Chapecó/SC: A preservação do “Condá” no imaginário e a morte real de um menino indígena

Por Claudia Weinman, para Desacato. info. 

Hoje, apesar da tristeza, lideranças da Aldeia Condá de Chapecó/SC estão elaborando um material para encaminhar  uma representação junto ao Ministério Público Federal a fim de denunciar o discurso de preconceito e ódio contra os povos indígenas da região. Com a morte do menino Nomam da Rosa, Kaingang de 09 anos de idade, atropelado na sexta-feira dia 03, no centro da cidade, manifestações em aversão aos indígenas foram evidenciadas em diversos perfis nas redes sociais.

Em um dos comentários, a pessoa chega a falar: “Um bugre a menos”, referindo-se a Nomam. Outros comentários da mesma espécie estão sendo denunciados ao Ministério Público Federal. Segundo o Coordenador do Conselho Indigenista Missionário (CIMI) de Chapecó, Jacson Santana, além da dor que a família de Nomam está sofrendo por sua perda, existe esse sentimento de indignação diante do teor dos comentários. “O clima é de indignação. Sobre o acidente, a família até entende que poderia ter acontecido com qualquer pessoa, mas os comentários que foram feitos em vários meios são de preconceito e ódio aos povos indígenas”.

Acidente

Nomam foi atropelado na tarde de sexta-feira, dia 03, no centro da cidade de Chapecó. Ele, acompanhado do pai e da irmã de 11 anos, foram até a cidade para fazer compras. Nomam e a irmã foram até um comércio e compraram dois pães e um refrigerante. Ao retornarem ao encontro do pai, Nomam acabou sendo atropelado por um veículo e arremessado contra um ônibus enquanto tentavam atravessar a rua. Jacson Santana comenta que embora tenha sido um acidente, existe o questionamento entre os indígenas sobre a alta velocidade dos motoristas em relação ao trânsito de Chapecó.

nomam
Nomam, menino Kaingang.

O Condá do imaginário

O lanche que Nomam e a irmã traziam foi colocado junto ao Caixão do menino e enterrado no sábado, dia 04, com ele. Conforme Santana, o gesto partiu dos indígenas e representa a busca pela sobrevivência dos povos em um cenário de tanta violência, perseguição e indiferença.

A comunidade indígena que vive na Aldeia Condá se entristece novamente com a morte de mais uma criança indígena. Era dezembro de 2015 quando o menino Vitor, de dois anos, foi assassinado nos braços da mãe em Imbituba por um jovem de 23 anos de idade. No mês de março desse ano, o Júri popular acontecerá na Câmara de Vereadores de Chapecó, no entanto, não é suficiente diante da perda e do sofrimento que historicamente acompanha a população indígena.

Silvana Casemiro da Rosa e Ronivam da Rosa, pai e mãe de Nomam, abraçam a filha de 11 anos e o outro filho de três anos de idade na tentativa de acalentar o sofrimento. A reflexão que permanece é sobre o “Condá” tão reverenciado por uma parcela da comunidade Chapecoense e ao mesmo tempo, condenado quando aparece caminhando pelo centro de Chapecó e outros municípios de trabalho do povo indígena.

A criança fantasiada de indígena é amada por uma torcida, mas ao sair do imaginário coletivo como sendo uma criança pobre, descalça e que ocupa o mesmo espaço público que as demais cuja família possui condições de vida melhor, é vista como um intruso, alguém que precisa ser banido para manter a ordem e a “limpeza” do lugar.

Por isso, encerro esse texto com muita tristeza e ao mesmo tempo esperança. Desalento porque com a morte de mais uma criança indígena em Chapecó /SC, ficamos nós, os mesmos, a nos indignar. O “Condá” é reverenciado quando aparece na Rede Globo, mas quando morre na Avenida torna-se apenas “mais um” ou como foi dito, “menos um”. Mas também, termino essas palavras com esperança. Não que a representação junto ao Ministério Público Federal vai resolver a situação e vá combater o discurso de ódio contra as populações indígenas, mas servirá para mexer com essa estrutura de morte criada pelo Capitalismo e especialmente, gerida pelos ‘poderes’ de Chapecó.

O Condá é esse que vocês percebem olhando para a foto de capa da matéria. Ele luta pela sobrevivência. Não se faz de vítima não, mas cobra da sociedade o seu espaço, expropriado bem antes da nossa  existência. O Condá mostrado na televisão tantas vezes nos últimos meses é, na real, esse aí. Mas para a sociedade muitas vezes é mais fácil trabalhar com o imaginário coletivo criado pela indústria. Se sensibilizar com um Condá descalço, com fome, mas que mantém sua indignação e vai para a rua fazer luta, é dureza.

Fotos e Informações: Jacson Santana. (CIMI-Chapecó/SC).

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