, ou então não será nada.”
Paraquedistas
Em 17 de maio de 2020, ex-companheiros de armas de Bolsonaro, quando o presidente era paraquedista das Forças Armadas, foram até o Palácio do Planalto saudar o mandatário. Porém, no momento do cumprimento, estenderam o braço direito para o alto e gritaram “Bolsonaro somos nós”.
O episódio foi encarado por especialistas como uma alusão ao nazismo. Entre eles, Lilia Moritz Schwarcz, historiadora, doutora em antropologia e professora titular da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP. Em um artigo publicado na Revista Zum , ela faz a relação entre o gesto e o movimento alemão.
“Paraquedistas, vestidos com roupas militares, entoam uma variação de Heil Hitler a partir do grito de ‘Bolsonaro somos nós’, selando uma espécie de compromisso coletivo, na base do ‘nós comum’, em torno dos ideais do presidente. No caso, porém, o gesto não evoca um ritual religioso, mas reforça um compromisso bélico numa nação que não está em guerra. Nesse sentido, indica uma possível guerra no horizonte político, e sinaliza lealdade ao dirigente”, explicou Shwarcz.
Pai, filho e Allan dos Santos
Jair Bolsonaro e seu filho, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), protagonizaram um dos episódios. Em maio de 2020, o presidente tomou um copo de leite puro, durante uma transmissão ao vivo em seu perfil no Facebook.
Imediatamente, pesquisadores associaram o gesto a uma prática de movimentos neonazistas americanos, que passaram a tomar leite branco como símbolo da supremacia branca. Um dia depois, Eduardo Bolsonaro ironizou as críticas recebidas pelo pai e postou uma foto dos atores Lázaro Ramos e Thais Araújo bebendo leite puro. O blogueiro Allan dos Santos, linha auxiliar do bolsonarismo nas redes sociais, repetiu o gesto em uma transmissão ao vivo do seu canal.
“Nacionalistas brancos fazem manifestações bebendo leite para chamar a atenção para um traço genético conhecido por ser mais comum em pessoas brancas do que em outros – a capacidade de digerir lactose quando adultos. É uma tentativa racista para se embasar em ‘ciência’ para diferenciar e justificar a ‘raça branca’. Mas como já provado e explicado por toda ciência: Não há evidência genética para apoiar qualquer ideologia racista. O que há é, na verdade, um governo tosco e motivado pelo ódio”, explicou o antropólogo David Nemer, na época.
“O extremismo do Bolsonarismo é tão tosco que eles apropriam tudo da Alt Right (extremistas brancos americanos) e com atraso – já que isso começou nos EUA em 2017”, ironizou.
Sara Winter
Fiel apoiadora de Jair Bolsonaro, a militante Sara Geromini passou a usar o sobrenome “Winter” para homenagear Sarah Winter, uma mulher inglesa que se tornou espiã nazista e integrante da União Britânica de Fascistas.
Em suas casas, a Winter original ostentava a bandeira nazista e nunca foi punida pelos bárbaros crimes cometidos pelos nazistas, ao contrário de outros ingleses que se vincularam ao governo de Hitler.
Winter, a brasileira, organizou um grupo chamado “300 do Brasil”, que tinha como objetivo “combater a corrupção e a esquerda no mundo”. O grupo manteve, durante o mês de maio de 2020, um acampamento na Esplanada dos Ministérios. Nas marchas do movimento, eles carregavam tochas e se vestiam de branco. A estética se assemelhava à Ku Klux Klan (KKK), movimento de supremacistas brancos americanos.
Toda semana
Em sua nota, o Museu do Holocausto lamentou a série de episódios no Brasil. “É estarrecedor que não haja uma semana que o Museu do Holocausto de Curitiba não tenha que denunciar, reprovar ou repudiar um discurso antissemita, um símbolo nazista ou ato supremacista. No Brasil, em pleno 2021. São atos que ultrapassam qualquer limite de liberdade de expressão”