Florianópolis vive há anos uma crise de mobilidade urbana, em particular no sistema de transporte coletivo. Esta crise atinge a população de forma mais nítida nos momentos em que se elevam as tarifas, mas ela também se manifesta em outras situações. Por exemplo, no fato de o sistema de transporte ser operado hoje de forma ilegal – uma vez que os contratos das empresas que exploram o transporte coletivo estão vencidos desde 2010. Esta crise não é um “privilégio” da capital catarinense. Em todo o país, as políticas para a mobilidade priorizam o uso do transporte individual em detrimento do coletivo. Seguem a lógica do controle social e econômico: por meio da tarifa e dos horários dos ônibus define-se quem pode ou não circular pela cidade, ir aos hospitais, locais de estudo; usufruir dos bens, serviços e todos os lugares de lazer que ela oferece. Quem tem dinheiro, pode. E quem não tem? Tudo organizado sem a participação da sociedade.
Por conta disso, a Frente de Luta pelo Transporte Público organizou um Seminário de Mobilidade Urbana, realizado em abril de 2011, para discutir um novo projeto político para o transporte. As reivindicações estão centradas em três grandes eixos, que nos servirão para a construção de um novo modelo, realmente público e de qualidade, que não seja pautado pelo lucro.
1- Transporte como Direito:
O acesso a todo direito essencial da população passa por sua mobilidade. Se a lógica do transporte não é garantir e oferecer a possibilidade de deslocamento para o povo, então são restringidos à esta população o seu direito à educação, habitação, saúde e cultura. O transporte está incluído na Lei Orgânica de Florianópolis (Art. 4º) entre os direitos que o poder público deve assegurar a todo habitante do município. Deve, portanto, ter sua versão pública plena, acessível para todos e todas, sem nenhuma forma de distinção e exclusão como, por exemplo, a tarifa. Defendemos a Tarifa Zero como forma de aplicação prática do transporte como direito coletivo, assim como temos as versões públicas para a saúde e educação. Nossa proposta é de que todos os setores da sociedade, sobretudo os mais ricos, que se beneficiam verdadeiramente com o fluxo de pessoas na cidade, contribuam para o financiamento do custo do sistema de transporte público, através de impostos e tributos municipais cobrados de bancos, shoppings centers, mansões, grandes empresas e grandes empreendimentos imobiliários, para que o transporte seja financiado pelo município, garantido para a população o acesso a um serviço verdadeiramente público, gratuito e de qualidade, sem exclusão social.
2- Controle Social sobre o Transporte:
Os moradores da cidade conhecem os problemas de sua região e têm direito a participar das soluções, assim como acompanhar as decisões do poder público. Tendo em vista a importância que o transporte ocupa em suas vidas – e no funcionamento de toda cidade – as decisões sobre o transporte coletivo devem ser tomadas pela população. É necessário um controle verdadeiramente público sobre o transporte coletivo, com o fim do regime de concessões, que entrega o serviço de transporte nas mãos de empresas privadas que buscam apenas a lógica do lucro sobre um serviço público. Por isso, propomos a Municipalização do transporte, ou seja, que o sistema de transporte coletivo seja gerido, planejado e administrado pela prefeitura, retirando das empresas a gestão sobre o mesmo, garantindo o controle verdadeiramente público do sistema.
Acreditamos que uma mudança no Conselho Municipal de Transportes é necessária, para que este tenha mais de 50% de seus integrantes vindos dos setores populares e não do poder público e patronal. Seu caráter deve ser deliberativo e vinculante, de modo que as decisões tomadas no Conselho sejam postas em prática pelo Executivo. Além disso, o município deve seguir a lei federal n.º 8987/95, que obriga a apresentação das planilhas de custo à população através de audiências públicas, ampliando a transparência nas decisões e no funcionamento do sistema. Ainda de acordo com a legislação, vencido o prazo de concessão para as empresas os ônibus devem ser propriedade do município. Defendemos também a realização de um grande plebiscito, em que se possa perguntar que tipo de transporte nós queremos para a cidade, incluindo as discussões sobre a Municipalização do sistema e sobre seu financiamento indireto, a Tarifa Zero.
3- Priorização do uso do Transporte Coletivo:
Em Florianópolis a média de carros alcança quase um veículo por habitante, o que exige a construção de mais estradas, elevados e estruturas viárias. Tal modelo de transporte prejudica os deslocamentos na cidade e prioriza aqueles que dispõem de condições financeiras para se locomover. Nesse sentido, exigimos que o poder público priorize o sistema de transporte coletivo, tornando-o mais atrativo do que o carro, através da criação de vias exclusivas, ampliação de outros modais além do ônibus, e de políticas de investimento. Defendemos também o uso de tecnologias de mobilidade mais humanas, oferecendo mais conforto e acessibilidade, e equipamentos que consumam menos energia.
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Com base neste debate, entendemos que o atual aumento na tarifa deve ser imediatamente revogado, bem como o modelo de concessão deve ser extinto, na perspectiva da Municipalização do transporte e da implementação da Tarifa Zero, garantindo o pleno direito ao transporte a toda população.
Florianópolis, 17 de Abril de 2011.
Frente de Luta pelo Transporte Público
Imagem: cdhgf.blogspot.com