Celesc Pública, bom para todo mundo!

 Pouquíssimas empresas produzem um valor adicionado anual de R$ 7 bilhões em Santa Catarina. Isso explica porque só tem duas empresas estaduais no Brasil, que ainda não foram privatizadas: a Cemig em Minas Gerais e a Celesc aqui no estado.

Por Crystiane Leandro Peres e José Álvaro Cardoso.

          Os trabalhadores e as trabalhadoras da Celesc estão paralisando seu trabalho hoje, 18 de julho, em um protesto com relação à postura da diretoria da Celesc. Esses trabalhadores estão em plena campanha salarial, sua data base para negociação do Acordo Coletivo de Trabalho é 1º de outubro. Segundo nota da Intercel, que é a intersindical dos trabalhadores da Celesc de SC, no primeiro semestre de 2024, a diretoria da empresa assumiu uma postura de não dar sequência a toda e qualquer demanda apresentada pelas entidades sindicais, num total descaso com os trabalhadores e suas representações. Inclusive em relação à negociação do acordo de PLR que prevê a participação dos celesquianos nos lucros e resultados da empresa, demonstrando a falta de valorização dos trabalhadores por parte da diretoria da Celesc.

          Ao mesmo tempo, ignorando os apelos das entidades sindicais (a Intercel é um coletivo de seis sindicatos), a Diretoria da Celesc insistiu na implantação de um novo sistema de atendimento comercial que ocasionou um verdadeiro caos no serviço em todas as lojas do Estado. Isso trouxe prejuízos aos catarinenses e aos atendentes comerciais, em função da precariedade e das constantes falhas no sistema e na emissão das faturas de energia.

           A diretoria desconsidera que a Celesc tem indicadores excelentes por causa do empenho dos seus trabalhadores. Por exemplo, a empresa pratica a segunda menor tarifa de energia elétrica do país, fator fundamental para 90% da população catarinense, já que o gasto com energia elétrica tem um peso muito importante no orçamento familiar. A empresa obteve, no ano passado, o título de 2ª melhor distribuidora da região Sul e o 4º lugar nacional no Prêmio da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) de Satisfação do Consumidor entre as empresas que atendem mais de 400 mil unidades consumidoras. No ano passado recebeu também o título de Melhor Distribuidora do Sul do Brasil, concedida pela Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (ABRADEE) e angariou outros prêmios importantes distribuídos por instituições ligadas ao setor de geração e distribuição de energia. Esse tipo de resultado não cai do céu, mas é fruto principalmente, da dedicação e da competência dos empregados da Celesc.

           Já em um olhar panorâmico do balanço financeiro da empresa, verificamos que há uma melhoria geral dos indicadores. Por exemplo, tomando os dados do primeiro trimestre do ano – os mais recentes à disposição do público – verificamos que  a Celesc obteve um lucro líquido de R$ 232 milhões no primeiro trimestre de 2024, aumento de 6,4% em relação ao mesmo período de 2023. O Ebitda, sigla que significa lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (e é também conhecida como Lajida na sigla em português) chegou a R$ 457,5 milhões no período, expansão de 7,3% em relação aos R$ 426,1 milhões atingidos no primeiro trimestre do ano passado. Em se tratando de indicadores financeiros, o Ebitda é chave porque oferece uma noção precisa da atividade fim, isto é, do desempenho operacional da empresa. É um indicador mais preciso da capacidade de geração de caixa da operação, é o resultado obtido pelo negócio principal da companhia.

         O lucro líquido da Celesc no primeiro trimestre de 2024 foi de R$ 205,7 milhões na Distribuição (10,4% de crescimento) e de R$ 24 milhões na Geração de energia (crescimento de 10,2%), em relação ao primeiro trimestre de 2023. Esse crescimento é muito significativo, sendo mais de 4 vezes o crescimento do PIB no Brasil para o mesmo período (o PIB brasileiro cresceu cresceu 2,5% no primeiro trimestre, em 12 meses). O consumo total de energia em Santa Catarina aumentou 6,6% no primeiro trimestre, com destaque para o residencial, que expandiu 9,4% no período.

         Na parte de Distribuição, que gera o grosso do faturamento, a receita da empresa expandiu 11,7%, passando de R$ 1,6 bilhão no primeiro trimestre de 2023 para R$ 1,8 bilhão no mesmo período de 2024. A Rede de Distribuição (medida em KM) da empresa cresceu também no ano passado 1,29%, alcançando 156.109 KM de redes elétricas no Estado. Esse indicador é fundamental porque é a rede de distribuição que garante o efetivo fornecimento do serviço de energia elétrica ao consumidor. Aumentou também na Celesc, o número de consumidores por empregado: passou de 862 unidades em 2021, para 893 unidades em 2023, um crescimento de 3,6%. Ou seja, apesar do quantitativo de empregados ter aumentado no ano passado, o número de clientes atendidos por trabalhador aumentou, o que significa uma elevação significativa da produtividade dos trabalhadores da Celesc.

