Celac: ‘Lula assume questão ambiental como eixo de sua política externa’, avalia especialista

Primeiro dia de Cúpula é marcado por promessas de investimento e cobranças de países da América Latina e Caribe

Lula se posiciona contra a guerra durante discurso na Celac. E cobra que países ricos cumpram sua promessa de investimento nos países em desenvolvimento – Jean-Christophe Verhaegen / AFP

Por Leandro Barbosa, para Brasil de Fato. 

Em discurso durante a abertura da Cúpula da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac) e da União Europeia (UE) União Europeia que acontece nesta segunda-feira (17), em Bruxelas, Lula lembrou o compromisso do Brasil com a meta de zerar o desmatamento até 2030 e disse que o mundo manteve “hábitos irresponsáveis de consumo, incompatíveis com a sobrevivência do planeta.” O presidente também falou sobre a necessidade de investimentos no enfrentamento da crise climática, desigualdade e a fome.

“A desigualdade só fez crescer: os ricos ficaram ainda mais ricos e os pobres ainda mais pobres […] 735 milhões de seres humanos passam fome, segundo relatório da FAO [Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura] divulgado na semana passada. E mesmo com todos os sinais de alerta emitidos pelo planeta, ainda há quem negue a crise climática. E mesmo os que não a negam hesitam em adotar medidas concretas”, afirmou.

Em uma dura crítica à guerra, Lula ainda frisou a posição brasileira em relação ao conflito entre Rússia e a Ucrânia, afirmando que o Brasil “repudia veementemente o uso da força como meio de resolver disputas”. E que o país “apoia as iniciativas promovidas por diferentes países e regiões em favor da cessação imediata de hostilidades e de uma paz negociada”.

O mandatário brasileiro cobrou um posicionamento dos países ricos que não cumpriram a promessa de investir 100 bilhões de dólares ao ano para os nações em desenvolvimento, como forma de compensação pelo mal que causaram ao planeta desde a revolução industrial.

“Como se não bastasse, a guerra no coração da Europa veio para aumentar a fome e a desigualdade, ao mesmo tempo que elevou os gastos militares globais. Apenas em 2022, em vez de matar a fome de milhões de seres humanos, o mundo gastou 2,24 trilhões de dólares para alimentar a máquina de guerra, que só causa mortes, destruição e ainda mais fome”, disse.

O presidente também abordou o tema da regulamentação das plataformas digitais, o combate ao trabalho precário e o resgate da indústria sustentável, visando a geração de empregos de qualidade.

Meio ambiente como eixo da política externa brasileira

Para Roberto Goulart Menezes, professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB) e Coordenador do núcleo de estudos Latino-americanos, Lula transmitiu a mensagem pretendida e que foi a base de sua campanha.

“Lula assume, mais uma vez, a política ambiental como um eixo da sua política externa”, afirma o professor ao citar o discurso do presidente sobre a Amazônia e o investimento de recursos no combate à crise climática. Goulart ainda reforça que o presidente agiu certo ao discursar sobre a paz a respeito da guerra na Ucrânia.

“O Brasil já condenou a guerra. Já prestou apoio à Ucrânia. E disse, vamos fazer ‘um clube da paz’ com disposição ABC. Contudo, não há consenso na UE sobre a condução da guerra, vimos isso recentemente na Otan [Organização do Tratado do Atlântico Norte]”.

Para o professor ficou claro que a UE tentou utilizar a cúpula para ampliar seu apoio diplomático e endossar sua posição frente à Rússia. E a mensagem passada foi “nós não faremos isso, porque não estamos no conflito”.

“O governo brasileiro está colhendo todas as informações, vendo as contradições e dizendo: pra que que a gente vai dar um passo à frente se existem muitas interrogações acerca da postura dos Estados Unidos frente à guerra e nem um consenso dentro da própria UE sobre o conflito?”, afirma o professor.

Previsões e pedidos

A presidente da Comissão Europeia, Ursula Von der Leyen, disse em seu discurso que o bloco europeu prevê o investimento de 45 bilhões de euros (cerca de R$ 242 bilhões) nos países da América Latina e Caribe nos próximos anos.

“Temos mais de 135 projetos em análise, do hidrogênio verde aos minerais críticos, da expansão da rede de cabos de dados de alto desempenho à produção de vacinas ainda mais eficientes. Juntos, poderemos escolher os setores e cadeias produtivas que devem ser priorizados”, afirmou.

Pedro Sánchez, presidente do Governo da Espanha, que assumiu recentemente a presidência interina do Conselho Europeu, afirmou que seu principal objetivo é concluir o acordo comercial entre a União Europeia e o Mercosul ainda este ano.

“Após mais de 20 anos de negociações, acreditamos que temos uma grande janela de oportunidade para concluí-la nestes seis meses de presidência. Acredito que será benéfico para ambas as regiões e estamos trabalhando muito para fechar o acordo nas questões que se referem ao meio ambiente”, enfatizou Sánchez.

Quanto a isso, em discurso, Lula foi enfático: “queremos assegurar uma relação comercial justa, sustentável e inclusiva. A conclusão do Acordo Mercosul-União Europeia é uma prioridade e deve estar baseada na confiança mútua e não em ameaças”.

Para Lula, “a defesa de valores ambientais, que todos compartilhamos, não pode ser desculpa para o protecionismo. O poder de compra do Estado é uma ferramenta essencial para os investimentos em saúde, educação e inovação. Sua manutenção é condição para a industrialização verde que queremos implementar”.

Em seu discurso a presidente de Honduras, Xiomara Castro, criticou que “todo o sistema internacional seja altamente ineficaz para deter a emissão de gases de efeito estufa e a destruição de dois dos principais recursos naturais de nosso planeta”. Ela também solicitou que os bloqueios contra Cuba e as medidas coercitivas contra a Venezuela fossem suspensas.

O presidente argentino, Alberto Fernández, cobrou o compromisso da Europa em  fornecer recursos financeiros para projetos de desenvolvimento na América Latina e Caribe. Fernández também pontuou a questão climática. “A Europa sabe que somos provedores de oxigênio, que nossas selvas, nossas florestas e nossas montanhas cumprem esse papel”, afirmou.

Edição: Patrícia de Matos

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