Fumicultores de Santa Catarina que querem abandonar a produção de tabaco e passar a cultivar orgânicos vão receber um incentivo nos próximos meses. Com o apoio do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), o Laboratório de Comercialização da Agricultura Familiar (Lacaf) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) está abrindo o primeiro box no país para venda exclusiva de produtos orgânicos provenientes de agricultores familiares nas Centrais de Abastecimento do Estado de Santa Catarina (Ceasa) de São José. Com 75 metros quadrados, o espaço na Ceasa deve ser inaugurado em cerca de um mês.
De acordo com o MDA, estão sendo repassados ao Lacaf, responsável pelo projeto, R$ 100 mil que servirão, em parte, para pagar profissionais que prestarão apoio técnico à comercialização no local. Os recursos também vão financiar um estudo comparativo, que será desenvolvido pela UFSC, entre o custo de produção e a renda obtida em um hectare de frutas, hortaliças e leite em sistema orgânico e um hectare de fumo.
A medida faz parte dos esforços do governo federal e de entidades da sociedade civil para impulsionar a implantação de alternativas viáveis à produção de fumo, conforme previsto na Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco da Organização Mundial da Saúde, da qual o Brasil é signatário. Segundo especialistas, produtores que trabalham nesse tipo de lavoura estão sujeitos a diversos riscos, entre eles o de intoxicação por nicotina e agrotóxicos.
Para Charles Lamb, coordenador do Centro de Estudos e Promoção da Agricultura de Grupo (Cepagro), que atua há mais de 20 anos oferecendo assistência técnica e extensão rural a agricultores familiares, a medida ajuda a combater o principal gargalo para que produtores de fumo diversifiquem a atividade, que é a dificuldade de escoar a produção. O Cepagro é um dos parceiros do laboratório da UFSC na abertura do box exclusivo para orgânicos.
“A abertura desse box vai de encontro ao interesse das famílias que querem abandonar o cultivo do tabaco e têm na questão da comercialização um dos principais fatores que dificultam sua inclusão na produção agroecológica”, disse Lamb.
Segundo ele, somente em Santa Catarina, segundo maior produtor de fumo do país, há mais de 45 mil famílias que cultivam tabaco em terras que poderiam estar produzindo alimentos.
A família de Carla Vill, 25 anos, era uma delas. Há dez anos, a propriedade no município de Nova Trento (SC) produzia exclusivamente o fumo. Com o apoio e a assistência técnica do Cepagro, conseguiu diversificar a produção, passou a plantar frutas e legumes e hoje está caminhando para um novo patamar: a produção orgânica.
“Estamos em transição, ainda não temos a produção totalmente adequada ao sistema orgânico. Mesmo assim, já notamos os maiores ganhos, que são relacionados à saúde”, disse ela, citando os frequentes episódios de tontura, principalmente durante a colheita, que acometem “100% dos trabalhadores do campo que lidam com esse produto”.
Dados do MDA indicam que a Região Sul é responsável por 95% da produção de fumo do país. Cerca de 200 mil agricultores familiares estão envolvidos na atividade. Aproximadamente 30% das famílias produtoras de tabaco estão em situação de pobreza, com vulnerabilidade econômica e social.
O fortalecimento da diversificação dos sistemas produtivos também está relacionado às ações que vêm sendo implementadas no país para reduzir o tabagismo. A Lei Antifumo, sancionada em 15 de dezembro de 2011 pela presidenta Dilma Rousseff, proíbe o fumo em locais coletivos, fechados privados ou públicos, e os fumódromos (áreas reservadas a fumantes). O texto, no entanto, ainda precisa de regulamentação, que definirá, por exemplo, penalidades em caso de desrespeito à lei. No fim do ano passado, entidades da sociedade civil cobraram do governo a regulamentação do texto legal.
De acordo com a Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica, 30% das mortes causadas por câncer estão diretamente ligadas ao tabagismo, além de uma série de doenças como infarto e embolia pulmonar. Pelos cálculos da entidade, o número de fumantes no Brasil caiu de 32% para 16% nos últimos 15 anos. Mesmo assim, cerca de 20% de ex-fumantes ainda vão ter alguma doença relacionada ao tabaco.
Fonte: EBC.