          A empresa tem ampliado o seu quadro, contratando basicamente trabalhadores terceirizados. Essa estratégia é perversa, porque os salários e as condições de trabalho dos terceirizados são bem inferiores aos dos trabalhadores próprios da empresa. A ampliação da tercerização é uma forma de contornar as importantes conquistas do acordo coletivo, obtidas ao longo de décadas pelos trabalhadores da Celesc. Ou seja, é uma forma de gastar menos com força de trabalho e explorar mais os trabalhadores e trabalhadoras.

         Uma informação fundamental é o chamado Valor Econômico Adicionado, ou Valor Adicionado, da Celesc. Esse é o valor adicional que adquirem os bens e serviços ao serem transformados pelos trabalhadores durante o processo de produção. Do ponto de vista da geração de valor, num país capitalista, só tem sentido fabricar um produto ou prestar um serviço, se ele gerar um valor adicional, após serem deduzidos os custos dos insumos adquiridos de terceiros (matérias-primas, serviços, bens intermediários) durante o processo de produção. A Demonstração de Valor Adicionado, que vem no balanço contábil das empresas, revela também como esse novo valor foi distribuído entre os que participaram da produção ou da prestação do serviço. Os indicadores possibilitam avaliar se vale a pena o investimento produtivo ou se ele está dando prejuízo aos capitalistas.

          Os trabalhadores da Celesc geraram R$ 7,1 bilhões de Valor Adicionado em 2023, que foram assim distribuídos:

  • R$ 5,0 bilhões para Impostos Taxas e Contribuições (federais, estaduais e municipais);
  • R$ 1,3 bilhão para a Remuneração de Capitais (Juros, Aluguéis, Dividendos, Lucros);
  • R$ 788,3 milhões para os trabalhadores (incluindo Remuneração Direta, Benefícios e FGTS).

Ou seja, apesar de todo o valor adicionado em 2023 ter sido produzido pelos trabalhadores, eles ficaram, segundo os dados da própria empresa, com pouco mais de 11% de toda a riqueza produzida. Como é conhecido, máquinas e equipamentos não geram valor novo, essa capacidade é uma exclusividade do trabalho humano.

          Pouquíssimas empresas produzem um valor adicionado anual de R$ 7 bilhões em Santa Catarina. Isso explica porque só tem duas empresas estaduais no Brasil, que ainda não foram privatizadas: a Cemig em Minas Gerais e a Celesc aqui no estado. Em Santa Catarina, a manutenção da Celesc Pública é fruto principalmente da inteligência e da mobilização dos seus trabalhadores. Ademais, a reconhecida eficiência da Celesc é decorrência direta do comprometimento e da competência dos seus empregados e empregadas.

         Como mencionado pela nota divulgada hoje pela Intercel, vimos há poucos meses um verdadeiro caos por conta da privatização das distribuidoras de energia elétrica no Rio Grande do Sul e em São Paulo. Aparentemente, o descaso da Diretoria da Celesc com os seus trabalhadores, inclusive aprofundando a política de terceirização do atendimento, visa pavimentar o caminho para uma futura privatização da Companhia.

         A população deve apoiar os trabalhadores da Celesc porque a história das privatizações em setores essenciais no mundo e no Brasil a gente já conhece. Os capitalistas que assumem essas empresas de serviços essenciais, só visam o lucro, preferencialmente obtido da forma mais rápida possível. Não se trata aqui de teoria. Essa é a realidade do Brasil e dos estados vizinhos aqui na Região Sul. O processo de privatização no Brasil ficou conhecido como Privataria, ou seja, uma mistura de privatização com pirataria.

          Os indicadores que superficialmente foram descritos neste artigo nos fazem recordar que o desafio colocado para a sociedade catarinense é imenso: preservar e melhorar uma empresa pública estratégica de energia, com excelentes indicadores, cuja força de trabalho gera todo ano cerca de R$ 7 bilhões de riqueza adicional. Outro desafio fundamental é colocar a eficiência da empresa ao serviço da população e do desenvolvimento socioeconômico do Estado. Como diz a nota da Intersindical trabalhadores da Celesc de Santa Catarina: CELESC PÚBLICA, BOM PARA TODO MUNDO!

Florianópolis, 18 de julho de 2024

Crystiane Leandro Peres é socióloga e supervisora do Dieese em SC.

José Álvaro de Lima Cardoso é economista e técnico do Dieese em SC.

A opinião do/a/s autor/a/s não necessariamente representa a opinião de Desacato.info.

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